Temer desiste de pedido de suspensão de inquérito

Breno Pires e Isadora Peron

23/05/2017

 

 

GOVERNO SOB INVESTIGAÇÃO / Planalto vê risco de derrota no plenário do Supremo e muda estratégia jurídica; Cármen Lúcia havia determinado que julgamento ocorresse após PF finalizar perícia no áudio

 

 

A defesa do presidente Michel Temer desistiu ontem da petição que havia protocolado no sábado passado pedindo a suspensão do inquérito aberto contra o peemedebista no Supremo Tribunal Federal (STF). O pedido era para que a investigação fosse paralisada até a realização de perícia em áudio de conversa gravada entre o presidente e o empresário Joesley Batista, dono da JBS.

O Planalto mudou sua estratégia jurídica ao perceber que corria sério risco de derrota no plenário da Corte. A avaliação é que o julgamento no Supremo havia se tornado “um tiro no pé”, pois se os ministros referendassem a decisão do relator Edson Fachin, mantendo o inquérito, a mensagem seria a de fim do governo .

O anúncio do recuo foi feito pelos advogados de Temer logo após um encontro com Fachin, que também é relator da Operação Lava Jato no STF. Horas antes, a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, havia informado que o pedido de suspensão feito na semana passada, que estava previsto para ser analisado amanhã, só seria julgado após a conclusão da análise do áudio pela Polícia Federal.

O advogado Gustavo Guedes disse que a defesa se sentiu atendida com o deferimento do pedido para que fosse realizada uma perícia no áudio da conversa entre Temer e Joesley. Segundo ele, o presidente quer que o processo siga o curso normal e que fique comprovada a sua inocência.

O empresário foi recebido no Palácio do Jaburu e gravou uma conversa com o peemedebista durante um encontro no fim da noite do dia 7 de março. O inquérito aberto no Supremo apura suspeitas de crimes de corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça.

O senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) e o deputado afastado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) também são investigados no inquérito.

 

Julgamento. O novo posicionamento dos advogados de Temer dispensa a necessidade de julgamento no plenário. Fachin não havia confirmado, mas a própria defesa do presidente da República entende que não deve haver mais a sessão que estava prevista para amanhã.

“Eu vim dizer (ao ministro Edson Fachin) que, diante desse deferimento, não víamos mais a necessidade de suspender o processo e que o presidente quer que esse assunto seja resolvido o mais rápido possível.

O presidente quer dar essa resposta ao País o mais rapidamente possível”, disse Guedes.

A equipe que defende Temer no caso encomendou uma perícia particular do áudio. Conforme a análise da defesa do presidente foram constatados pontos de possível edição na gravação . “Na nossa avaliação, já não há dúvida, há convicção de que este áudio é imprestável”, disse Guedes.

O julgamento do Supremo previsto para amanhã era esperado com ansiedade pela classe política. A base aliada de Temer aguardava o resultado e o posicionamento dos ministros para decidir se permanecia ou não ao lado do peemedebista.

 

Presidente. Ministra Cármen Lúcia em seu gabinete no Supremo Tribunal Federal

________________________________________________________________________________________________________________________________

Perícia contratada diz que áudio não vale como prova

Carla Araújo e Renan Truffi

23/05/2017

 

 

Defesa de presidente contrata perito Ricardo Molina, que afirma ter ‘convicção de que gravação foi manipulada

 

 

 

O perito Ricardo Molina, contratado pela defesa do presidente Michel Temer para analisar a gravação feita pelo empresário Joesley Batista da conversa com o peemedebista, desqualificou ontem o áudio como prova no inquérito. Segundo ele, que preferiu não ser categórico sobre a existência de edições no arquivo, sua “convicção é a de que a gravação foi manipulada”. “Foram identificados ao menos seis pontos de possível edição”, disse o perito.

Mais cedo, o advogado de Temer, Gustavo Guedes, afirmou que havia sido identificada mais de 70 pontos de “obscuridades”.

Molina, que é professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e já atuou em diversos casos de repercussão nacional, também desqualificou o trabalho da Procuradoria- Geral da República (PGR), que, em sua avaliação, foi “ingênua” e “incompetente”. Segundo ele, os técnicos da PGR que assinaram laudo sobre a gravação “não sabem nada de áudio”.

“Se colocarem eles aqui na minha frente, eles vão começar a gaguejar.” O perito disse ainda esperar que a Polícia Federal leve em conta em sua análise e identifique falhas técnicas no material. Ontem, a PF disse ter recebido um dos equipamentos usados por Joesley para gravar as conversas com políticos e ainda aguarda um segundo. Para o perito, o gravador “parece seletivo” e não é possível afirmar que há uma sequência lógica na conversa.

 

Pagamento. Molina foi contratado pelo escritório do advogado Antônio Claudio Mariz, responsável pela defesa de Temer no inquérito no STF, e não quis revelar o valor do contrato. “Pergunte para quem contratou”, disse.

 

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45143, 23/05/2017. Política, p. A4.