'Gravíssimo', diz FHC sobre denúncia

Adriana Ferraz

24/06/2017

 

 

Para ex-presidente, se Janot apresentar acusação formal contra Temer, País enfrentará situação ‘inédita’; tucano defende antecipar eleições

 

 

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse ontem que o País caminha para uma situação inédita e “gravíssima”: a de ter um presidente da República denunciado por corrupção. Presidente de honra de um partido que é hoje um dos pilares de sustentação do governo Michel Temer, ele defendeu também a antecipação da eleição para fevereiro ou março do próximo ano, para o presidente “ter legitimidade”.

“O procurador-geral da República (Rodrigo Janot), baseado em uma investigação da Polícia Federal, que é submetida à Presidência, se dispõe a mover uma ação contra o presidente. E por corrupção. Isso nunca houve”, disse o tucano durante palestra para empresários na manhã de ontem em São Paulo. “Se por um lado isso é sinal de que as instituições estão independentes, por outro lado, é gravíssimo.”

Ao falar sobre a chance de o presidente ser denunciado por Janot, Fernando Henrique lembrou os últimos dias de Getúlio Vargas. “Quando Getúlio era presidente, em um tempo em que os militares estavam muito assanhados, existia a chamada ‘República do Galeão’, formada pelo pessoal da Aeronáutica que fazia inquéritos militares.

Um dia, chamaram o irmão do Getúlio, Benjamin Vargas. Pouco depois, Getúlio se matou porque descobriu que o irmão estava metido em confusões com o chefe de sua guarda pessoal. Era grave”, disse.

Em seguida, o ex-presidente acrescentou: “Não estou dizendo que o Temer se mate, claro, prefiro outra coisa”. A “outra coisa”, para Fernando Henrique, seria a antecipação das eleições por determinação de Temer.

“Ele podia chamar as forças políticas e antecipar a eleição para daqui a oito, nove meses. Para ter legitimidade.” O tucano, mais uma vez, se posicionou contra eventuais diretas já e citou o teórico marxista italiano Antonio Gramsci, que disse haver situações na política nas quais o “velho já morreu, mas o novo não nasceu”, referindo-se à ausência de lideranças no cenário atual.

Eleições de 2018. O ex-presidente disse também que não é impossível o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ser derrotado nas urnas, caso concorra às eleições no ano que vem. “Acho difícil Lula recuperar o apoio que perdeu da classe média. Ele não representa mais o sentimento de esperança da época em que me substituiu. Agora os tempos são outros. E se você tira o Lula do PT, cadê o PT? O Lula fica, o PT, não”, disse.

A pesquisa do Ibope mais recente, de abril, mostrou que Lula voltou a ser o presidenciável com maior potencial de votos entre nove nomes testados. Pela primeira vez desde 2015, os eleitores que dizem que votariam nele com certeza (30%) ou que poderiam votar (17%) se equivalem aos que não votariam de jeito nenhum (51%), considerada a margem de erro. Desde o impeachment de Dilma Rousseff, a rejeição a Lula caiu 14 pontos.

De acordo com o tucano, as pessoas não vão votar em partidos em 2018, mas em uma liderança. Nesse contexto, disse que o problema é o “azul”, em uma referência ao candidato a ser escolhido pelo PSDB. Apesar de afirmar que o partido tem várias lideranças, mesmo rachado, o tucano disse que essa escolha tem ser definida logo e que o candidato seja alguém com capacidade de dialogar com o Congresso. Usou como exemplo o atual presidente da França, Emmanuel Macron, e citou o prefeito da capital, João Doria (PSDB).

“Não estou propondo que seja ele (o candidato), não, mas acho que precisamos mudar de geração. Para poder fazer frente a esse mundo novo, precisamos de outra cabeça, outra geração, pessoas que possam se comunicar com os mais jovens e de maneira mais atualizada.” Para o tucano, o lema da política não deve ser mais “liberdade, igualdade e fraternidade”, em referência à Revolução Francesa, mas “liberdade, igualdade e dignidade”. Segundo o tucano, o componente ético passou a ser igualmente importante.

 

- ‘Legitimidade’

“Michel Temer podia chamar as forças políticas e antecipar a eleição para daqui a oito, nove meses. Para ter legitimidade.”

Fernando Henrique Cardoso

EX-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

 

- Delação

FHC disse em maio, logo após a delação da JBS, que Temer deveria renunciar. O tucano afirmou que o País vive atualmente um momento de ‘anomia’.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45175, 24/06/2017. Política, p. A6.