Título: Reforma em dois atos
Autor: Lyra, Paulo de Tarso ; Jeronimo, Josie
Fonte: Correio Braziliense, 04/02/2012, Política, p. 2

Depois de trocar os titulares de três ministérios, Dilma mira substituições no segundo escalão, com mudanças nos setores financeiro e energético

A troca em três ministérios foi apenas o início da reforma "conta-gotas" promovida pela presidente Dilma Rousseff. Fechados os principais problemas no primeiro escalão, a hora agora é de voltar atenções para posições do segundo, além de bancos e estatais. E elas prometem ser bem mais intensas do que as promovidas na Esplanada dos Ministérios. Logo de cara, o Planalto deve trocar o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Evangevaldo Santos, que acusou o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), de cobrar um mensalinho para garantir sua permanência no cargo. Ele deve ser substituído por João Carlos Bona, atual diretor financeiro da autarquia.

Bona chegou à Conab no lugar de Oscar Jucá Neto, irmão do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que saiu do cargo acusado de ter autorizado pessoalmente a quitação de um débito de R$ 8 milhões de uma empresa de armazenagem chamada Renascença. A substituição faz parte do processo de saneamento que está sendo conduzido pelo ministro da Agricultura, Mendes Ribeiro. Ele esteve ontem à tarde no Palácio do Planalto, reunido com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti.

A presidente Dilma prometeu acelerar as trocas no segundo e terceiro escalões do governo federal. No primeiro ano de mandato, o setor ficou meio esquecido pela caneta presidencial. Aliados faziam romaria no Palácio do Planalto com listas de nomes e sugestões de espaços para substituir os apadrinhados políticos. E a presidente não dava sinais de compreensão.

Na verdade, Dilma tinha traçado uma estratégia para as substituições. Só que ela não contemplava os desejos dos partidos em sua totalidade. Guardou os planos para um segundo momento, pois precisava aprovar a Desvinculação de Receitas da União (DRU) no Congresso, a única emenda à Constituição encaminhada ao parlamento ao longo de todo o ano de 2011. Como precisava do apoio qualificado de 308 deputados e 49 senadores, não queria brigar com os políticos. Sem PECs tramitando no Legislativo, ela tem muito mais força para confrontar a base aliada.

Dilma avisou aos parlamentares como serão as regras do jogo daqui por diante. Nem adianta eles chorarem e apresentarem indicados para nomeações nas áreas ligadas à finanças — bancos públicos, Receita, Tesouro, Fazenda e Planejamento; setor elétrico — Eletrobras, Furnas e Eletronorte; setor energético — Petrobras, Empresa de Pesquisa Energética (EPE); e agências reguladoras. Essas vagas serão preenchidas diretamente por Dilma, sob consulta, no máximo, dos ministros das respectivas pastas, como Guido Mantega (Fazenda) e Edison Lobão (Minas e Energia).

Negociação com partidos Os demais cargos poderão ser negociados pelos partidos aliados com a Secretaria de Relações Institucionais. Nesta semana, o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), teve uma longa conversa com a ministra Ideli. Ele está interessado em indicar o substituto de Elias Fernandes Neto, afilhado político exonerado do posto de diretor-geral do Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs). A sinalização não significa vida fácil. Dilma avisou a Henrique que ele tem o direito de sugerir um substituto para Fernandes. Só que o nome apresentado precisa ter, além do apadrinhamento político, conhecimento técnico da área.

Um aliado da presidente Dilma lembrou ao Correio que essas regras valeram também para as mudanças recentes no primeiro escalão. Ela aceitou a sugestão do PP e empossará, segunda-feira, Aguinaldo Ribeiro como ministro das Cidades. Mas ela já tinha turbinado a Caixa, dando ao banco público um papel mais incisivo na condução do Minha Casa, Minha Vida.

No caso do Ministério de Ciência e Tecnologia, a atitude foi diferente. Dilma tem interesse direto na área de inovação, enxerga no setor um caminho para o desenvolvimento do país e a inclusão dos brasileiros na chamada "era do conhecimento". Por isso, fez ouvidos moucos às pressões do PT pela nomeação do deputado Newton Lima (SP). Escolheu Marco Antônio Raupp, ex-presidente da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência (SBPC) e da Agência Espacial Brasileira (AEB).

Tema recorrente A obsessão da presidente Dilma Rousseff pela inovação tecnológica já estava presente no discurso de lançamento da pré-candidatura da petista, em fevereiro de 2010, durante o Congresso do PT. Leitora voraz, ela enxerga na evolução do nível educacional brasileiro o caminho mais eficaz para que o países deixe para trás, em definitivo, o subdesenvolvimento e ingresse no patamar dos país ricos, não apenas no Produto Interno Bruto, mas também no Índice de Desenvolvimento Humano