Políticos e juízes surgem como opção

Pedro Venceslau e Vera Rosa

22/05/2017

 

 

A DELAÇÃO DA JBS / Aliados e adversários de Michel Temer já discutem nomes para uma eventual eleição indireta caso o presidente não consiga manter o cargo

Enquanto o núcleo duro do Palácio do Planalto adota o discurso de que apenas a permanência do presidente Michel Temer pode garantir a governabilidade e aprovar as reformas trabalhista e da Previdência, aliados e adversários do peemedebista já debatem nos bastidores qual o perfil ideal e os nomes mais viáveis para a eventualidade de uma eleição indireta.

Existem alguns consensos nos dois lados. O primeiro é que qualquer decisão passará pelas reformas trabalhista e da Previdência.

O segundo é que dificilmente um nome de fora da política terá força para construir uma maioria entre os deputados e senadores que formarão um possível colégio eleitoral.

Em caráter reservado, líderes da base governista dizem que a eleição de um presidente-tampão teria a mesma dinâmica de uma disputa pela Mesa Diretora da Câmara. Ou seja: tem mais chance de vencer quem tiver trânsito nas bancadas e condições de oferecer cargos.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), desponta como uma opção. Dois deputados da linha de frente da oposição disseram ao Estado que estiveram com Maia e ouviram dele a promessa de apoiar versões brandas das reformas.

Os pontos centrais ficariam para depois de 2018. Pesa contra o presidente da Câmara, porém, o fato de ser investigado na Lava Jato, o que poderia gerar instabilidade.

Procurado, Maia negou os encontros e disse que não tratou do assunto “com ninguém”.

“A oposição vai apoiar o candidato que se comprometer a deixar ambas reformas para depois de 2018”, disse o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).

É justamente neste ponto que políticos leais a Temer se apegam para difundir a tese do perigo de se trocar novamente o governo em pouco mais de um ano. “É um desserviço ao País e uma leviandade discutir nomes. Deviam todos estar preocupados em fazer as reformas”, disse o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

Dirigentes do DEM dizem que, caso haja uma eleição indireta, os parlamentares não aprovarão nenhum nome fora do Congresso para disputar a vaga.

“O maior eleitor, na eleição indireta, chama-se Rodrigo Maia”, disse um integrante do partido.

“Resta saber se terá condições de ser”, emendou, em uma referência às investigações da Lava Jato contra ele.

Fator Meirelles. Fiador das reformas, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), é apontado como uma opção “híbrida”. Seria bem recebido pelo mercado, não é investigado na Lava Jato e é considerado um bom articulador político. Seu nome tem a simpatia de Temer e não sofre resistências no PSDB, principal aliado do governo, mas que, ao menos por ora, diz preferir um nome da sigla.

Uma ala do partido prega o nome do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e outra, a do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). Para atrair os tucanos, Meirelles precisaria se comprometer a não disputar a reeleição em 2018.

Em outra frente, parlamentares governistas, da oposição e especialistas ventilam a ideia de um nome de peso do Judiciário.

Essa seria uma saída institucional que impediria uma guerra fratricida da base e teria a simpatia da opinião pública. A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, e o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim são os mais mencionados para assumir a Presidência.

Regras. Há dúvidas, porém, sobre a candidatura de alguém sem vinculação partidária ou que tenha cargo público. Embora prevista na Constituição, a eleição indireta nunca teve as suas regras regulamentadas pelo Congresso. “Existem mais incertezas do que certezas. Temos alguma experiência em nível estadual, mas desde 1988 nunca tivemos eleições indiretas para presidente.”, afirma Thomaz Pereira, professor de Direito Constitucional da FGVRio. / COLABOROU LUCAS BALDEZ

CENÁRIO

● Aliados do presidente e oposição já discutem nomes para uma eventual eleição indireta

NÚCLEO POLÍTICO

P PRÓS

C CONTRAS

Henrique Meirelles

Ministro da Fazenda, é filiado ao PSD

P Fiador das reformas, é o nome preferido do mercado e de aliados de Michel Temer

C Foi presidente do conselho da J&F

Rodrigo Maia

Presidente da Câmara, do DEM

P Primeiro na linha sucessória, tem boa articulação com o Congresso e trânsito com a oposição

