TRF absolveu 30% dos condenados por Moro na 1ª instância

Gilberto Amendola

29/06/2017

 

 

Em 12 de 43 processos, as penas foram reformadas pela corte; maior repercussão ocorre em caso que contestou delação como única prova

A absolvição do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto – acusado de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa –, anteontem, pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF- 4), integra um porcentual de 30% de réus condenados pelo juiz federal Sérgio Moro que já se livraram das penas na segunda instância.

Dos 43 casos de Moro que chegaram ao tribunal, 12 resultaram em absolvição. Em 13 processos houve aumento de pena; em cinco, redução; e em 13 vezes as penas foram mantidas.

Ou seja, em quase 70% dos casos as decisões do juiz titular da 13.ª Vara Federal foram reformadas pelo TRF-4 .

A corte, com sede em Porto Alegre, tem jurisdição nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Composta por três desembargadores, a 8.ª Turma Criminal é responsável por julgar as sentenças de Moro em segunda instância. No caso de Vaccari, o tribunal informou que os desembargadores entenderam que as provas contra o réu eram “insuficientes” e se basearam “apenas em delações premiadas”.

Essa decisão foi a que mais repercutiu até o momento por se tratar de um tema bastante polêmico no âmbito das investigações e sentenças proferidas na Lava Jato. “A delação não é considerada uma prova definitiva, algo que possa ser responsável por colocar alguém na cadeia”, disse Marcelo Figueiredo, professor de Direito Público da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). “Nesse sentido (a delação), faz parte de uma narrativa, tem de estar dentro de um contexto de investigação. Por isso, absolver alguém que tenha sido delatado não é um problema e não causa espanto.” Na denúncia inicial, o ex-tesoureiro era acusado de ter intermediado para o PT “ao menos R$ 4,26 milhões de propinas acertadas com a Diretoria de Serviços e Engenharia da Petrobrás pelo contrato do Consórcio Interpar”.

A sentença de Moro foi de 15 anos e 4 meses de prisão.

Na mesma decisão, a turma aumentou a pena do ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque em 23 anos, manteve a pena do empresário Adir Assad, e diminuiu a pena de Sônia Mariza Branco e Dario Teixeira Alves Júnior. Mesmo após o julgamento das apelações, os réus ainda podem recorrer na própria corte questionando a decisão do colegiado.

Processos. As revisões ocorreram em diversos processos. Entre os mais midiáticos está o do doleiro Alberto Youssef. Ele teve sua pena aumentada em segunda instância, mas foi absolvido no caso da compra do automóvel Range Rover – um dos primeiros indícios colhidos pela Lava Jato de envolvimento de um executivo da Petrobrás com o esquema do doleiro de Londrina.

Outro caso emblemático é do ex-deputado petista André Vargas, condenado em primeira instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A sentença de Moro foi de 14 anos e 4 meses de reclusão. Já, na segunda instância, a pena de Vargas foi reduzida para 13 anos e 10 meses.

O TRF-4 também não pode ser considerado benevolente com os réus condenados. Em muitos casos, as penas em segunda instância superaram aquelas proferidas por Moro.

Foram os casos de Nestor Cerveró e Fernando Baiano. Cerveró, por exemplo, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, teve sua pena estabelecida em 27 anos e 4 meses de reclusão, mais do que o dobro da sentença de Moro, que era de 12 anos, 3 meses e 10 dias. Já Baiano, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, também teve a pena aumentada de 16 anos, 1 mês e 10 dias para 26 anos de reclusão.

‘Engessado’. O número expressivo de decisões reformadas mostra uma mudança considerável no entendimento dos desembargadores. Até dezembro do ano passado, dos 28 condenados por Moro que recorreram ao tribunal apenas quatro tinham conseguido a absolvição.

Ou seja, um pouco menos de 15 % do total. Para Sérgio Salomão Shecaira, professor titular de Direito Penal da Universidade de São Paulo (USP), a mudança de comportamento do TRF-4 é bem-vinda e tem uma explicação.

