Presidenciáveis perdem adesão nas redes

MARLEN COUTO

30/07/2017

 

 

Cotados para disputar eleições de 2018 registram queda de interações no Facebook em seis meses

Ainda mais estratégicas na eleição de 2018, a primeira presidencial sem permissão para doações de empresas, as redes sociais, terra dos memes e das polarizações, já não estão hoje tão interessadas nos principais cotados para a disputa como no início do ano. Levantamento do Núcleo de Dados do GLOBO revela que em junho os perfis de sete presidenciáveis no Facebook somaram queda de 66% em suas interações mensais em comparação a janeiro, quando apresentaram pico de curtidas, comentários e compartilhamentos nos últimos seis meses.

Isso significa que a média de interações por postagem, considerando todos os possíveis candidatos, caiu de 42,8 mil para 14,6 mil. Em números absolutos, o total de curtidas, comentários e compartilhamentos passou de 13,5 milhões para 7,1 milhões no último mês. Todos os presidenciáveis chegaram com saldo negativo ao fim do primeiro semestre. O levantamento levou em conta os nomes mais citados nas pesquisas de intenção de voto.

Na média mensal por postagem, espécie de taxa de aproveitamento na rede social, apenas Marina Silva (Rede) registrou alta no mês passado (22%). A ex-senadora, porém, tem baixa frequência de postagens e ainda atinge menos usuários dispostos a interagir com suas publicações do que seus principais concorrentes.

Os mais atingidos pela queda de interações foram o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), e Ciro Gomes (PDT). Ambos perderam 74% de compartilhamentos, curtidas e comentários. A terceira maior queda proporcional ocorreu na página oficial do ex-presidente Lula, que viu seu total de interações cair 63% frente a janeiro, após apresentar alta de engajamento em fevereiro.

 

DORIA PERDE LIDERANÇA PARA BOLSONARO

Doria chegou a ultrapassar o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) em número de interações a partir de fevereiro, mas voltou a ficar em segundo lugar no mês passado. Como mostrou O GLOBO no início do ano, o tucano paga do próprio bolso uma equipe exclusivamente para cuidar dos seus canais nas redes sociais. O levantamento mostra, no entanto, que a estratégia já não tem o mesmo efeito que tinha no início do seu mandato na prefeitura de São Paulo.

No caso de Ciro Gomes, a comparação é com março, quando o ex-ministro criou sua página oficial no Facebook. Por lá, não é raro encontrar usuários que reclamam da falta de profissionalismo do seu perfil, em que é possível encontrar até vídeo transmitido quase de cabeça para baixo e imagens esticadas pela falta de qualidade. “Tem que chamar um cameraman melhor para a campanha eleitoral”, comenta um simpatizante. “Por enquanto, eu quero manejar esta página pessoalmente (estou aprendendo). Não quero ainda entregar minha comunicação aos profissionais. Quero, até onde der, manter minha participação aqui completamente pessoal”, publicou Ciro Gomes em março.

A maioria dos presidenciáveis, por outro lado, ampliou o número total de seguidores em seis meses. Bolsonaro (4,3 milhões de seguidores), Lula (2,9 milhões) e Doria (2,8 milhões) lideram o ranking. As páginas de Marina Silva e José Serra (PSDB-SP) foram as únicas que perderam curtidas neste período.

 

EFEITO DO ALGORITMO E ANTIPATIA DAS REDES

Para o cientista político Rafael Sampaio, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a queda de interações pode ter relação com o algoritmo do Facebook que influencia quais publicações de amigos e páginas aparecem ou não na linha do tempo de cada usuário.

— A explicação é o próprio Facebook. O algoritmo, às vezes, diminui o alcance das páginas, até para que paguem para serem disseminadas, e, dependendo dos temas que estão sendo discutidos na rede social, uma página pode ser inflada — argumenta o pesquisador.

Mas, para Sampaio, a queda do desempenho dos presidenciáveis também pode ser reflexo da antipatia aos políticos e da falta de sintonia com a agenda da rede social, preocupada com assuntos mais imediatos, como a crise econômica.

— É como se os próprios usuários do Facebook estivessem entendendo que essa páginas não são tão importantes para o que está em discussão e em pauta agora. A crise econômica está aí, e o preço da gasolina subiu. São preocupações mais imediatas, 2018 ainda está longe demais. Além disso, o nível de confiança nas instituições é cada vez menor. Estamos em um momento de antipolítica, pode ser uma espécie de antipatia também — analisa o professor da UFPR.

Diretor da Associação Latino Americana de Consultores Políticos (Alacop), Marcelo Weiss defende que há um cansaço com a discussão “sem resultado efetivo”.

— É um ano de crise, em que as pessoas não estão conseguindo sobreviver com facilidade. Elas não priorizam a política, porque precisam resolver questões do dia a dia. O principal fator é um cansaço na discussão sem resultado efetivo. O eleitor está esperando fatos mais relevantes e tem priorizado coisas que sejam mais prazerosas, o lazer. Além disso, há uma tendência de adiar decisões eleitorais até o último momento. A partir do meio do ano que vem, a interação deve aumentar — conclui o consultor.

Professor de Comunicação Política da PUC Rio, Arthur Ituassu também destaca o impacto do algoritmo do Facebook. O pesquisador vê no desempenho de Doria e de Jair Bolsonaro o fortalecimento da direita nas redes.

— O que é possível dizer é que há uma direita forte no Facebook em função de um contexto mais conservador e porque posicionamentos em relação a questões polêmicas tendem a ter maior visibilidade nesse ambiente, que é muito polarizado — ressalta Itaussu, para quem o uso negativo da rede social pode ganhar força em 2018. — A velocidade da internet é maior que a capacidade de regular a campanha nesses espaços. A coisa muito solta vai dar margem para seu uso negativo. É possível que tenhamos uma campanha suja na internet. A sociedade civil e o próprio jornalismo vão ter o papel de acompanhar o conteúdo que vai circular, seu grau de veracidade.

O globo, n.30673 , 30/07/2017. PAÍS, p. 10