Título: Na trave
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 07/01/2012, Economia, p. 9

Inflação de 2011 fecha em 6,5%, no teto da meta fixada pelo governo. Banco Central comemora e juros devem continuar caindo neste ano

Por muito pouco, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, se livrou do constrangimento de divulgar uma carta à Nação pedindo desculpas por ter falhado na missão de manter a inflação do país dentro das metas definidas pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial da carestia, encerrou 2011 com alta de 6,50%, exatamente o teto da meta de 4,5% — o indicador pode variar dois pontos percentuais para cima ou para baixo.

Foi a maior taxa em sete anos, um forte sinal para a autoridade monetária de que as pressões inflacionárias estão longe de dar um alívio. Janeiro começou com muita chuva nas regiões Sudeste e Centro-Oeste e com seca no Sul no Brasil, o que já está empurrando o valor dos alimentos para cima. Em dezembro, especificamente, o IPCA cravou elevação de 0,50%, ficando quase no piso das estimativas do mercado, que variavam entre 0,49% e 0,60%. Mas o Ministério da Fazenda foi peça fundamental para tal resultado, ao reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos eletrodomésticos.

A queda do tributo ocorreu em 1º de dezembro, início da coleta de dados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo Eulina Nunes, coordenadora do Índice de Preços do órgão, com a diminuição do IPI de fogões, geladeiras e máquinas de lavar, o grupo composto por artigos de residências, que havia acumulado alta de 3,53% em 2010 e respondido por 0,15 ponto percentual do IPCA de 5,91%, fechou o ano passado com variação zero. "Com certeza, a redução do IPI fez a diferença na inflação de dezembro", admitiu a técnica. Ela ressaltou ainda que houve um arredondamento da taxa final de 2011, que atingiu 6,4994%.

A comemoração no BC foi grande, pois, até o último minuto, a maior parte dos analistas financeiros apostou no estouro do teto da meta. Publicamente, porém, o presidente da instituição preferiu manter o distanciamento e, por meio de uma sisuda nota, limitou-se a chamar a atenção para o cumprimento da meta de inflação pelo oitavo ano consecutivo. Tombini garantiu que a inflação ao consumidor seguirá recuando e se deslocando em direção ao centro do objetivo fixado pelo CMN. A previsão da autoridade monetária para o IPCA de 2012 é de 4,7%, mas os analistas apostam em um índice próximo de 5,5%.

Eulina destacou que o pior momento para a inflação do ano passado foi o primeiro trimestre, quando o IPCA acumulou alta de 2,44%, por causa da influência do grupo educação. Houve também pressão dos alimentos, movimento que continuou forte entre abril e junho. O BC, por sinal, aumentou os juros ao longo dos primeiros seis meses de 2011. "No cômputo geral, os grupos que mais pesaram na inflação foram o alimentação, com alta de 7,18%, e o transportes, com 6,05%. Eles responderam, respectivamente, por 1,69 e 1,13 ponto percentual do IPCA, ou seja, mais da metade da taxa", acrescentou. No grupo transportes, o grande vilão foi a passagem aérea, com reajuste de 52,91%.

Que o diga a servidora pública Sílvia Helena Firmino. Ela viaja pelo menos uma vez por semana para os mais variados destinos. "Estou gastando pelo menos 40% mais com passagens do que há um ano. Isso porque só compro bilhetes por meio de promoções", afirmou. Na avaliação de Eulina Nunes, do IBGE, as empresas aéreas aproveitaram eventos como o Rock in Rio, no Rio de Janeiro, e a turnê do Cirque du Soleil em vários estados para forçar os aumentos de preços.

Na opinião de André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, mesmo com o IPCA não estourando o teto da meta, o BC terá de ser mais comedido na redução dos juros. Ele prevê que a taxa básica (Selic) cairá mais um ponto neste ano, dos atuais 11% para 10%. Segundo Jankiel Santos, economista-chefe do BES Investimento, a prioridade do governo será evitar uma desaceleração mais forte da atividade econômica.

Novo cálculo A partir deste mês, o IPCA passará a ser calculado pelo IBGE com base em uma nova estrutura de consumo dos brasileiros, identificada por dados levantados na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) realizada entre 2008 e 2009. Em relação à POF 2002-2003, que foi utilizada até dezembro, há alterações importantes, que refletem mudanças na vida das famílias. O item habitação, por exemplo, passou a comprometer maior parte da renda e, por isso, terá peso mais alto. Alimentação em geral terá ponderação menor, mas a alimentação fora do domicílio ganha importância.