Título: A primeira queda na família de Bezerra
Autor: Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 07/01/2012, Política, p. 2

Irmão do ministro da Integração Nacional vai deixar a presidência da Codevasf, estatal vinculada à pasta. O substituto é ligado ao PT, o que diminui a influência do PSB

Vinicius Sassine Josie Jeronimo Paulo de Tarso Lyra

Clementino de Souza Coelho, irmão do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho, será afastado nos próximos dias da presidência da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), estatal vinculada ao ministério. A Presidência da República, por meio da Casa Civil, confirmou no início da noite de ontem o afastamento de Clementino e a nomeação do diretor interino da Área de Revitalização de Bacias Hidrográficas, Guilherme Gonçalves Almeida de Oliveira, para a presidência da Codevasf. A decisão foi comunicada em nota da Casa Civil no mesmo dia em que o Correio revelou a atuação de Fernando Bezerra e de Clementino em benefício da região de Petrolina (PE) — base eleitoral da família — e de empresas pertencentes ao ministro e seus irmãos.

As reportagens do Correio mostraram que um edital assinado por Clementino, diretor de Desenvolvimento Integrado e Infraestrutura da Codevasf desde 2003 e presidente em exercício da estatal desde 3 de janeiro de 2011, destinou 22.799 cisternas de plástico das 60 mil previstas (38%) para a região de Petrolina. Nenhuma outra região vai receber tantos equipamentos, que custarão ao todo R$ 210,6 milhões ao Ministério da Integração Nacional. O filho do ministro, o deputado federal Fernando Bezerra Coelho Filho (PSB-PE), é pré-candidato à Prefeitura de Petrolina nas eleições deste ano.

Um levantamento do Plano Brasil sem Miséria mostra que Pernambuco é apenas o terceiro estado em demanda por cisternas, atrás da Bahia e do Ceará. Empresas do ministro e de outro irmão, Caio Coelho, são beneficiadas por projetos de irrigação da pasta. Quando Clementino era apenas diretor de Infraestrutura, a Codevasf autorizou o fornecimento de água para um perímetro irrigado onde está a empresa. Clementino assumiu a presidência interina da estatal no mesmo dia em que o irmão tomou posse no ministério. E assim permaneceu por um ano.

"O ministro Fernando Bezerra encaminhou a esta pasta, há cerca de 50 dias, o pedido de nomeação de Guilherme Almeida para presidir a Codevasf. A assunção à presidência exige novas consultas", diz a nota da Casa Civil. "Tendo sido concluídas as consultas, Guilherme será nomeado nos próximos dias. Clementino Coelho exerce provisoriamente o cargo de presidente por ser o membro mais antigo da diretoria da Codevasf." O Planalto ainda não havia se manifestado sobre o comando da estatal.

Nepotismo A escolha de Guilherme Almeida indica que o governo decidiu por um deslocamento de poder do PSB para o PT. No início de 2011, o nome do piauiense Rubens Martins foi apresentado pelos socialistas para substituir Orlando Cezar da Costa Castro, que presidiu a companhia de 2007 a 2010, nomeado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O nome de Rubens não foi aceito pelo PT do Nordeste, que apoiava Guilherme. Ele foi superintendente da Codevasf durante o governo do hoje senador Wellington Dias (PT) no Piauí (2003 a 2010).

A escolha de Guilherme Almeida para a estatal mostra que o partido da presidente Dilma Rousseff quer retomar influência no Ministério da Integração e que Pernambuco perdeu espaço para o Piauí na Codevasf. Depois da revelação dos privilégios que o ministro da Integração Nacional concedeu a seu irmão Clementino Coelho no comando da empresa pública, o governo ganhou argumentos para rejeitar o nome de Rubens Martins. Ele é irmão do governador do Piauí, Wilson Martins, filiado ao PSB, e o Planalto já se esforça para argumentar que o episódio Clementino/Fernando Bezerra não configura caso de nepotismo.

O que diz a lei O Decreto nº 7.203, de 2010, definiu regras que proíbem o nepotismo no Executivo. O texto é composto por exigências da Lei nº 8.112, de 1990, atualizado pela Súmula Vinculante nº 13, de 2008, do Supremo Tribunal Federal. A norma assinada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva detalha as regras contra o nepotismo na Esplanada e no Planalto. Familiares e cônjuges de ministros, dirigentes e ocupantes de cargos em comissão, função de confiança e chefia de assessoramento ficam proibidos de assumir cargos em pastas ou órgãos respectivos dos parentes. O decreto abrange ainda a contratação de funcionários temporários e, até mesmo, estagiários sem processo de seleção. O nepotismo cruzado também é vedado.

O decreto permite, no entanto, que servidores federais do quadro efetivo permaneçam no cargo em caso de algum familiar entrar para o órgão onde o funcionário está lotado. Mas a regra proíbe que um parente permaneça sob a subordinação direta de agentes públicos. Em casos não previstos pelo decreto, a Controladoria-Geral da União (CGU) deve se manifestar para resolver os conflitos.