Delator cita US$ 150 mi a Lula e Dilma 

Jamil Chade, Julia Affonso, Ricardo brandt, Luiz Vassallo e Natalia Oliveira 

20/05/2017

 

 

Joesley Batista, dono da JBS, afirma em delação premiada que manteve conta de campanha para petista; propina seria operada por Mantega

O empresário Joesley Batista, dono do frigorífico JBS, disse que abasteceu duas contas para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente cassada Dilma Rousseff na Suíça. O saldo chegou a US$ 150 milhões em 2014. Em sua delação à Procuradoria-Geral da República (PGR), Joesley afirmou que o ex-ministro da Fazenda dos governos do PT Guido Mantega determinava as movimentações financeiras com o conhecimento dos ex-presidentes.

O dinheiro na Suíça teria sido usado, segundo o delator, em campanhas eleitorais pelo Brasil, apoiando aliados de Dilma e Lula. O Estado confirmou com procuradores próximos ao caso que a informação repassada pelo delator era de que conta estaria em nome de empresas offshores abertas pela JBS. Procurado, o Ministério Público da Suíça se recusou a comentar.

“Os saldos das contas vinculadas a Lula e Dilma eram formados pelos ajustes sucessivos de propina do esquema BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e do esquema gêmeo, que funcionava no âmbito dos fundos Petros e Funcef”, apontou um dos anexos da delação.

Joesley contou que, em dezembro de 2009, o banco estatal adquiriu debêntures da JBS, convertidas em ações, no valor de US$ 2 bilhões, “para apoio do plano de expansão”. “O depoente escriturou em favor de Guido Mantega, por conta desse negócio, crédito de US$ 50 milhões e abriu conta no exterior, em nome de offshore que controlava, na qual depositou o valor”, constou da delação.

O empresário disse também que foi feito um financiamento de R$ 2 bilhões, em maio de 2011, para a construção da fábrica de celulose da Eldorado. O delator contou que o ex-ministro “interveio” junto ao BNDES para que “o negócio saísse”. “A pedido de Mantega”, Joesley afirmou que depositou mais US$ 30 milhões.

A primeira das contas ficou com um saldo positivo de US$ 70 milhões no fim do governo Lula. Em 2011, quando começou o governo Dilma, Joesley disse ter sido orientado a abrir uma nova conta. O empresário relatou que questionou Mantega sobre a necessidade da ação.

“Ele dizia: ‘essa aqui é a conta do Lula’”, explicou Joesley, que perguntou: “Mas eles sabem disso?”. Mantega disse, segundo o delator: “Sabem sim, eu falo tudo para eles”.

Reuniões. O anexo da delação mostrou também que, a partir de julho de 2014, Mantega “passou a chamar o depoente quase semanalmente ao Ministério da Fazenda, em Brasília, ou na sede do Banco do Brasil, em São Paulo, para reuniões a que só estavam presentes os dois, nas quais lhe apresentou múltiplas listas de políticos e partidos políticos que deveriam receber doações de campanha a partir dos saldos das contas”.

Em seu depoimento, Joesley citou o PMDB, do presidente Michel Temer. O empresário destacou que o executivo Ricardo Saud, diretor de Relações Institucionais da J&F (controladora da JBS), fazia o contato com partidos e políticos. Ainda em 2014, o empresário contou que Mantega entregou uma lista, “com mais 40 milhões” que deveriam ser doados. “Pensei comigo: ‘isso vai ficar caro’”, disse Joesley. “Ele (Mantega) não pedia. Ele mandava fazer”, afirmou.

Conhecimento. Segundo o empresário, Mantega foi “explícito” em uma reunião com Dilma sobre a existência desse dinheiro.

“Eu falei. Tem uma (conta) e tem a outra”, disse o ex-ministro, segundo Joesley. Questionado se a presidente cassada sabia sobre as transações do BNDES, o empresário respondeu: “Perfeitamente”.

Joesley contou também que, em novembro de 2014, esteve no Palácio do Planalto, quando encontrou Dilma e informou que, após um depósito de US$ 30 milhões, o dinheiro iria acabar.

“Ela disse que era importante fazer”. O dinheiro, segundo o empresário, era para o governador de Minas, Fernando Pimentel (PT). “Eu sabia com a certeza de que ela sabia de tudo”.

O empresário disse que no mesmo dia se encontrou com Pimentel no Aeroporto da Pampulha, em Belo Horizonte, e disse ao petista “que havia conversado com Dilma”. “Pimentel orientou o depoente a fazer o pagamento por meio da compra de participação de 3% na empresa que detém a concessão do Estádio Mineirão”, relatou trecho da delação. Edinho Silva, tesoureiro da campanha do PT, encontrava-se, segundo Joesley, semanalmente com Saud. / JAMIL CHADE, JULIA AFFONSO, RICARDO BRANDT, LUIZ VASSALLO e NATALIA OLIVEIRA

- Contas no exterior

US$ 150 mi foi o saldo máximo que chegou somando duas contas do ex-presidente Lula e da presidente cassada Dilma, abastecidas pela JBS, em 2014 US$ 30 mi foi o valor pago a Mantega, em 2011, por Joesley, após uma intervenção do ex-ministro no BNDES a favor de negócio do grupo

