Polícia Federal vê indícios de corrupção de Temer
Andreza Matais, Fabio Serapião e Breno Pires
20/06/2017
A Polícia Federal aponta indícios de crime de corrupção passiva cometido pelo presidente Michel Temer e por seu ex-assessor e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) no inquérito aberto com base na delação do empresário Joesley Batista, do Grupo J&F – controlador da JBS. Relatório parcial da investigação foi encaminhado ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF).
A PF também pediu mais cinco dias de prazo para encerrar a apuração. O inquérito que investiga Temer e Rocha Loures não foi concluído na parte em que são apurados crimes de organização criminosa e obstrução de Justiça. O laudo final da perícia nos áudios gravados por Joesley não foi totalmente finalizado.
O ministro Edson Fachin, relator do caso e da Operação Lava Jato no Supremo, deverá se manifestar hoje sobre a solicitação da PF de mais prazo para o encerramento do inquérito.
A conclusão ligada ao indício de corrupção teve como base o laudo referente a duas conversas gravadas entre o executivo Ricardo Saud, da J&F, e Loures.
Além disso, foi incluída análise do vídeo em que o ex-deputado é flagrado levando uma mala de R$ 500 mil ao deixar um restaurante em São Paulo. Apesar de tentar indicar outra pessoa para receber os valores – ele sugere o nome de “Edgar” –, o então deputado federal acabou combinando de pegar a mala de propinas em uma pizzaria indicada por ele na capital paulista.
O valor, conforme a delação, seria entregue semanalmente pela JBS ao peemedebista, em benefício de Temer, como foi informado, nas gravações, pelo diretor de Relações Institucionais da holding. “Eu já tenho 500 mil. E dessa semana tem mais 500. Então você te um milhão aí.
Isso é toda semana. Vê com ele (Michel Temer)”, disse Saud a Loures em um diálogo gravado.
Rocha Loures é suspeito de exercer influência sobre o preço do gás fornecido pela Petrobrás à termoelétrica EPE – o valor da propina, supostamente “em benefício de Temer”, como relataram executivos da JBS, é correspondente a 5% do lucro que o grupo teria com a manobra.
Perícia. O áudio gravado por Joesley da conversa com Temer no Palácio do Jaburu, no dia 7 de março, possui vários trechos inaudíveis. O empresário e delator sustenta que Temer deu aval para a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e do operador financeiro Lúcio Funaro para que eles não fizessem delação premiada.
Caso Fachin aceite o pedido da PF, o prazo dos delegados se encerrará na no próximo sábado. Depois disso, o inquérito concluso deve seguir para a Procuradoria- geral da República que terá mais cinco dias para decidir se denuncia Temer e Loures ou se arquiva a investigação.
A PF disse que não comentaria o pedido de dilação no prazo. Em outras ocasiões, o Planalto negou qualquer prática ilícita envolvendo Temer.
Processos. Ontem, Temer embarcou para Rússia e Noruega, onde ficará até sexta-feira. Antes de viajar, o presidente ajuizou dois processos contra Joesley. Ele acusa o empresário de agir por “ódio” para prejudicálo e “se salvar dos seus crimes”.
Uma das ações é por danos morais e outra por difamação, calúnia e injúria. Ambas são assinadas pelo advogado do PMDB, Renato Oliveira Ramos.
As petições não estabelecem um valor para a indenização. Caso vença as ações judiciais, Temer pretende doar os valores da indenização a uma instituição da caridade. O presidente também divulgou um vídeo ontem à tarde nas redes sociais no qual disse que “criminosos não ficarão impunes”, como uma forma de resposta às denúncias feitas por Joesley. O empresário, em entrevista à Época, afirmou que o presidente liderava a “maior organização criminosa do País”.
Nas ações protocoladas na Justiça Federal e na comum, que são praticamente idênticas, a defesa do presidente afirmou que Joesley “passou a mentir escancaradamente e a acusar outras pessoas para se salvar dos seus crimes” e o acusa de ser “o criminoso notório de maior sucesso na história brasileira”, uma vez que conseguiu um acordo de delação premiada que o permite ficar em liberdade e morar no exterior.
Sem citar os governos do PT, o documento afirmou que é preciso “rememorar os fatos” de que o Grupo J&F, do qual Joesley é acionista, recebeu o primeiro financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2005, “muito antes” de Temer chegar ao Palácio do Planalto.
Com Temer fora do País, os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, terão a missão de reaglutinar a base aliada no Congresso. / COLABORARAM ISADORA PERON, TÂNIA MONTEIRO e CARLA ARAÚJO
Em vídeo. O presidente Michel Temer afirma que ‘criminosos não ficarão impunes’
Maia
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que assumiu a Presidência da República em exercício com a viagem de Michel Temer, despacha hoje no gabinete presidencial.
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O deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se defendeu ontem das acusações que Joesley Batista, dono da JBS, fez em entrevista à revista Época, do fim de semana passado. Em carta redigida de próprio punho na cadeia em Curitiba, Cunha citou um encontro entre ele, Joesley e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no ano passado, para desmentir o empresário.
Joesley disse ter encontrado Lula em duas ocasiões: uma em 2006 e outra em 2013.
“Ele (Joesley Batista) fala que só se encontrou o ex-presidente Lula por duas vezes em 2006 e em 2013. Mentira! Ele apenas se esqueceu que promoveu um encontro que durou horas no dia 26 de março de 2016, Sábado de Aleluia (anterior à Páscoa) na sua residência, entre mim, ele e Lula, a pedido de Lula, para discutir o processo de impeachment (de Dilma Rousseff)”, disse, em carta. Cunha afirmou que, no encontro, pôde “constatar a relação entre eles e os constantes encontros que mantinham”.
Segundo o ex-presidente da Câmara, sua versão pode ser comprovada com o testemunho dos agentes de segurança da Casa, que o acompanharam, além da locação de veículos em São Paulo, que o teriam levado até lá.
Defesa. Cunha disse ainda que “repudia com veemência as acusações” e desafia Joesley a comprová- las. O empresário disse à revista Época que Cunha respondia ao presidente Michel Temer, que era o chefe do que chamou de “Orcrim”, “organização criminosa da Câmara”. Temer também negou as acusações.
Além disso, o dono da JBS também afirmou que se tornou “refém” de Cunha e do corretor Lúcio Funaro – a quem ele deveria supostamente pagar uma “mesada” para não correr o risco de delatarem.
Além de negar as acusações, Cunha aproveitou para criticar o acordo de colaboração firmado entre Joesley e a Procuradoria- Geral da República (PRG), a que ele chamou de “delação bilionariamente premiada”.
O deputado cassado afirmou que entrou com recurso no STF para a anulação do acordo. “Hoje fica claro que ele mente para obter benefícios pelos seus crimes, ficando livre da cadeia, obtendo uma leniência fiada, mas desfrutando dos seus bilionários bens à vista”, disse.
Beneficiário. O peemedebista encerrou a carta enumerando os supostos benefícios da JBS com o governo, citando especificamente a Medida Provisória (MP) do Refis e da Leniência com o Banco Central.
O Estado de São Paulo, n. 45171, 20/06/2017. Política, p. A4