Esquema atinge 1.829 políticos de 28 partidos
Fábio Fabrini, Fabio Serapião e Beatriz Bulla
20/05/2017
 
 
Segundo delator, valor distribuído chega a R$ 600 mi; maior parte seria de propina

O diretor da JBS Ricardo Saud afirmou em sua delação premiada que a empresa distribuiu propinas por atacado no meio político brasileiro, detalhando os nomes de mais de mil beneficiários. Em depoimento prestado à Procuradoria- Geral da República (PGR), ele revelou que 1.829 candidatos, de 28 partidos das mais variadas colorações, receberam dinheiro do grupo controlado pelos irmãos Joesley e Wesley Batista.

As doações ilícitas foram de quase R$ 600 milhões. O grosso dos recursos, segundo o delator, foi destinado a candidatos em troca de contrapartidas no setor público. “Tirando esses R$ 10, R$ 15 milhões aqui, o resto tudo é propina. Tudo tem ato de ofício, tudo tem promessa, tudo tem alguma coisa.”

Saud afirmou que fez o “estudo” por iniciativa própria. Em vídeo do depoimento, divulgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ele entrega aos investigadores uma pilha de papéis com a relação de subornados, agora potenciais alvos de novos inquéritos. Os números revelam a escala da delação.

“Eleitos foram 179 deputados estaduais, de 23 estados; 167 deputados federais, de 19 partidos. Demos propina para 28 senadores da República, sendo que alguns disputaram e perderam eleição para governador e alguns disputaram reeleição ou eleição para o Senado. E demos propina para 16 governadores eleitos, sendo quatro do PMDB, quatro do PSDB, três do PT, dois do PSB, um do PP, um do PSD”, contou.

Nos anexos entregues à PGR, o diretor descreve o pagamento de R$ 148 milhões a quadros do PT para viabilizar negócios com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e fundos de pensão. Só do banco público, a empresa recebeu aportes de R$ 10 bilhões entre 2007 e 2014.

O executivo explicou também que R$ 46 milhões foram destinados ao PMDB, sem contar propinas pagas ao presidente Michel Temer, ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao ex-governador do Rio Sérgio Cabral, preso pela Lava Jato, que negociariam atos de ofício “diretamente com o grupo controlador da JBS”. Ele também citou pagamentos a políticos de PP (R$ 42 milhões), PR (R$ 36 milhões), PSD (R$ 20,9 milhões), PROS (R$ 10,5 milhões), PCdoB (R$ 10 milhões), PDT (R$ 4 milhões) e PRB (R$ 3 milhões).

Dono. Joesley Batista disse à PGR que seu grupo pagou “nos últimos anos” R$ 400 milhões em propina a políticos e servidores. A lista inclui senadores, deputados e presidentes da República. O irmão, Wesley, confirmou aos procuradores o teor das declarações de Joesley.

Joesley contou que o levantamento de valores foi feito em uma investigação interna que ele próprio determinou, antevendo que seria chamado a dar explicações ao Ministério Público Federal. A JBS é alvo de ao menos cinco operações policiais que investigam fraudes contra a administração pública, lavagem de dinheiro e corrupção. O empresário afirmou que seu grupo está envolvido em crimes há “10, 15 anos”.

- Tentáculos

“Demos propina para 28 senadores da República, sendo que alguns disputaram e perderam eleição para governador e alguns disputaram reeleição ou eleição para o Senado. E demos propina para 16 governadores eleitos, sendo quatro do PMDB, quatro do PSDB, três do PT, dois do PSB, um do PP, um do PSD”

Ricardo Saud

DIRETOR DA JBS

- CITADOS

Presidente

Michel Temer

(PMDB)

Teria dado aval à compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O empresário Joesley Batista ainda relatou pedido de propina pelo peemedebista desde 2010

DEFESA:

Temer afirmou que “jamais solicitou pagamentos para obter o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha” e que recebeu apenas valores legais

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Ex-presidentes

Lula (PT)

Joesley relatou a existência de duas “contas-correntes de propina” no exterior, cujo beneficiário seria o petista

DEFESA:

Segundo Lula, “diálogos com terceiros nem sequer foram comprovados”.

Dilma Rousseff

(PT)

Joesley relatou a existência de duas “contas-correntes de propina” no exterior, cuja beneficiária seria a petista

DEFESA:

Dilma afirmou que informações do empresário são “improcedentes e inverídicas”

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Ministros

Marcos Pereira

(PRB)

Segundo Joesley, titular do Desenvolvimento e Indústria recebeu R$ 6 milhões de propina*

DEFESA:

Ministro afirmou que declarações de delator “não são verdadeiras”

Gilberto Kassab

(PSD)

Wesley relatou R$ 20 milhões em propinas ao ministro da Ciência e Tecnologia

DEFESA:

Kassab negou "qualquer recebimento de recursos pessoais pelo ministro"

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Governador

Fernando Pimentel

(PT)

Joesley relatou pedido de R$ 30 milhões para o governador de Minas Gerais em 2014

DEFESA:

Petista afirmou que afirmações “não têm nenhum suporte em provas ou evidências”

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Senadores

Aécio Neves

(PSDB-MG)

Joesley relatou pedido de R$ 2 milhões feito pelo senador para quitar dívidas com advogados. Já o diretor Ricardo Saud disse que o grupo pagou R$ 80 milhões para a campanha do então candidato do PSDB à Presidência. Aécio foi afastado do mandato de senador

DEFESA:

Tucan o afirmou que reunião com empresário “tratou-se de uma relação entre pessoas privadas”

José Serra

(PSDB-SP)

Joesley disse ter pago R$ 6,4 milhões por meio de caixa 2 à campanha do senador à Presidência – ele concorreu em 2002 e 2010

DEFESA:

Serra disse que “jamais recebeu qualquer tipo de vantagens indevidas das empresas de Joesley Batista”.

Zezé Perrella

(PMDB-MG)

Um ex-assessor do senador foi filmado recebendo malas de dinheiro de um primo de Aécio – o montante teria sido destinado a uma empresa do filho de Zezé, Gustavo. O ex-assessor do senador foi preso anteontem na Operação Patmos, da PF

DEFESA:

Zezé afirmou que “nunca recebeu, de forma oficial ou extraoficial, um real sequer” da JBS

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Deputados

Rodrigo da Rocha Loures

(PMDB-PR)

Joesley afirmou que Loures aceitou propina de R$ 15 milhões para resolver pendências da J&F, holding que controla a JBS, no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Loures foi afastado do mandato de deputado pelo Supremo

DEFESA:

Parlamentar afastado não se manifestou

João Bacelar (PR-BA)

Segundo Joesley, o parlamentar o ajudou a “comprar” cinco deputados federais, ao custo de R$ 3 milhões cada um, para votar contra o impeachment de Dilma

DEFESA:

Deputado não foi localizado

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Deputado cassado

Eduardo Cunha

(PMDB-RJ)

Joesley disse ter pago R$ 5 milhões de propina a Cunha na cadeia. Peemedebista também teria recebido R$ 30 milhões na disputa pela presidência na Câmara, em 2015

DEFESA:

O advogado de Cunha não se pronunciou

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Ex-ministro

Guido Mantega

(PT)

É apontado como elo da empresa com o PT para o pagamento de propina. Segundo o delator, ex-ministro da Fazenda de Lula e Dilma também operava as contas de propina

DEFESA:

Advogado do ex-ministro não respondeu ao ‘Estado’

*Defesa não foi localizada

INFOGRÁFICO/ESTADÃO

 

O Estado de São Paulo, n. 45140, 20/05/2017. Política, p. A10