Líderes veem risco para Temer em denúncia

Julia Lindner e Carla Araújo

26/06/2017

 

 

GOVERNO SOB INVESTIGAÇÃO / Representantes partidários na Câmara dizem que não há certeza de rejeição de acusação

Líderes da base aliada de Michel Temer na Câmara dos Deputados afirmaram ao Estado não ser possível assegurar a rejeição da denúncia que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar até amanhã contra o presidente da República. Mesmo com uma coalizão estimada em cerca de 400 deputados, parlamentares ponderam que o teor da acusação formal e os seus desdobramentos podem influenciar o posicionamento dos congressistas, aumentando o risco de Temer sofrer um revés.

A denúncia é apresentada no Supremo Tribunal Federal e depois encaminhada para a Câmara, onde tramita primeiro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) antes de seguir para o plenário. São necessários os votos de 172 dos 513 deputados para derrubá-la. Se aprovada por no mínimo 2/3 da Casa, retorna ao Supremo. Caso a Corte aceite a acusação, o presidente se afasta do cargo obrigatoriamente por 180 dias.

Para Baleia Rossi (SP), líder do PMDB, partido de Temer e que tem a maior bancada da Casa, com 64 deputados, o governo não pode se descuidar. “No Parlamento nada é automático. Vai ter que trabalhar. Cada líder da base vai ter que trabalhar sua bancada. Vai ter que ter convencimento. Não dá para achar que está tudo resolvido”, disse.

Segundo ele, é preciso “conhecer os elementos da denúncia e formar um convencimento para ajudar os deputados a formarem sua convicção”.

Comissão. Além do PMDB, os principais partidos aliados também não asseguram vida fácil ao governo, em especial na CCJ. DEM e PSDB, por exemplo, rejeitam a hipótese de substituir nomes no colegiado que possam votar contra a denúncia. “Os nomes (do DEM) na CCJ estarão todos preservados, não vou mudar ninguém para atender algum desejo do governo ou algo assim, vão votar com sua consciência”, disse Efraim Filho, do DEM, que tem 29 deputados.

De acordo com o líder do PSDB na Câmara (46 integrantes), Ricardo Tripoli, os tucanos vão “votar de acordo com a sua consciência”. Segundo ele, “de forma alguma” haverá troca de membros em favor do governo. Tripoli também não garante qual será a posição dos tucanos na denúncia: “Vamos reunir a bancada, vamos discutir e vou tentar buscar maior número de consenso para nos manifestarmos em uníssono”.

Outros líderes seguem a mesma linha. “Não vou fazer um exercício de futurologia. Não é possível prever (se haverá manutenção de apoio)”, disse José Rocha, do PR, bancada com 37 deputados. Jovair Arantes, do bloco PTB, PROS, PSL, PRP, que tem 24 deputados, disse que não pode “agir por hipótese”. “Tenho que ver denúncia e analisar. Só tomo decisão com meu time (bancada).” “Não sabemos o que vai acontecer”, completou Marcos Montes, do PSD.

Articulações. O Planalto aposta em uma estratégia jurídica associada à política para derrubar a denúncia na Câmara. Temer passou o final de semana tratando do tema. No sábado, viajou a São Paulo para se encontrar com seu advogado Antonio Mariz.

Ontem ele se reuniu no Palácio da Alvorada com ministros, líderes e aliados no Congresso. De acordo com a lista oficial, participaram da reunião os ministros Henrique Meirelles (Fazenda), Torquato Jardim (Justiça), Eliseu Padilha (Casa Civil), Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo), Moreira Franco (Secretária-Geral da Presidência) e Sergio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional). Estavam presentes também o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e os líderes do governo no Congresso, André Moura (PSC-SE), e na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). Oficialmente, a reunião foi para tratar de votações no Legislativo.

Temer é investigado por corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa. Janot poderá apresentar uma única denúncia ou fatiá-la de acordo com os crimes apurados.

No convencimento de deputados, o Planalto vai argumentar que o procurador-geral da República age de maneira pessoal ao acusar Temer.

Outro é o de que a classe política deve se unir para salvar o presidente porque, caso contrário, toda ela está ameaçada.

Encontro. Michel Temer se reuniu ontem, no Palácio da Alvorada, com líderes e aliados

‘Salto alto’

Líderes partidários dizem que o governo precisa diminuir o “salto alto” na relação com a base. Aliados manifestaram desconforto com a segurança de que há votos garantidos para barrar a denúncia.

