‘Fita foi editada e isso é gravíssimo’, diz defesa

Vera Rosa, Tânia Monteiro, Carla Araújo, Beatriz Bulla e Fabio Serapião 

20/05/2017

 

 

Advogado do presidente afirma que vai pedir a perícia da gravação feita por Joesley Batista; em despacho, Fachin diz não ver ‘ilegalidade’

O advogado criminalista Antônio Cláudio Mariz de Oliveira disse ontem que o governo tem “informações seguras” sobre a existência de adulterações e montagens no áudio da conversa entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, dono do frigorífico JBS.

Amigo do presidente há 40 anos, Mariz se reuniu com Temer, em Brasília, e vai assumir a sua defesa. Uma das estratégias jurídicas, após a delação premiada feita por Joesley, é pedir a perícia da gravação que veio a público. “Soubemos que a fita foi editada e isso é gravíssimo”, afirmou Mariz ao Estado. “É uma indignidade o que estão fazendo contra o presidente da República e contra o Brasil.”

Na conversa com Temer no Palácio do Jaburu, no dia 7 de março, Joesley disse que estava “de bem” com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDBRJ), preso pela Lava Jato. “Tem que manter isso, viu?”, disse Temer. Em seguida, Joesley acrescentou: “Todo mês”. Parte do diálogo, porém, é inaudível.

Questionado se o “corte” teria sido feito pela Procuradoria-Geral da República, Mariz disse que jamais levantaria suspeitas sem provas. “A perícia vai nos dar indícios tanto sobre a edição quanto sobre a autoria”, afirmou.

A defesa tenta desqualificar Joesley, sob o argumento de que o empresário se valeu de uma delação falsa com o único objetivo de obter benefícios para ele e sua companhia. “A verdade começou a ser reposta. Há absoluta falta de seriedade nas acusações”, afirmou Mariz, que chegou a ser convidado para o Ministério da Justiça no início do governo, mas não assumiu o cargo após condenar, em entrevista, os “excessos dos operadores da Lava Jato”./ VERA ROSA, TÂNIA MONTEIRO, CARLA ARAÚJO, BEATRIZ BULLA e FABIO SERAPIÃO

Estratégia

“Há absoluta falta de seriedade nas acusações.”

Antônio Cláudio Mariz de Oliveira

ADVOGADO DE TEMER

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Perito aponta cortes em áudio de Joesley Batista

20/05/2017 

 

 

O perito extrajudicial e judicial Marcelo Carneiro de Souza afirmou ontem ao Estado ter identificado “fragmentações” em 14 momentos na gravação, isto é, pequenos cortes de edição no áudio da conversa entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, dono da JBS.

O especialista, que disse ter feito um exame preliminar, não encontrou cortes entre o sexto e o 12.º minutos, o intervalo de tempo em que se falou sobre o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB).

“Para se chegar a uma conclusão definitiva, é necessário analisar o material onde a mídia foi armazenada, nesse caso, o gravador.

Verificar se esse material foi devidamente acondicionado ou se, por exemplo, ficou largado em algum local que poderia danificá-lo. Precisaria fazer uma transcrição fiel. E, para ter certeza da identidade dos dois locutores, o ideal ainda seria fazer um exame de confronto de voz”, disse Souza.

Os 14 trechos em que o perito encontrou possíveis edições estão entre o 14.º minuto e o 34.º minuto do áudio. “Na despedida dos dois, inclusive, há um corte grotesco, que um amador poderia perceber”, disse o perito, referindo-se ao intervalo entre 31m52s e 31m53s. Ao todo, o áudio tem 38 minutos.

O perito e professor da Unicamp Ricardo Molina, que disse não ter ouvido a gravação inteira, não apontou indícios de que tenha ocorrido edição. Ele, porém, criticou outros pontos, como a mudança no nome do arquivo original do áudio. “Não é saudável trocar o nome do arquivo justamente para saber de qual gravador saiu”, disse Molina.

Legalidade. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte, apontou no despacho de abertura do inquérito que tem Temer entre os investigados que não há ilegalidade nos áudios gravados por Joesley.

“Convém registrar, ainda e por pertinência, que a Corte Suprema, no âmbito de Repercussão Geral, deliberou que ‘é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem conhecimento do outro’. Desse modo, não há ilegalidade na consideração das quatro gravações em áudios efetuadas pelo possível colaborador Joesley Mendonça Batista”, escreveu Fachin.

O Ministério Público Federal produziu quatro laudos de “verificação de gravação do arquivo de áudio”. A análise é inicial e ainda devem ser realizadas outras perícias após a instauração da investigação contra Temer.

Para a analista Elaine Sobral e para o técnico Eder Gabriel, ambos do Ministério Público da União, o diálogo contido no arquivo PR1 14032017.wav, que contêm a gravação da conversa entre Temer e Joesley, “encontra- se audível, apresentando sequência lógica”. A PF afirmou que a gravação foi feita por iniciativa de Joesley, sem orientação de agentes da corporação.

As ações controladas, que tiveram a participação de investigadores, ocorreram posteriormente. / ELISA CLAVERY

 

O Estado de São Paulo, n. 45140, 20/05/2017. Política, p. A7