________________________________________________________________________________________________

Mantega usava empresário para negociar propinas, diz delator

Josette Goulart

20/05/2017

 

 

Segundo Joesley Batista, Victor Sandri, que atua no ramo imobiliário, era o intermediário do ex-ministro da Fazenda

Os depoimentos do presidente do grupo J&F, Joesley Batista, trouxeram à tona um personagem que já era conhecido de muitos empresários, mas que até então só havia aparecido marginalmente em operações da Polícia Federal. Trata-se do empresário Victor Sandri, que atua oficialmente no ramo imobiliário e de cimentos. Mas, de acordo com Joesley, Vic, como é conhecido, também atuava no ramo de propinas, como intermediário do ex-ministro Guido Mantega. Seu preço: 4% do que era liberado pelo BNDES. Metade para ele, metade para Mantega.

Sandri é amigo pessoal do ex-ministro Guido Mantega. Uma das primeiras aparições na imprensa foi em um caso inusitado. Na terça-feira de carnaval do ano de 2007, o sítio do empresário em Ibiúna, no interior de São Paulo, foi assaltado. O caso ganhou notoriedade porque um dos hóspedes era o então ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Anos mais tarde, já em 2015, ele ganhou novamente as páginas do jornal, desta vez na Operação Zelotes, que investiga fraudes no tribunal de processos administrativos da Receita Federal, conhecido como Carf.

O Ministério Público Federal sustenta que o ex-ministro Mantega nomeou integrantes do Carf para ajudar esse amigo empresário. Até hoje o caso ainda está em investigação.

Agora Sandri surge novamente na delação de Joesley Batista, que durante seu depoimento só se referia a Sandri como Vic. Vic teria cobrado uma comissão de 4% para facilitar a liberação de recursos do BNDES. Foi ele, segundo Joesley, que se apresentou com intermediário de Mantega, que na época era presidente do BNDES. O primeiro pagamento foi para um financiamento pequeno, de US$ 80 milhões, usado para comprar a empresa Swift Argentina. O empréstimo foi caro, segundo Joesley, ou seja, com juros altos. Mas segundo ele, isso não era importante porque era a única forma de conseguir comprar a empresa e iniciar os planos de internacionalização, em 2006. Mesmo sendo caro, Joesley afirmou que o empréstimo não teria sido liberado sem a atuação de Mantega.

Mantega então se tornou ministro da Fazenda, mas continuou a atuar em favor da empresa no banco. O modus operandi era o de Joesley falar com Vic, Vic falava com Mantega e Mantega com o BNDES. Às vezes, quando Joesley queria falar diretamente com Mantega, era Vic que intermediava também. Na ponta final, no entanto, Joesley disse não saber como se dava a conversa de Mantega com o BNDES.

O dono da JBS fez questão inclusive de afirmar que a equipe técnica da empresa sempre seguia as regras do banco e sequer sabiam do relacionamento que ele tinha com o ministro.

Até 2008, com a atuação de Vic como intermediário foram liberados cerca de US$ 1,6 bilhão em aportes ao JBS. Além do empréstimo de US$ 80 milhões, outros US$ 500 milhões foram em aquisição de ações da JBS para a compra da Swift americana e outros US$ 1,5 bilhão para a compra de outras três empresas nos Estados Unidos e uma na Austrália, segundo Joesley. Depois disso, Joesley começou a ter problemas com Vic.

Segundo o empresário, Vic andava circulando muito, falava mais do que devia e pessoas do mercado começaram a perguntar dele para Joesley. “Aí me afastei do Vic e comecei a tratar diretamente com Mantega”.

Na conversa com Mantega, Joesley se disse surpreso quando o então ministro disse que não havia necessidade de que o pagamento fosse efetuado a cada aporte, mas sim guardado para se entregue no futuro. Foi então que surgiram as contas Lula e Dilma, onde foram depositados cerca de US$ 150 milhões, integralmente usado nas campanhas presidenciais.

Não à toa, Joesley menciona que pessoas do mercado começaram a pedir referências de Vic. Segundo relatos de um exdirigente de um fundo de pensão, Vic vendia muitos empreendimentos imobiliários usando o nome do ministro Mantega. Ele usava a Sandria Projetos, sua empresa incorporadora. Ao todo, lançou 13 empreendimentos comerciais em São Paulo, todos com nome Atrium. E outros três edifícios residenciais.

O advogado de Victor Sandri, Ticiano Figueiredo, diz que seu cliente nega qualquer ato ilícito e informa que no caso da Zelotes ainda sequer foi possível se manifestar no inquérito, que ainda está sob análise da Receita Federal. Já o advogado de Mantega, José Roberto Batochio, não retornou a reportagem.

- ‘Investimento’

“O então ministro Guido Mantega solicitou a JB que fizesse um investimento de US$ 20 milhões, debitada a ‘conta corrente’ do PT, no exterior. Após um ano, o investimento foi devolvido para a ‘conta corrente’.”

Joesley Batista

DONO DA JBS, EM DELAÇÃO

 

O Estado de São Paulo, n. 45140, 20/05/2017. Política, p. A8