Geddel vai para prisão domiciliar

ANDRÉ DE SOUZA

13/07/2017

 

 

Desembargador considera que ex-ministro não obstruiu Justiça

O desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), converteu a prisão preventiva do exministro Geddel Vieira Lima em prisão domiciliar. Ele terá de usar tornozeleira eletrônica e não poderá utilizar o telefone e manter contato com outros investigados. Caso não cumpra as condições estabelecidas, o benefício poderá ser revogado. Ainda não há informação de quando Geddel deixará o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.

Geddel, que foi ministro da Secretaria de Governo de Michel Temer, foi detido em 3 de julho, por ordem do juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília. O principal motivo que o levou à prisão foi a acusação de tentativa de obstrução de Justiça. Os investigadores afirmam que, entre maio e junho, Geddel fez ligações por meio do WhatsApp para Raquel Pitta, esposa de Lúcio Funaro, que está preso desde julho de 2016 e é apontado como operador do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. Como Funaro está negociando um acordo de delação, isso foi interpretado como tentativa de impedir sua colaboração.

O desembargador federal Ney Bello refutou os argumentos. Segundo ele, é esperado que um investigado procure a mulher de outro para buscar informação sobre uma eventual delação.

“Não há delito aparente em obter informação, quando este ato não é ilegal e muito menos criminoso. Mais que isso, é um ato até esperado, considerando a inexistência de proibição de contato com a esposa do delator e a natureza da posição de investigado do próprio Geddel. Donde o ilícito?", questionou o desembargador.

Na decisão, o magistrado ressaltou que a esposa de Funaro negou ter sido ameaçada.

“Evidente que se houvesse corrupção, ameaça, agressão, destruição de provas ou acerto de versões o crime existiria e a prisão preventiva estaria justificada. Não é o caso, conforme as próprias declarações da esposa do réu Lúcio Bolonha Funaro", acrescentou.

O desembargador destacou que a prisão preventiva é uma medida excepcional e que não pode se transformar em antecipação da pena. No caso de Geddel, conforme apontou Ney Bello, não houve sequer denúncia do Ministério Público Federal (MPF). Prendê-lo agora, segundo ele, seria uma violação ao princípio da presunção da inocência.

Raquel Pitta entregou cópias da tela de seu Whatsapp. Na agenda, o ex-ministro era identificado pelo nome “Carainho”. Em depoimento à Polícia Federal (PF), a esposa de Funaro relatou que Geddel sempre telefonava para ela. Também disse que o ex-ministro "fez uma ligação informando-a que estaria indo pra Brasília e falaria com Padilha para tentar resolver a situação de Lúcio". Para os investigadores, é uma referência ao ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha.

Para justificar a prisão, o juiz Vallisney também destacou a suspeita de que Geddel recebeu R$ 20 milhões de propina em 2014, não havendo notícia do paradeiro do dinheiro. Para refutar esse argumento, o desembargador ironizou os conhecimentos linguísticos de Vallisney.

 

CRÍTICAS A JUIZ

“Há de se fazer uma observação: condenação final em processo criminal, por fatos ilícitos, é totalmente distinta de hipótese de cabimento de prisão cautelar. Não se há de decretar prisão preventiva em razão de fatos pretéritos. A própria língua portuguesa, através da palavra preventiva, pressupõe a ideia de prevenir a sociedade e o processo — principalmente em sua fase de instrução — de atos praticados pelo infrator. Ofende o direito e o vernáculo prender preventivamente alguém por ato pretérito, sem contemporaneidade", escreveu Ney Bello.

O desembargador destacou ainda que, no caso de Funaro, a possibilidade de movimentar contas em paraísos fiscais é argumento para a manutenção da sua prisão. O caso de Geddel, no entanto, seria diferente:

“O decreto prisional não esclarece sequer dados mínimos: quais contas seriam possíveis? Que paraísos fiscais? Que valores? Que pagamentos? Que movimentações?”

Ao decretar a prisão, o juiz de primeira instância afirmou que o ex-ministro tem muito poder nas mãos, o que poderia atrapalhar as investigações. O desembargador, mais uma vez, discordou do argumento.

O globo, n. 30656, 13/07/2017. PAÍS, p. 21