Temer pediu 'comissão' de R$ 20 mi, diz Funaro

Fabio Serapião / Luiz Vassallo

21/06/2017

 

 

 

GOVERNO SOB INVESTIGAÇÃO / Em depoimento no inquérito sobre o presidente, corretor afirma que operações na Caixa geraram recursos para as campanhas de 2012 e 2014; peemedebista não comenta relatório

 

 

O corretor Lúcio Bolonha Funaro disse, em depoimento à Polícia Federal, que o presidente Michel Temer fez uma “orientação/pedido” para que uma “comissão” de R$ 20 milhões proveniente de duas operações do Fundo de Investimento do FGTS fosse encaminhada para a sua campanha presidencial de 2014 e, também, para a de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo, em 2012. As operações no FGTS eram relacionadas às empresas LLX e BRVias e são investigadas na Operação Sépsis, na qual Funaro foi preso, em julho de 2016.

O depoimento de Funaro, prestado no dia 14 deste mês, foi anexado ao relatório parcial do inquérito que investiga Temer por suposta prática de corrupção passiva, obstrução de Justiça e organização criminosa, enviado anteontem pela PF ao Supremo Tribunal Federal.

O corretor afirmou que ouviu do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) que havia “conhecimento do presidente Michel Temer a respeito da propina sobre o contrato das plataformas entre a Petrobrás Internacional e o Grupo Odebrecht”.

Em seu relato, o corretor citou ainda repasses para dois aliados de Temer, o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) e o ex-ministro Geddel Vieira Lima.

De acordo com Funaro, Geddel teria recebido cerca de R$ 20 milhões por “operações” na Caixa – o peemedebista foi vice- presidente de Pessoa Jurídica.

Já Moreira Franco teria recebido comissões pela sua atuação à frente da vice-presidência de Fundos de Governo e Loterias, em 2009. “O declarante pagou comissão desta operação a Eduardo Cunha e a Moreira Franco, os pagamentos foram feitos em espécie, não se recordando dos valores neste momento”, disse o corretor à PF.

 

‘Vigor’. O relatório parcial, com 600 páginas, tornado público ontem, afirma que, pelos elementos reunidos na investigação, “são incólumes as evidências” da prática de corrupção passiva por parte de Temer e de seu ex-assessor especial Rodrigo Rocha Loures. O documento indica recebimento “com vigor” de “vantagem indevida”.

A PF solicitou mais prazo para a conclusão do inquérito, que deverá servir de base para a possível denúncia a ser oferecida nos próximos dias pela Procuradoria- Geral da República.

No documento encaminhado ao Supremo, a PF argumenta que o próprio Temer confirmou em discurso público ter indicado seu ex-assessor como interlocutor para o empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, dono da JBS. Loures foi flagrado, em ação controlada da PF, levando uma mala de R$ 500 mil entregue por um executivo da JBS.

No discurso, Temer disse: “Não há crime, meus amigos, em ouvir reclamações e me livrar do interlocutor, indicando outra pessoa para ouvir as suas lamúrias”. Para a PF, a indicação foi confirmada no discurso.

“A premissa básica para o entendimento deste particular reside, justamente, no trecho do diálogo (...) em que, ao ser questionado por Batista sobre o canal de comunicação a ser adotado a partir de então – em substituição a Geddel – o Exmo. Sr.

Presidente da República indicou, nitidamente, “Rodrigo”, ou seja, Rodrigo Rocha Loures”, diz o relatório sobre o áudio gravado por Joesley.

Para confirmar que Geddel era o antigo interlocutor de Temer, a PF ainda usou os depoimentos de Funaro e do diretor Jurídico do Grupo J&F, Francisco de Assis e Silva.

 

‘Juízo jurídico’. Em Moscou, onde cumpre agenda oficial, Temer evitou comentários sobre o relatório parcial da PF que encontrou indícios de corrupção passiva envolvendo seu nome. “Vamos esperar. Isso é juízo jurídico, não é juízo político. E eu não faço juízo jurídico”, disse.

O advogado de Temer, Antônio Claudio Mariz de Oliveira, disse que não iria responder ao relatório. “Um relatório sobre investigações deveria ser apenas um relato das mesmas investigações, e não uma peça acusatória.

Autoridade policial não acusa, investiga.” Procurados, Geddel e Moreira não foram localizados. / COLABORARAM ANDREI NETTO e CARLA ARAÚJO

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Crise brasileira na agenda Russa

Andrei Netto

21/06/2017

 

 

Teatro / Em Moscou, Temer trata de temas domésticos

 

 

Na viagem que deveria marcar o ponto alto de sua agenda diplomática e o estreitamento da relação com o presidente russo, Vladimir Putin, o presidente Michel Temer foi obrigado a apagar um novo incêndio.

Ontem, os acontecimentos em Brasília obrigaram o presidente a procurar a imprensa, em Moscou, para minimizar a derrota no Congresso e garantir que a reforma trabalhista vai sair do papel, mesmo com a rejeição do texto na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado.

O presidente chegou a Moscou por volta das 12h30, horário local, e foi recebido na pista de aterrissagem por representantes do segundo escalão do Ministério das Relações Exteriores russo. Naquele momento, todas as questões da imprensa ainda diziam respeito ao inquérito da Polícia Federal que apontou evidências de corrupção envolvendo Temer e seu exassessor Rodrigo Rocha Loures.

Ao passar por jornalistas ainda na pista do aeroporto de Vnukovo, o presidente gesticulou que se pronunciaria depois.

Temer usou um dos eventos na pauta para falar sobre o papel do Legislativo no governo.

“Cerca de 90% dos ministros que estão me ajudando a governar vieram do Poder Legislativo, são deputados e senadores”, afirmou, citando o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, que estava à mesa ao lado.

“O ministro Sarney Filho me lembra aqui que o nosso regime é presidencialista, mas eu faço um presidencialismo semiparlamentarista, porque nós conseguimos produzir atos muito produtivos para o País exata e precisamente porque temos o apoio do Congresso.” Mais tarde, ao receber a notícia da derrota no Senado, pediu a sua equipe que organizasse nova entrevista, no horário em que já deveria estar no teatro para a apresentação do Balé Bolshoi. A imprensa brasileira foi chamada ao saguão do Hotel Hilton- Carlton e o presidente tentou passar segurança e tranquilizar os mercados.

Só no fim da noite Temer “se livrou” das pressões vindas do Brasil e assistiu ao balé ao lado de Putin. Foi a primeira vez que o líder russo lhe concedeu um encontro bilateral, após preteri-lo em Goa, na Índia, em outubro .

 

Balé. O presidente Michel Temer se encontra com o colega russo Vladimir Putin para assistir ao espetáculo do Bolshoi

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45172, 21/06/2017. Política, p. A4.