Cabral admite ter tido conta no exterior

JULIANA CASTRO

13/07/2017

 

 

Ex-governador relata que tinha um gasto médio mensal de R$ 200 mil

O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) admitiu ontem, pela primeira vez, ter tido uma conta no exterior, no fim da década de 1990, chamada de “Eficiência”. Em depoimento ao juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, ele confirmou que tinha quase US$ 2 milhões num banco em Nova York.

Essas informações tinham sido trazidas pelos doleiros Renato e Marcelo Chebar em delação premiada. Cabral disse que o dinheiro tinha origem em sobras de campanhas eleitorais. O ex-governador declarou, no entanto, que, em 2003, comunicou aos irmãos que não queria mais manter as contas no exterior e pediu que eles trouxessem e administrassem os recursos no Brasil.

Cabral negou diversas vezes que o dinheiro devolvido pelos doleiros seja dele. Os irmãos Chebar apontaram mais de US$ 100 milhões em contas fora do país que seriam do peemedebista, do ex-secretário Wilson Carlos e de Carlos Miranda, apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) como operador de Cabral. O dinheiro foi repatriado e parte dele usado para pagar aposentados do estado.

— Não tenho nada a ver com esses recursos — disse Cabral, sobre os US$ 100 milhões devolvidos pelos Chebar que estavam no exterior. — Fico feliz que esse dinheiro tenha voltado.

Em depoimentos prestados anteontem, os irmãos Chebar disseram que, no ápice, as contas do esquema Cabral no exterior chegaram a ter US$ 120 milhões. O valor foi atingido com investimentos.

— Imagina se eu vou deixar US$ 120 milhões com dois irmãos sem documento — afirmou o peemedebista.

O ex-governador disse que, em 2015, os doleiros pararam de administrar o dinheiro. Nesse momento, havia entre R$ 3,5 milhões e R$ 5 milhões de saldo no banco. Com os gastos mensais, o ex-governador disse que não há mais nada dessa verba. Ele afirmou que os doleiros — a quem chamou de irmãos criativos Chebar — prestavam serviços para ele durante as campanhas e que, eventualmente, efetuavam o pagamento de gastos pessoais.

 

‘NÃO VIVIA COM O MEU SALÁRIO’

Cabral admitiu que não vivia com recursos próprios. O peemedebista confirmou declaração dada em depoimento por sua secretária, Sônia Batista, de que os gastos mensais da família giravam em torno de R$ 200 mil.

— Não vivia com o meu salário. Eu errei ao usar caixa dois — declarou, atribuindo a todo momento os recursos que mantinha a sobras de campanha.

— Não sou corrupto. Não fiz negociação — disse Cabral, sobre as empreiteiras que citaram pagamento de propinas a ele. — Mas essas empresas ajudaram na campanha.

Cabral admitiu que sua mulher, Adriana Ancelmo, recebeu um anel do empreiteiro Fernando Cavendish durante um aniversário, como O GLOBO revelou. O ex-governador contou que a joia foi devolvida após o escândalo que envolveu a Delta na CPI do Cachoeira. O peemedebista confirmou ainda que comprou joias da H.Stern no exterior e que o pagamento foi feito pelos irmãos Chebar.

No fim da audiência, o juiz permitiu que Cabral e Adriana, que também prestou depoimento ontem, se vissem por dez minutos, com a presença da escolta.

O ex-governador foi preso em novembro do ano passado, na Operação Calicute. No depoimento do processo sobre essa ação, ele se negou a responder perguntas de Bretas e do MPF e só falou quando perguntado pelos próprios advogados. A estratégia tinha sido usada no depoimento ao juiz Sergio Moro no processo a que Cabral respondia em Curitiba e no qual foi condenado. Houve uma mudança na estratégia da defesa e, a partir dos depoimentos desta semana, Cabral passou a responder a todos os questionamentos.

O globo, n.30656 , 13/07/2017. PAÍS, p. 21