Título: Falta apenas a carta
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Correia, Karla
Fonte: Correio Braziliense, 01/02/2012, Política, p. 2

Com dois auxiliares exonerados em uma semana, Negromonte dá sinais de ter jogado a toalha e não aparece em reunião no Planalto. Aliados contam com a demissão dele para os próximos dias. Substituto deve ser o deputado Aguinaldo Ribeiro (PB)

Brasília e Havana — O ministro das Cidades, Mário Negromonte, terá seu futuro definido ainda nesta semana, assim que a presidente Dilma Rousseff retornar da viagem a Cuba e ao Haiti. O próprio ministro, que chegou a dar uma entrevista dizendo estar "mais firme que as pirâmides do Egito", jogou a toalha nos últimos dias. Ontem, faltou a uma reunião do Grupo de Monitoramento do PAC, comandada pela chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. Ligou para a ministra , alegando "estar preso em uma agenda interna". Gleisi disse que tudo bem.

Curiosamente, aos correligionários, afirmou que não tinha compromissos no ministério ao longo de todo o dia. Na quinta-feira passada, durante reunião com parlamentares de Minas Gerais em busca de mais recursos para o estado, demonstrou mais uma vez seu grau de desânimo com o próprio futuro. "Negociem a liberação desses recursos com o próximo ministro."

Durante entrevista coletiva concedida a jornalistas brasileiros em Havana, a presidente Dilma Rousseff repetiu o mesmo argumento dado no caso de Carlos Lupi, quando também estava em viagem ao exterior — no caso, a Venezuela. "As questões relativas ao Brasil. Eu já disse isso para vocês anteriormente. Vocês são insistentes, inteligentes e rápidos", disse, sem esconder o sorriso. "As questões relativas ao Brasil nós discutimos no Brasil, a partir de quinta-feira", comentou.

O cerco a Negromonte, que havia amainado no ano passado, fechou-se novamente neste início de ano. Dois assessores diretamente ligados a ele tiveram que deixar a pasta. O primeiro exonerado foi Cássio Peixoto, chefe de gabinete do ministro. Peixoto é apontado como autor da fraude em uma obra da Copa do Mundo de 2014. Na segunda-feira, foi a vez do assessor parlamentar do ministério João Ubaldo Dantas. Ele é responsável pela interlocução da pasta com o Congresso.

Articulação O ministro tentou ontem minimizar o desgaste com seus pares. Ele fez questão de ligar para o presidente do partido, Francisco Dornelles (RJ), para negar que tivesse entregue o cargo à presidente Dilma durante solenidade da assinatura da ordem de serviço de revitalização urbanística da Bacia do Rio Camaçari. Mas a saída dele já é digerida há tempos. A principal preocupação do governo é evitar que sua demissão acabe por transformar o aliado PP em um novo PR, legenda que, com a demissão de Alfredo Nascimento do Ministério dos Transportes, deixou a base aliada e declarou independência em relação ao governo nas votações no Congresso.

Mesmo mal avaliado como gestor pela presidente Dilma Rousseff, Negromonte ainda detém relativo peso político na relação entre governo e Congresso. Durante a corrida presidencial de 2010, foi ele o principal responsável pela negociação que resultou na adesão do PP à candidatura de Dilma Rousseff, enquanto boa parte do partido queria ficar neutro ou aliar-se ao PSDB — isso ocorreria se o candidato tucano fosse o senador Aécio Neves (MG).

As ministras da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, mais o governador da Bahia, Jaques Wagner, são os encarregados de fazer a articulação com o partido, em busca de um nome que represente uma bancada pepista pacificada e sintonizada com o governo.

O nome mais bem avaliado para a sucessão de Negromonte é o atual líder do PP na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PB), por seu perfil conciliador e afinado com o Planalto. A nomeação do atual líder na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), seria uma derrota para o grupo de Negromonte, que defende a indicação dos também deputados Nelson Meurer (PR), antecessor de Aguinaldo na liderança da Casa, e de Waldir Maranhão (MA).

Também citado entre os mais cotados para o cargo, o deputado Márcio Reinaldo Moreira (MG) seria excessivamente próximo do senador Aécio Neves (PSDB-MG), que, apesar do bom trânsito com o governo, é o nome mais forte do PSDB para concorrer à Presidência em 2014.

Da mesma forma, o senador Francisco Dornelles (RJ) é rechaçado por setores do governo por sua aproximação com o tucano José Serra, de quem quase foi candidato a vice na chapa presidencial derrotada em 2010 por Dilma. Sob a batuta de Aguinaldo, a bancada do PP na Câmara deve se reunir hoje para avaliar os reflexos da crise em torno de Negromonte na relação com o governo.

Dornelles, no entanto, reafirmou que não vai tratar da substituição de Negromonte enquanto ele se mantiver à frente da pasta. "Sobre a saída de Negromonte, você tem que perguntar a ele. Não faço previsões, só comento fato concreto. E não tenho falado com ele. Sobre esse assunto, prefiro falar quando tiver alguma notícia", avisou Dornelles.

Colaboraram Juliana Braga e Gabriel Mascarenhas