Para analistas, mudar meta não afeta credibilidade de Meirelles

ANA PAULA RIBEIRO

 CHICO PRADO

JOÃO SORIMA

02/08/2017

 

 

Ministro é o fiador da política econômica de Temer

 A possibilidade de revisão da meta fiscal, admitida pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, já era esperada pelo mercado financeiro, que não deve reagir mal à decisão, porque os analistas acreditam que a equipe econômica continuará trabalhando para fazer o ajuste fiscal. Na opinião dos economistas, Meirelles manterá sua força no governo e sua credibilidade junto ao mercado, apesar da situação fiscal crítica do país. Para eles, o presidente Michel Temer sabe que o ministro da Fazenda é o fiador de sua política econômica.

Bernard Gonin, analista e gestor da Rio Gestão de Recursos, lembra que uma alteração da meta fiscal já era prevista, uma vez que a equipe econômica realizou os cortes possíveis de despesas e houve uma frustração de receitas, em especial as extraordinárias, o que torna difícil atingir o déficit primário (despesas acima das receitas, sem contabilizar os gastos com juros) de R$ 139 bilhões. Para ele, essa estratégia é a correta, uma vez que o mais importante é aprovar medidas que tenham efeito no médio e longo prazo.

— Acho que a estratégia é correta, de piorar um pouco a meta fiscal desse ano, mas melhorar a situação dos estados e, em contrapartida, aprovar a idade mínima para aposentadoria. Se conseguir, há uma piora da situação de imediato, mas uma melhora no longo prazo e na perspectiva de solvência da dívida — disse.

Embora a Reforma da Previdência tenha chances reduzidas de ser aprovada após a piora do cenário político, a avaliação dos analistas é que é possível se ter ao menos uma idade mínima. O termômetro para esse otimismo será a votação da denúncia contra Temer na Câmara dos Deputados, prevista para ocorrer hoje. Se a margem de votos favoráveis ao presidente for boa, cresce a possibilidade de aprovação pelo menos desse pilar da reforma que mexe com as regras da aposentadoria.

Essa reforma parcial não é dependente da meta fiscal, que foi fixada no início do ano e é dependente de receitas extraordinárias que não se materializaram. Para Jankiel Santos, economista-chefe do banco Haitong no Brasil, a hipótese de se elevar o rombo não coloca em xeque a credibilidade do ministro.

— O aumento da meta é um procedimento que já vimos no passado, mas o que ocorre hoje é muito diferente. Temos uma sinalização de controle dos gastos que não ocorria anteriormente. Essa é a diferença que o mercado vê. A revisão da meta não é porque se está gastando muito, mas porque há uma estrutura que precisa ser alterada, e as reformas não são aprovadas de forma rápida — avaliou.

 

CAPACIDADE DE NEGOCIAÇÃO

O economista Sílvio Campos Neto, da consultoria Tendências, não acredita no enfraquecimento de Meirelles. Ele afirma que o ministro tem a seu favor uma capacidade de negociação política mais eficiente do que os seus antecessores:

— Ele tem conseguido entregar conquistas importantes, na medida do possível, considerando os efeitos da crise política. Conseguiu aprovar o teto de gastos por 20 anos, renováveis por mais dez, e a reforma trabalhista. A reforma da Previdência estava encaminhada, mas a crise atrapalhou. O ministro tem também um tino político para negociar que ajuda.

Na avaliação de Julio Hegedus Neto, economista-chefe da consultoria Lopes e Filho, caso ocorra uma mudança na meta fiscal, a alteração será fruto da conjuntura econômica, e não por falta de esforço da equipe.

— A economia não está respondendo como esperado. O ajuste no Brasil é sempre feito pelo lado da receita. Cortar despesa é sempre mais complicado. O espaço de manobra é menor — disse.

Um aumento da meta fiscal tem influência apenas a curto prazo, diz Luiz Roberto Monteiro, operador da Renascença Corretora. Mas, em sua opinião, a votação amanhã, na Câmara, vai mostrar a força do governo e pode viabilizar a reforma da Previdência.

Já o presidente da consultoria Inter.B, Claudio Frischtak, avalia que a mudança na meta é uma sinalização muito ruim, dado que o país está num cenário de “emergência fiscal”. Para ele, o governo deveria criar um plano com todas as medidas possíveis para manter o déficit previsto.

— Mudar a meta deveria ser a última medida. Algumas ações poderiam ser simbólicas, como os ministros deixarem de usar jatos da FAB em seus deslocamentos. Outras têm mais efetividade, como o aumento da contribuição previdenciária dos servidores e o adiamento do reajuste dos salários do funcionalismo público — disse Frischtak.

O globo, n.30676 , 02/08/2017. ECONOMIA, p. 18