“Até o ano passado, o TRF-4 ficou engessado com a pressão da opinião pública e com tudo aquilo que envolvia a Lava Jato. Agora, passado esse primeiro momento, é natural que existam revisões, aumentos, reduções e até absolvições. O surpreendente seria o contrário disso, surpreendente seria se não houvesse reavaliações. A Justiça existe para isso”, afirmou.

LAVA JATO

● O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), com sede em Porto Alegre, tem jurisdição nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. É ele o responsável por julgar as sentenças do juiz Sérgio Moro em segunda instância

Apelações

Ao todo, o juiz Sérgio Moro já proferiu 31 sentenças na Lava Jato, que somam 144 condenações

43

CASOS CONDENADOS POR MORO QUE RECORREM AO TRF4

12 casos

réus sentenciados por Moro foram absolvidos

5 casos

houve redução de pena

13 casos

houve aumento de pena

13 casos

as penas foram mantidas

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Juiz federal mantém ex-tesoureiro preso em Curitiba

Julia Affonso, Fausto Macedo, Luiz Vassallo e Ricardo Brandt

29/06/2017

 

 

Moro despacha alvará de soltura de decisão do TRF-4, mas mantém petista detido por outro processo na Java Jato

Um dia depois de o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, em Porto Alegre, absolver João Vaccari Neto em uma condenação na Operação Lava Jato, o juiz federal Sérgio Moro concedeu liberdade ao petista. No entanto, Vaccari continuará detido em Curitiba porque tem contra si outro mandado de prisão na Lava Jato.

A decisão do magistrado foi dada em decorrência do julgamento do TRF-4, que absolveu o ex-tesoureiro da condenação de 15 anos e 4 meses imposta a ele na primeira instância.

No despacho, Moro determinou “à autoridade policial que, ao ser-lhe apresentado o presente alvará de soltura, indo por ele assinado, proceda à baixa do mandado de prisão preventiva”.

Vaccari está preso desde abril de 2015, acusado pela força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. O petista seria o arrecadador de propinas de seu partido no esquema de corrupção instalado na Petrobrás entre 2004 e 2014.

O ex-tesoureiro foi condenado por Moro em cinco ações criminais.

As penas somavam 45 anos e 6 meses de prisão. A decisão do TRF-4 absolveu Vaccari em um dos processos. A revisão da sentença de Moro, com pena de 15 anos e 4 meses, reduz o tempo de prisão para 30 anos e 2 meses.

Ao dar baixa no primeiro mandado de prisão de Vaccari, recolhido no Complexo Médico-Penal de Pinhais, região metropolitana de Curitiba, Moro afirmou que Vaccari cumpre o mandado de prisão e por isso não deve ser colocado em liberdade apesar da decisão de anteontem do TRF-4. “Evidentemente, se for o caso, caberá ao TRF-4 estender ou não os efeitos da revogação da preventiva ao outro processo”, afirmou.

Falta de provas. Ao absolver o ex-tesoureiro do PT em segunda instância, o desembargador federal Victor Luiz dos Santos Laus, do TRF-4, afirmou que “faltou corroboração da palavra dos colaboradores”.

Vaccari, denunciado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa, havia sido condenado a 15 anos e 4 meses de prisão por Moro. Anteontem, por maioria, a 8.ª Turma do TRF-4, derrubou a sentença do magistrado da Lava Jato.

Quanto ao réu Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobrás, foi dado provimento ao apelo do Ministério Público Federal (MPF) e a pena passou de 20 anos e 8 meses para 43 anos e 9 meses de reclusão. A turma aplicou o concurso material nos crimes de corrupção em vez de continuidade delitiva.

Duque também foi condenado pelos crimes de lavagem de dinheiro e associação criminosa na Lava Jato. / JULIA AFFONSO, FAUSTO MACEDO, LUIZ VASSALLO e RICARDO BRANDT

Condenação. Penas de Vaccari somavam mais de 45 anos

 

O Estado de São Paulo, n. 45180, 29/06/2017. Política, p. A10