Título: Liga decide manter observadores na Síria
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Fonte: Correio Braziliense, 09/01/2012, Mundo, p. 13

Contrariando desejo dos opositores ao presidente Bashar al-Assad, associação de nações árabes dá continuidade à missão no país e descarta participação da ONU na solução da crise

Apesar das críticas de que a missão de observadores enviada à Síria tem sido um fracasso, a Liga Árabe anunciou ontem que vai manter os trabalhos no país. Diante da ineficiência dos mediadores — que não conseguiram intervir nos conflitos e frear a violência do governo do presidente Bashar al-Assad contra aqueles que pedem sua saída —, os opositores passaram a pedir a saída da Liga e o envio de uma equipe das Nações Unidas para o país. No entanto, depois de se reunir no Cairo com o chefe da missão, o general sudanês Mohamad al-Dabi, a equipe ministerial da associação de países árabes descartou a ideia.

O general apresentou o primeiro relatório da missão, que está na Síria desde 22 de dezembro. Os planos da Liga, que, formalmente, foram aceitos pelo presidente Al-Assad, são os de pôr fim à violência, libertar os presos políticos, retirar o Exército das cidades e garantir a livre circulação, em todo o país, dos 163 observadores e dos jornalistas. Segundo o relato do general Al-Dabi, no entanto, os enviados "foram vítimas de perseguição tanto por parte do governo sírio quanto da oposição". O documento apresentado descreve a presença de cadáveres nas ruas e as acusações mútuas do governo e da oposição sobre a responsabilidade das mortes. Os relatores informaram também sobre a presença de veículos militares "na maioria das cidades" visitadas.

Depois de analisar o relatório, o comitê ministerial da Liga Árabe anunciou, em nota, que decidiu "dar aos observadores o tempo necessário para manterem sua missão conforme o protocolo". Também foi feito um apelo ao governo sírio e aos grupos armados para que encerrassem "imediatamente todos os atos de violência". Ficou decidido que o chefe da missão apresentará um relatório no fim do primeiro mês de trabalho e que ele manterá contato com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, embora "a solução à crise deva ser alcançada no marco árabe". A Liga solicitou ainda apoio financeiro aos países-membros para manter a missão.

Insatisfação O informe ocorre em um contexto de crescente insatisfação da oposição síria com os observadores, acusados de serem "manipulados" pelo regime de Bashar al-Assad. Para os opositores, as recentes mortes são prova da ineficácia da Liga Árabe para lidar com o problema. Somente no último sábado, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH), pelo menos 21 civis morreram no país, 17 deles por disparos efetuados pelas forças de segurança e quatro por um foguete disparado contra partidários de Al-Assad.

No mesmo dia, 11 soldados foram assassinados e 20 ficaram feridos, em confrontos com desertores na província de Deraa. Um jovem de 19 anos morreu durante a inspeção de sua casa na localidade de Al Tayané, onde outras 30 pessoas foram detidas, acrescentou o OSDH. Na sexta-feira, uma explosão no centro de Damasco deixou 26 mortos e 63 feridos, a maior parte civis. Mais uma vez, houve acusações mútuas. Enquanto o governo acusava opositores de praticarem o terrorismo, levantou-se a suspeita de que o ataque era uma farsa elaborada pelo próprio governo para justificar a repressão.

Milhares de vítimas Os protestos contra o regime de Bashar al-Assad foram iniciados em março, assim como ocorreu em vários outros países árabes. O partido do presidente, Baath, está no poder desde 1963. O presidente chegou a trocar seu gabinete após duas semanas de protestos, mas iniciou também uma forte repressão à população, que mesmo assim não deixou de ir às ruas pedindo a democracia. Segundo dados divulgados pela alta comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas, Navy Pillay, o número de mortes na Síria desde o levante popular já ultrapassa 5 mil, incluindo pelo menos 300 crianças.