Petrobrás é teste para leniência da J&F

Alexa Salomão / Ricardo Brandt

14/06/2017

 

 

Em representação ao MPF, grupo pede ajuda para recuperar contrato com estatal

 

 

 

 

O Ministério Público Federal (MPF) recebeu ontem uma representação da defesa da J&F, controladora da JBS, solicitando a aplicação da leniência assinada com a instituição. No acordo, o MPF se compromete a divulgar e a abrir canal de comunicação com órgãos públicos para defender a permanência de contratos firmados antes de a empresa confessar seus delitos.

Segundo o MPF, a defesa da J&F utiliza o acordo na tentativa de reverter a decisão da Petrobrás de cancelar o fornecimento de gás a uma térmica do grupo. Na quinta-feira passada, a estatal anunciou a extinção antecipada do contrato com a usina termelétrica Mário Covas, em Cuiabá, da Âmbar, empresa do grupo J&F. Em comunicado ao mercado, a Petrobrás explicou que adotou a medida “devido à violação de cláusula contratual que trata da legislação anticorrupção”.

Como a leniência é um acordo entre as partes, o MPF não tem competência para obrigar que ele seja seguido por terceiros.

Dentro desse princípio, a assessoria do MPF informou que a representação da J&F será avaliada e que a instituição vai analisar providências dentro do escopo da leniência.

O advogado Fábio Medina Osório, ex-advogado-geral da União, explica que a leniência assinada exclusivamente com o MPF tem sempre esse risco – de não ser seguida por terceiros.

Por isso, existe a defesa de que o instrumento seja acertado com o maior número possível de envolvidos, principalmente com órgãos de representação da União, procedimento que tem sido de difícil implementação.

“A leniência é um acordo que blinda a empresa contra um processo do MPF, mas ela sabe que está assumindo outros riscos”, diz Medina.

Advogados ouvidos pela reportagem argumentam que a J&F teve uma dificuldade adicional para incluir em sua leniência outros órgãos públicos, estatais e agências reguladoras em seu acordo: o fato de seus delatores terem acusado representantes do alto escalão do governo, incluindo o próprio presidente da República.

Na Operação Lava Jato, a partir da Força Tarefa em Curitiba, já foram firmadas dez leniências, e os procuradores se comprometem a fazer gestões com órgãos de governo para evitar restrições de contratos e bloqueios financeiros.

No acordo com a Odebrecht – o maior, em pouco mais de três anos de investigações –, a cláusula 18 estipula que o MPF se compromete a fazer gestões pelo desbloqueio de bens congelados e pelo fim de restrições de contratação impostas com o governo, como a determinada pela Petrobrás. Um dos pontos importantes do acordo, que beneficiam a Odebrecht, é o que prevê que o Ministério Público levasse a leniência à Petrobrás para que fosse considerada a extinção do bloqueio cautelar imposto pela estatal às empresas do grupo. A holding teve R$ 35 bilhões em contratos diretos e por meio de consórcios e associadas.

Procurada, a Petrobrás não se manifestou até o fechamento da edição. A assessoria de imprensa da J&F disse que a empresa não comentaria.

 

Punição. Acordo de leniência da J&F envolve pagamento de R$ 10,3 bilhões de multa

 

PARA LEMBRAR

Acordo foi fechado em maio

O grupo J&F e os procuradores das forças-tarefa das Operações Greenfield, Sépsis e Cui Bono chegaram a um acordo, no dia 30 de maio, para pagamento de R$ 10,3 bilhões a título de multa por atos praticados pelas empresas controladas pela holding e que, atualmente, são objeto de investigações pelo Ministério Público Federal (MPF). O acordo, de acordo com o Ministério Público, inclui os fatos apurados nessas operações. Do total a ser pago, R$ 8 bilhões serão destinados à Funcef (25%), Petros (25%), BNDES (25%), União (12,5%), FGTS (6,25%) e Caixa Econômica Federal (6,25%). O restante da multa, R$ 2,3 bilhões, será pago por meio de projetos sociais, especialmente nas áreas de educação, saúde e prevenção da corrupção.

O prazo de pagamento foi fixado em 25 anos, sendo que, nesse período, os valores serão corrigidos pelo IPCA, o índice oficial de inflação do País.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45165, 14/06/2017. Economia, p. B5.