“Vai ter que ter convencimento. Não dá para achar que está tudo resolvido”

Baleia Rossi (SP), líder do PMDB na Câmara dos Deputados

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Investigado, Kassab submerge e PSD se divide

Isadora Peron

26/06/2017

 

 

Sob pressão / Ministro mantém apoio a Temer, mas reformas trabalhista e da Previdência não são consenso dentro do partido

Implicado nas delações da Odebrecht e da JBS, o ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações e presidente licenciado do PSD, Gilberto Kassab, submergiu na crise que desestabilizou o presidente Michel Temer e adotou estratégia de sobrevivência política semelhante à usada no processo de impeachment da petista Dilma Rousseff, quando também era ministro: fazer vista grossa para parlamentares do partido que começam a se insurgir contra o governo.

Foi essa mesma atitude que fez com que Kassab fosse o último ministro a desembarcar do governo Dilma. Ele resistiu o quanto pode à pressão das bancadas e só deixou o cargo três dias antes da votação do afastamento da petista no plenário da Câmara.

Agora, também resiste ao movimento de parte de seus correligionários, que contestam as reformas e, nos bastidores, criticam a permanência de Temer no cargo.

O PSD tem hoje a sexta maior bancada da base aliada na Câmara e no Senado. São 37 deputados e cinco senadores. Em ambas as Casas há divisão. Pelo menos dois senadores são contrários à reforma trabalhista – um deles, Otto Alencar (BA), votou contra o projeto na terça- feira passada na Comissão de Assuntos Sociais (CAS).

O senador Lasier Martins (PSD-RS) afirma que ainda não decidiu o seu voto. Ele apresentou cinco emendas ao projeto e é membro da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde a proposta deve ser apreciada nesta semana. Na quintafeira, foi procurado por um ministro do Palácio do Planalto e ouviu dele garantias de que os temas mais polêmicos, como o fim do Imposto Sindical e o trabalho intermitente, serão analisados pelo governo na hora de sancionar a lei.

Cobranças. Kassab também foi cobrado por interlocutores de Temer, que estava fora do País, mas garantiu que o PSD não vai decepcionar na votação. Na Câmara, os deputados do partido demonstram resistência em aceitar a reforma da Previdência.

Antes da crise causada pela delação da JBS, a contabilidade dos votos favoráveis à proposta dentro da bancada chegava a, no máximo, 22. A avaliação agora, porém, é de que há apenas 15 deputados – menos da metade da bancada – dispostos a votar a favor da reforma.

Líder do PSD na Câmara, o deputado Marcos Montes (MG), que já chegou a ventilar o nome do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), como substituto de Temer, afirmou que o governo, por enquanto, pode esperar pelo apoio do partido – até mesmo para aprovar o novo regime da Previdência.

“As reformas precisam avançar. Não é por amor ao presidente, é amor ao País”, disse.

Se a rebeldia do PSD acende uma luz amarela no Planalto no momento em que outros aliados, como o PSDB, ameaçam deixar a base aliada, a postura de Kassab é elogiada pelos integrantes das bancadas. No início do ano, ele também optou por não vetar as candidaturas de Rogério Rosso (PSD-DF) à presidência da Câmara e de José Medeiros (PSD-MT) à do Senado – mesmo tendo declarado preferência pelos nomes do governo, Maia e Eunício Oliveira (PMDB-CE).

Apesar de despachar semanalmente no Planalto, o ministro, que também é alvo de suspeitas na Lava Jato, não costuma defender Temer publicamente.

Procurado, Kassab informou que o PSD não fechará posição sobre as reformas. “O governo, com muita sensibilidade, criará condições para a discussão sobre a importância desses projetos, conquistando os votos pelo convencimento”, disse.

O ministro e presidente licenciado do partido também negou “racha” em bancadas. Sobre inquéritos em tramitação no STF, ele afirmou que o fundamental é o funcionamento das instituições.

Pasta. Kassab, titular da Ciência, Tecnologia e Comunicações, é presidente licenciado do PSD

Indefinição

“O governo, com muita sensibilidade, criará condições para a discussão sobre a importância desses projetos, conquistando os votos pelo convencimento.”

Gilberto Kassab

MINISTRO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E COMUNICAÇÕES E PRESIDENTE LICENCIADO DO PSD

 

O Estado de São Paulo, n. 45177, 26/06/2017. Política, p. A6