C É alvo de inquérito na Lava Jato

Fernando Henrique

Ex-presidente da República, do PSDB

P Seria apresentado como nome de reconciliação

C Além da idade avançada, teria resistência da oposição

Tasso Jeireissati

Ex-governador do Ceará, é senador pelo PSDB

P Presidente do PSDB, tem bom trânsito no Congresso

C Não é um nome que agrada ao Centrão e ao núcleo duro do Planalto

NÚCLEO JURÍDICO

P Um nome do Judiciário para a Presidência é aventado como saída para recompor a credibilidade e superar a crise política

C A dificuldade de se tornar viável em uma eleição em que o colégio eleitoral são parlamentares

Cármen Lúcia

Presidente do Supremo Tribunal Federal

Gilmar Mendes

Ministro do STF

Nelson Jobim

Ex-ministro do Justiça

Joaquim Barbosa

Ex-presidente do STF

Ayres Britto

Ex-ministro do STF

OUTROS ‘CANDIDATOS’

Apesar de não colocarem seus nomes como opção para uma eventual eleição indireta, podem entrar na disputa para tentar se cacifar para a disputa eleitoral de 2018

Lula (PT)

Ex-presidente da República

Ciro Gomes (PDT)

Ex-ministro da Integração

Marina Silva (Rede)

Ex-ministra do Meio Ambiente

Jair Bolsonaro (PSC)

Deputado federal

Ronaldo Caiado (DEM)

Senador

LIMBO JURÍDICO

EM ELEIÇÕES REGULARES, INTEGRANTES DO JUDICIÁRIO, SEGUNDO LEI COMPLEMENTAR DE 1990, TERIAM DE DEIXAR O CARGO 6 MESES ANTES DO PLEITO. ALÉM DISSO, QUALQUER CANDIDATO TERIA DE ESTAR  FILIADO A PARTIDO POLÍTICO NESSE MESMO PRAZO. NÃO HÁ, PORÉM, UMA REGRA CLARA ESTABELECIDA PARA A HIPÓTESE DE ELEIÇÃO INDIRETA

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Entrevista - Peter Hakim

Cláudia Trevisan

22/05/2017

 

 

 

‘Uma solução é identificar alguém respeitado’

Peter Hakim, presidente emérito do Inter-American Dialogue

As “novas revelações” sobre o presidente Michel Temer acabaram com a pouca credibilidade internacional que ele tinha e comprometeram a capacidade do Brasil de exercer influência na região e fortalecer os laços com os Estados Unidos, avalia Peter Hakim, presidente emérito do Inter-American Dialogue.

Questionado sobre a permanência de Temer no poder, ele disse ao Estado: “Não vejo como”.

O senhor vê alguma chance de sobrevivência de Temer?

Não vejo como. Mesmo se Temer não tivesse dito uma palavra enquanto ouvia o que Joesley (Batista, dono da JBS) dizia, não é responsabilidade do presidente reportar atividades criminosas? Não dizer nada sugere cumplicidade.

Qual seria a melhor solução?

O melhor seriam eleições diretas, porque o Congresso está desmoralizado. A outra solução seria identificar alguém que seja respeitado. Os únicos candidatos para isso seriam atuais ou ex-integrantes do Supremo.

Outra possibilidade seria uma figura econômica, como (Henrique) Meirelles, mas ele é identificado como autor de reformas impopulares.

O que será das reformas?

O Brasil tem uma séria crise de governabilidade. Um presidente impopular e acusado de corrupção e obstrução à Justiça, ninguém claramente pronto para seu lugar. Isso torna muito difícil a aprovação de reformas.

Como Washington reage?

Sempre achei que a administração Barack Obama mantinha distância do governo Temer, em parte pelas dúvidas em relação ao impeachment. Agora, pessoas que estão no governo me dizem que houve esforço excessivo da gestão anterior na tentativa de reconstruir a relação com Temer. Com as novas revelações, qualquer disposição de trabalhar com o governo brasileiro desaparecerá.

Se Temer ficar, como será a relação com outros países?

Como será possível para Temer exercer influência regional quando dois terços dos governos na América do Sul foram corrompidos por uma companhia brasileira, a Odebrecht? Não posso imaginar Trump convidando Temer para a Casa Branca. Ele já tem problemas suficientes.

 

O Estado de São Paulo, n. 45142, 22/05/2017. Política, p. A8