Deputados aliados com medo de ‘botar a cara’

JÚNIA GAMA

CATARINA ALENCASTRO

LETICIA FERNANDES

02/08/2017

 

 

Base de Temer tem receio de exposição antes de nova denúncia da PGR

A apenas um dia da data prevista para a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer, deputados da base se mostravam reticentes a se exporem ao desgaste de fazer a defesa do peemedebista no plenário da Câmara. Entre alguns deputados do DEM, um dos principais partidos aliados, o clima é de torcida para que a oposição não dê o quorum necessário. Assim, os governistas não teriam que dar seus votos para salvar Temer.

O temor é que, após livrar Temer da denúncia, seja necessário voltar a se expor nos próximos dias, já que existe a expectativa de o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentar uma segunda denúncia contra o presidente em breve. Com o governo batendo recordes de impopularidade, os parlamentares têm resistido a defendê-lo.

— O sentimento é que está faltando “liga”. Temos conversado com os deputados e ninguém está animado para botar a cara, colocar sua digital para livrar o presidente, com o risco de chegar na semana que vem e vir mais uma denúncia por parte do Janot. Vejo muita gente torcendo para que a oposição não compareça, e isso inviabilize a votação. O melhor é esperar um pouco, ver como as coisas ficam na próxima semana — afirma um deputado da base.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse ter dúvidas se será possível iniciar a votação hoje. Padilha afirmou ontem que a sessão deve ser aberta, mas reconheceu que o número de deputados pode não ser suficiente para que a votação aconteça.

— Nós acreditamos que deverá haver no painel 342 presentes. Isso nós acreditamos. A dúvida que existe é se teremos na hora da votação os 342. E aí depende muito da oposição. Se a oposição obstruir, não vai acontecer — declarou Padilha.

 

TEMER: PAÍS NOS TRILHOS

Prestes a travar a batalha final no plenário da Câmara, que definirá seu futuro, Temer disse ontem, em evento no Palácio do Planalto, que o objetivo de seu governo é “aprumar os trilhos”.

Cercado por ministros e deputados do chamado baixo clero, o presidente anunciou a criação de 11 novos cursos de medicina pelo país, num total de 710 novas vagas. No Rio, serão 55 novas vagas, em Angra dos Reis.

— O que quero neste momento é dizer que este gesto agora da educação e da saúde fazem aquilo que é também um mote do nosso governo: recolocar o Brasil nos trilhos para que, com trilhos aprumados, quem chegar em 2019 possa dirigir a locomotiva sem nenhum acidente nessa ferrovia — disse Temer.

A despeito do discurso público de que a responsabilidade de dar quorum à votação é da oposição, o objetivo do Planalto é derrubar a denúncia o quanto antes.

Vice-líder do governo, o deputado Beto Mansur (PRB-SP) prometia ontem uma mobilização intensa até a votação para garantir quorum. A meta era telefonar a pelo menos cem deputados da base para estimular a presença deles hoje. Mansur admite que haverá algumas defecções e que há governistas que estarão presentes, mas que devem votar a favor da denúncia:

— O importante é conseguirmos dar quorum e votar. Mas o voto é de cada um.

Após a oposição decidir que estará unida na votação, parlamentares da base passaram a admitir, reservadamente, que o tema pode não ser encerrado nesta semana.

— A oposição vai jogar no limite e, se o governo não conseguir os votos, fica postergada a votação — diz um líder de partido governista. (Colaboraram Eduardo Barretto e Cristiane Jungblut)

O globo, n. 30676, 02/08/2017. PAÍS, p. 4