Renan ataca Temer ao deixar liderança 

Isabela Bonfim e Thiago Faria

29/06/2017

 

 

Senador sai do comando da bancada do PMDB; no plenário, diz que ‘não é marionete do governo’ e acusa presidente de ter ‘postura covarde’

O senador Renan Calheiros (PMDB-AL) anunciou ontem no plenário do Senado sua saída da liderança do PMDB e afirmou que não é “marionete do governo”. O peemedebista disse que não vai ceder a Michel Temer e afirmou que o presidente tem “postura covarde” diante dos direitos trabalhistas.

Investigado na Operação Lava Jato, Renan já havia ameaçado deixar a liderança e vinha fazendo críticas ao governo há alguns meses. A escolha do substituto do peemedebista na liderança ficou para a próxima semana porque o governo pretende buscar um nome de consenso na bancada (mais informações nesta página).

“Não seria jamais líder de papel, nem lideraria o PMDB contra trabalhadores e aposentados.

Estou me libertando de uma âncora pesada e injusta.

Permanecer na função seria ceder a um governo que trata o partido como um departamento do Poder Executivo e eu não tenho a menor vocação para marionete”, afirmou. O peemedebista disse que, agora, poderá exercer a função de senador com total independência.

Renan alegou que, ao contrário do que dizem, ele “sinceramente” não detesta Temer. “O que eu não tolero é sua postura covarde diante do desmonte da consolidação do trabalho”, afirmou o senador.

O peemedebista usou a crítica à reforma trabalhista como mote para se distanciar do presidente.

“O governo não tem legitimidade para conduzir essas reformas complexas que, em vez de resolver o problema, agravam”, disse Renan.

O senador voltou a dizer que é a favor das reformas, mas fez críticas pontuais à reforma trabalhista e à decisão do governo de aprovar o projeto sem dar ao Senado a chance de fazer modificações no texto. “Votar a terceirização ampla e irrestrita sem passar pelo Senado e a reforma trabalhista sem que o Senado possa alterar uma linha é demais”, disse o senador em referência à lei da terceirização.

Delação. Renan afirmou também que Temer é atualmente influenciado pelo ex-presidente da Câmara, o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atualmente preso em Curitiba na Operação Lava Jato.

Ele relembrou em seu discurso a gravação da conversa entre o delator Sérgio Machado e o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR). “Surgiu uma frase de Romero Jucá, que afirmou que o impeachment não saía porque eu, Renan, tinha certeza de que o Eduardo Cunha mandaria no governo Michel Temer.

Jucá disse que Eduardo Cunha estaria politicamente morto. Foi um ledo engano. Eduardo Cunha permanece nomeando ministros, dando as ordens diretamente do presídio e apequenando um governo cuja República periclita nas suas mãos”, afirmou.

A notícia de que Renan deixaria a liderança do PMDB já era conhecida desde o início da manhã de ontem. Discursos contrários ao governo ontem fortaleceram a movimentação na bancada para que ele fosse afastado do comando do grupo no Senado.

Na mesma noite, Jucá conversou com os senadores para acertar a destituição de Renan e a escolha de um novo nome.

Desavenças. Não foi a primeira vez que a liderança de Renan foi ameaçada. A própria eleição do líder, no início deste ano, foi conturbada, porque o senador fez uma manobra para afastar concorrentes da disputa. Mais tarde, as recorrentes críticas ao presidente e aos projetos do governo levaram Temer a chamar Renan para uma conversa no Palácio do Planalto. Ainda assim, a postura de Renan não mudou.

Os embates causaram mal-estar na bancada peemedebista, até que, há menos de um mês, outros senadores resolveram se reunir para tentar destituir o líder. Na época, Renan propôs um acordo para não falar mais em nome da bancada sobre as reformas estruturantes.

Apesar de a saída de Renan da liderança ser uma reivindicação da maioria da bancada do PMDB, a atitude também foi vista como uma estratégia política calculada. Renan acredita que terá mais chance de reeleição ao se descolar do governo.

Posição. Renan Calheiros (AL), com Lindbergh Farias (PT-RJ), anuncia entrega de cargo de líder do PMDB no Senado

‘Ordens’

“Eduardo Cunha (preso pela Lava Jato em Curitiba) permanece nomeando ministros, dando as ordens diretamente do presídio e apequenando um governo cuja República periclita nas suas mãos.”

Renan Calheiros (PMDB-AL)

SENADOR E EX-LÍDER DA BANCADA PEEMEDEBISTA

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Senador age por apoio de Lula em Alagoas em 2018

Vera Magalhães

29/06/2017

 

 

 

Os ataques cada vez mais virulentos desferidos pelo então líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), contra o presidente Michel Temer miram na sobrevivência política do cacique e de Renan Filho, governador de Alagoas, em 2018.

Renan terá imensa dificuldade de se reeleger senador, segundo mostram as pesquisas.

Não tem a opção, que será usada por muitos senadores encalacrados na Operação Lava Jato, de se candidatar a deputado: como o filho é governador, ele fica impedido de disputar outro cargo que não seja a reeleição.

Assim, Renan selou uma aliança tácita com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT: minar o governo de seu correligionário apostando na volta do petista em eleições diretas antecipadas, ou na chance de que ele seja um candidato forte em 2018.

Ainda que enfrente enorme rejeição pelos processos a que responde na Lava Jato, Lula ainda é um cabo eleitoral forte no Nordeste, base eleitoral do clã Calheiros. A presença do ex-presidente no palanque de Renan pai e filho, já negociada nos bastidores e incluída no pacote de ataques a Temer, é vista como importante para assegurar a sobrevida da família no mando político do Estado, um dos mais pobres do País.

O Palácio do Planalto, de olho na aliança Renan-PT, resolveu sair da passividade diante dos ataques e autorizou o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), a coletar assinaturas para destituir o antigo aliado da liderança do partido, o que fez com que Renan se antecipasse e saísse atirando.

 

O Estado de São Paulo, n. 45180, 29/06/2017. Política, p. A11