PF conclui que áudio de Temer não foi editado

Fabio Serapião e Beatriz Bulla

24/06/2017

 

 

Segundo peritos, laudo aponta que conversa gravada entre o presidente e Joesley Batista no Palácio do Jaburu tem mais de 100 interrupções, mas não sofreu nenhum tipo de adulteração

 

 

A Polícia Federal concluiu que o áudio da conversa gravada pelo empresário Joesley Batista com o presidente Michel Temer, no dia 7 de março, no Palácio do Jaburu, não foi editado ou adulterado. O Estado apurou que o laudo sobre a gravação aponta para mais de cem interrupções, mas que nenhuma delas foi causada por agente externo ou realizada posteriormente à gravação.

De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, a perícia realizada no Instituto Nacional de Criminalística relaciona as interrupções ao gravador usado pelo empresário do Grupo J&F, do qual faz parte a JBS.

Um perito afirmou ao Estado que o modelo do aparelho de gravação usado efetua os cortes em momentos em que há silêncio. A ação espontânea do gravador tem como finalidade economizar bateria e espaço na memória do aparelho, mas não tem condições de alterar o áudio.

Ainda segundo fontes ouvidas pela reportagem, o software usado pelos peritos tem a capacidade de separar todos os sons captados pelo gravador e separá- los por faixas. A partir dessa técnica, disse um perito, foi possível até melhorar a qualidade de alguns trechos inaudíveis.

O áudio da conversa de Joesley com Temer deu início à negociação de delação premiada dos acionistas e executivos da JBS. Após a revelação da gravação, o presidente disse que o áudio havia sido adulterado. “Essa gravação clandestina foi manipulada e adulterada com objetivos nitidamente subterrâneos e incluída no inquérito sem a devida e adequada averiguação”, disse Temer, em pronunciamento dois dias após o áudio ser tornado público pelo Supremo Tribunal Federal.

A defesa do presidente contratou um perito para analisar o material, que afirmou que a gravação era “imprestável”.

Após pedido da defesa do peemedebista ao STF e também do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o áudio foi encaminhado à Polícia Federal para a realização de perícia. A PGR não havia periciado o áudio antes de pedir a abertura de inquérito contra o presidente.

A expectativa agora é de que a perícia seja incluída na denúncia que será oferecida por Janot contra Temer na semana que vem.

Anteontem, o criminalista Antônio Claudio Mariz de Oliveira, responsável pela defesa de Temer, afirmou, em São Paulo, que seria difícil pedir a anulação do acordo de colaboração premiada de Joesley caso a perícia não mostrasse adulteração na gravação da conversa do empresário com Temer. “Aí preocupará”, disse Mariz, quando questionado sobre a possibilidade de o laudo da Polícia Federal não mostrar adulteração.

Peça-chave. A perícia no áudio gravado por Joesley era aguardada por procuradores para a apresentação da acusação formal contra Temer. O presidente é investigado pelos crimes de corrupção passiva, obstrução da Justiça e organização criminosa.

Uma parte da conversa questionada pela defesa de Temer é considerada crucial para imputar ao peemedebista a acusação de obstrução da Justiça.

Na conversa, Joesley indicou realizar pagamentos ao deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e ao corretor Lúcio Funaro para evitar que os dois assinassem um acordo de colaboração com a Lava Jato.

Joesley disse que “zerou” as “pendências” que possuía com Cunha e passou a manter um bom relacionamento com o deputado cassado. Temer respondeu: “Tem que manter isso, viu?”, ao que Joesley diz: “Todo mês”. Por causa da má qualidade do áudio, a perícia é peça importante para confirmar que não houve edição neste trecho da conversa.

 

- Planalto

O Palácio do Planalto afirmou que não vai comentar a conclusão do laudo da PF. O presidente Michel Temer chega hoje ao País e vai tratar do tema.

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Premiê da Noruega critica corrupção diante de presidente

Jamil Chade

24/06/2017

 

 

Primeira-ministra causa constrangimento ao citar Lava Jato e cobrar ‘limpeza’; governo vê gesto ‘deselegante’

 

 

A primeira-ministra da Noruega, Erna Solberg, causou constrangimento ontem à delegação brasileira ao criticar a corrupção no Brasil e pedir uma “limpeza”. O comentário foi feito durante uma coletiva de imprensa ao lado do presidente Michel Temer, que não estava com um fone de ouvido para escutar a tradução e só soube da fala depois do encontro. Ao tomar a palavra, Temer se confundiu e, ao citar seus compromissos, indicou que estaria com o “Parlamento brasileiro” e com o “rei da Suécia”.

“Estamos preocupados com a Lava Jato e é preciso fazer uma limpeza e encontrar uma boa solução”, disse a chefe do governo norueguês, que apontou que o Brasil vive período de “desafios” e “turbulência”.

O comentário inesperado foi recebido com irritação pelo governo e interpretado como um gesto “deselegante”. O argumento era de que, apesar de chefiar um dos países menos corruptos do mundo, Erna não citou que o Ministério Público de Oslo investiga empresas locais suspeitas de ter feito pagamentos de propina para ex-diretores da Petrobrás, entre eles Jorge Zelada. Além disso, a suspeita é de que ela estaria usando o ataque ao Brasil para ganhar apoio popular diante de eleições gerais em poucos meses.

Membros do governo garantiram que, dentro da sala de reuniões, a primeira-ministra não tocou no assunto da corrupção ao se reunir com o presidente.

“É o pensamento dela. Nós respeitamos”, disse o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy. Mesmo sem saber do contexto da declaração de Erna, Temer insistiu no tom de normalidade que também tentou transmitir durante a viagem à Rússia.

“As instituições funcionam com regularidade extraordinária e liberdade extraordinária”, disse o presidente.

“A democracia é algo plantado formalmente pela Constituição e é praticada na realidade”, afirmou o presidente. “Não é sem razão que as medidas tomadas são amparadas pela Constituição, prestigiadas e incentivadas pelo governo.” Nos últimos dias, Temer não fez declarações à imprensa das eventuais denúncias contra ele, evitando questões sobre a agenda doméstica do País. Preferiu, em todos os encontros com os jornalistas, destacar o “sucesso” da viagem. No pronunciamento do presidente e da primeira- ministra norueguesa não foram permitidas perguntas.

Gafe. Visivelmente cansado, Temer se confundiu diante da chefe do governo norueguês e da imprensa local ao citar seus compromissos, indicando que estaria com o “Parlamento brasileiro” e com o “rei da Suécia”. A agenda estabelecia um encontro com o Parlamento e o monarca norueguês Harald V.

Após cinco dias fora do País, Temer chega hoje ao Brasil.

 

- Críticas

“Estamos preocupados com a Lava Jato e é preciso fazer uma limpeza e encontrar uma boa solução.”

Erna Solberg

PRIMEIRA-MINISTRA DA NORUEGA

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45175, 24/06/2017. Política, p. A4.