JBS vai ter de encolher, dizem analistas

Alexa Salomão e Josette Goulart

28/05/2017

 

 

Para o banco JP Morgan, empresa, que é a maior produtora de carne do mundo, deve perder até 30% do seu mercado no Mercosul

JBS CORRE CONTRA O TEMPO PARA QUITAR R$ 18 BI EM DÍVIDAS DE CURTO PRAZO

Finanças. Débitos que vencem este ano correspondem a cerca de um terço da dívida bruta total, de R$ 58 bi; para analistas, em meio ao turbilhão provocado pela divulgação da delação premiada de seus controladores, grupo deve ter acesso a crédito dificultado

Desde que a delação dos irmãos Batista veio a público, os analistas de mercado financeiro se calaram. A justificativa é que os indicadores da JBS teriam “virado pó”. Não é apenas o futuro da empresa que é considerado incerto. Pelo que foi narrado pelos próprios controladores, o passado tornou- se nebuloso, dado que ainda não é possível definir se os esquemas de corrupção distorceram os resultados anteriores.

Mas há um dado concreto para todos: a JBS tem um buraco de R$ 8 bilhões para cobrir neste ano.

Vencem, agora em 2017, R$ 18 bilhões em dívidas de curto prazo – quase um terço da dívida de R$ 58,4 bilhões do grupo, um montante considerado bastante elevado. A empresa tem a opção de usar o caixa, abastecido por R$ 10 bilhões, mas precisa correr contra o tempo para conseguir o restante. Mergulhada em seus próprios relatos de ilegalidades, prestando contas a órgãos reguladores no Brasil e nos Estados Unidos, negociando multas bilionárias e sofrendo pressão dos políticos que denunciou, dificilmente terá socorro de bancos, públicos ou privados, ou credibilidade para captar no mercado. Terá de recorrer a medidas emergenciais, afirmam analistas.

Estratégia. Ciente do tamanho da encrenca, antes mesmo de a delação vir a público, a JBS montou uma estratégia para se resguardar.

Parou de comprar bois à vista. A mudança desagradou aos pecuaristas, mas o pagamento a prazo para a gigantesca estrutura de abate da JBS segura no caixa R$ 1 bilhão por mês, aliviando a necessidade de capital de giro. O próximo passo, projetam consultores do setor, é o grupo começar a encolher. “A expectativa é que a JBS venda ativos, abrindo mão, num primeiro momento, de negócios que não são ligados à carne”, diz José Carlos Hausknecht, sócio da MB Agro Consultoria.

Na semana passada, a J&F, holding que controla a JBS e outras empresas da família, começou a buscar bancos para vender a Alpargatas, do setor de calçados e têxteis; a Eldorado, fabricante de celulose; e a Vigor, empresa de lácteos. A Eldorado é considerada o negócio mais atraente e viável.

“Os chineses, que têm dinheiro, não temem adquirir ativos com risco de esqueletos e estão com demanda crescente em seu próprio território, teriam enorme interesse em pagar um preço justo pela Eldorado”, diz uma fonte do setor financeiro.

Venda. Os analistas do JP Morgan, entre os poucos que se arriscaram a divulgar relatórios sobre a empresa, defendem outra ideia: a redução de compra de boi e da criação de aves e suínos. Acreditam que a empresa vá encolher e perder até 30% do mercado de carnes no Mercosul. No Brasil, toda estrutura tem 80 unidades de produção, 47 centros de distribuição, fora as 24 unidades de processamento de couro e três confinamentos.

Em um e-mail enviado a clientes, os analistas do BTG Pactual também apontam preocupação com os R$ 8 bilhões a descoberto.

Eles entendem, no entanto, que, como as linhas de curto prazo são formadas basicamente por crédito à exportação, lastreadas na produção, a dívida pode ser paga mais facilmente.

No mercado financeiro, a projeção é que as ações da empresa na Bolsa paulista sigam com instabilidade.

O papel, que chegou a R$ 12,46 em setembro de 2016, fez um mergulho na terça-feira pós-delação. Caiu assustadores 31%, para R$ 5,98. Depois, engatou movimentos de alta. No balanço da semana, a queda foi de 11,48% – o papel fechou a R$ 7,71 na sexta-feira.

“Investidores com perspectiva de longo prazo já estão fora do papel, ele agora é especulativo”, diz Eduardo Roche, sócio da Canepa Gestora de Recursos.

O movimento de alta da ação ao longo da semana, segundo relatos do mercado, teve duas razões.

A primeira foi ficar claro que as multas e punições financeiras não vão recair exclusivamente sobre a JBS. A holding J&F assumiu a responsabilidade.

O movimento também teria sido impulsionado pela ação de “gringos” com apetite ao risco.

“Sinceramente, não sei o que eles estão vendo – ou não estão vendo”, diz Roche.

Existe ainda o temor em relação a eventuais revisões dos balanços.

A delação revela, por exemplo, que a empresa chegou a depositar de 1% a 3% do valor das exportações em offshores para pagar propinas. Surgem as dúvidas: Qual valor foi registrado? Foi inflado? Ajustaram ao desconto da propina? Também incomoda a revelação do pagamento de propina para liberação de recursos no BNDES. O dinheiro pode ser lícito, mas a forma como foi obtido envolveu corrupção. Ninguém consegue dimensionar as consequências.

Venda

“A expectativa é que a JBS venda ativos, abrindo mão, num primeiro momento, de negócios que não são ligados à carne.”

José Carlos Hausknecht

SÓCIO DA MB AGRO CONSULTORI

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Eldorado tem R$ 2,3 bi para pagar neste ano

28/05/2017

 

 

A Eldorado Celulose, que pertence ao grupo J&F, também terá um grande desafio pela frente para pagar suas dívidas. O endividamento que vence no curto prazo é de R$ 2,3 bilhões, segundo o último balanço publicado da companhia, referente ao ano de 2016. O balanço do primeiro trimestre ainda não foi publicado. O caixa da empresa informado naquela época era de apenas R$ 609 milhões, deixando portanto um buraco de R$ 1,7 bilhão. Além disso, outros R$ 5,3 bilhões vencem em prazos mais longos.

A Eldorado foi a primeira empresa do grupo a ser investigada por corrupção e já no ano passado sofreu financeiramente com isso. As metas financeiras estabelecidas pelos bancos, os chamados covenants, tiveram de ser revistos para evitar que houvesse um pedido de antecipação de quitação da dívida.

 

O Estado de São Paulo, n. 45148, 28/05/2017. Economia, p. B3