PF prende ex-ministro de Dilma e Temer 

Ricardo Araújo, Elizabeth Lopes, Julia Affonso, Luiz Vassallo  e Fabio Serapião

07/06/2017

 

 

Henrique Alves é suspeito de corrupção em obra de estádio e na Caixa; prisão ocorre no dia da retomada do julgamento da chapa no TSE

O ex-ministro e ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) foi preso preventivamente ontem, em Natal, por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo a construção do estádio Arena das Dunas e de fraudes na Caixa Econômica Federal. Alves, que foi titular da pasta do Turismo nos governos Dilma Rousseff e Michel Temer, foi preso no mesmo dia em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) iniciou o julgamento da ação que pede a cassação da chapa reeleita em 2014.

A prisão de um ex-integrante do governo Temer, do grupo de peemedebistas mais próximos ao presidente, foi recebida no Palácio do Planalto como parte do roteiro de uma ação orquestrada contra o governo (mais informações nesta página).

Alves, que pediu demissão do Turismo em junho de 2016 após ser citado em delação premiada, foi alvo da Operação Manus, desdobramento da Lava Jato.

A Justiça expediu contra ele dois mandados de prisão, um a pedido do Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte – que investiga superfaturamento de R$ 77 milhões na construção da Arena das Dunas – e outro a pedido da Procuradoria da República no Distrito Federal, que apura irregularidades cometidas por grupo liderado pelo deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) nas vice-presidências de Fundos e Loterias e Pessoas Jurídicas da Caixa.

A Justiça expediu novo mandado de prisão contra Cunha, que já cumpre detenção preventiva em Curitiba.

‘Troca de favores’. Segundo as investigações, o estádio – que custou cerca de R$ 400 milhões – construído pela Odebrecht e OAS na capital potiguar para a Copa do Mundo de 2014 serviu para pagar “trocas de favores” entre as empreiteiras e os ex-deputados.

As empresas repassaram, entre doações registradas na Justiça Eleitoral e via caixa 2, mais de R$ 10 milhões.

Os inquéritos foram remetidos à primeira instância há pouco mais de um mês, por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin. As investigações foram baseadas em delações premiadas e quebras de sigilos fiscal, bancário e telefônico dos envolvidos.

“As ilicitudes ocorriam não somente na obtenção de recursos para a campanha, mas na utilização de empresas-fantasmas”, afirmou o procurador da República Rodrigo Telles. Ele disse que, com a quebra do sigilo bancário da Pratika Locações, foram identificados saques em espécie de R$ 2 milhões às vésperas do segundo turno de 2014, quando Alves foi candidato a governador do Rio Grande do Norte e foi derrotado por Robinson Faria (PSD).

Conforme Telles, os recursos foram usados na compra de votos. Ainda segundo os investigadores, a partir da quebra dos sigilos foi identificado repasse de R$ 3 milhões da Odebrecht ao ex-deputado via caixa 2. A PF afirmou que Alves usou sua influência política para “atrasar a detecção de irregularidades” nos contratos do estádio.

Alves foi preso de manhã. Ele saiu de seu apartamento na zona leste de Natal sob gritos de “ladrão” e “safado”. Após prestar depoimento, seria encaminhado para cela especial no Quartel do Comando Geral da Polícia Militar. O juiz Francisco Eduardo Guimarães Farias, da 14.ª Vara da Justiça Federal no Rio Grande do Norte, não aceitou o habeas corpus da defesa.

Os pedidos de prisão foram fundamentados para assegurar a continuidade das investigações e impedir a ocultação de provas. Segundo a Procuradoria da República, os envolvidos praticaram os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e, mesmo com as investigações, continuam agindo para ocultar mais de R$ 20 milhões que teriam sido recebidos por Cunha.

Defesas. O advogado de Alves, Marcelo Leal, não comentou. Ticiano Figueiredo, defensor de Cunha, disse não ver “contemporaneidade dos fatos da investigação com decretação da medida cautelar dessa gravidade (prisão)”. A OAS não tem se manifestado. A Odebrecht diz colaborar com a Justiça. / RICARDO ARAÚJO, ESPECIAL PARA O ESTADO, ELIZABETH LOPES, JULIA AFFONSO, LUIZ VASSALLO e FABIO SERAPIÃO

Operação. Henrique Alves foi preso preventivamente na manhã de ontem, em seu apartamento na zona leste de Natal

OPERAÇÃO MANUS

● Polícia Federal prendeu  ontem o ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves

PRESO PREVENTIVAMENTE

Henrique Eduardo Alves

Ex-presidente da Câmara (PMDB-RN) e ex-ministro do Turismo

FOI ALVO DE DOIS MANDADOS DE PRISÃO

Pedido pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Norte

INVESTIGAÇÃO

Fraudes na obra da Arena das Dunas

Henrique Alves

Teria recebido, via caixa 2 de campanha, propinas oriundas de desvios na Arena e ajudado empreiteiras a obterem financiamento do BNDES

CUSTO ESTIMADO DA OBRA

R$ 423 milhões

SOBREPREÇO IDENTIFICADO

R$ 77 milhões

Pedido pela Procuradoria da República no Distrito Federal

INVESTIGAÇÃO

Irregularidades cometidas na Caixa

Henrique Alves

Teria feito movimentações no exterior no período em que teriam ocorrido os desvios do FI-FGTS, fundo administrado pela Caixa

Eduardo Cunha

O deputado cassado (PMDB-RJ), que já está preso, é apontado como líder do esquema na Caixa. Ele também foi alvo da operação

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Palácio do Planalto aponta ação ‘orquestrada’ contra o governo

Carla Araújo, Gustavo Porto e Tânia Monteiro

07/06/2017

 

 

Prisão de ex-ministro aliado de presidente foi recebida como ‘parte do roteiro’ de setores judiciais contra Temer

A prisão do ex-ministro do Turismo Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) foi recebida no Palácio do Planalto como “parte do roteiro” de uma ação judicial orquestrada por setores da Polícia Federal, da Procuradoria- Geral da República e do Supremo Tribunal Federal contra o governo federal.

Segundo auxiliares do presidente Michel Temer, a prisão de um ex-integrante do governo (Alves foi ministro do peemedebista e de Dilma Rousseff) é mais um fator de desgaste. Interlocutores de Temer, logo após a Operação Manus ser deflagrada em Natal, reconheceram que a prisão de um aliado próximo do presidente gera efeitos negativos por ter ocorrido no mesmo dia da retomada do julgamento da chapa Dilma- Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

De acordo com um auxiliar de Temer, mesmo que a operação não tenha como objetivo atingir e ampliar esse desgaste “é o que fica parecendo”.

A Operação Manus também decretou a prisão do deputado cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDBRJ), outro ex-aliado do presidente Temer, que já está preso em Curitiba, por ordem do juiz federal Sérgio Moro. Alves, que também já foi presidente da Câmara dos Deputados, deixou a gestão Temer ao ser envolvido na Operação Lava Jato e na ocasião disse que saía da Esplanada para “não causar constrangimento” ao governo.

Excessos. Ontem, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao comentar a prisão de Alves, disse que há no Brasil excesso de prisões preventivas. “(A prisão é) triste. Acho que o Brasil tem vivido um momento difícil. Acho que tem tido excesso de prisões preventivas”, afirmou o presidente da Câmara. 

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Pai parlamentar e 44 anos de mandatos seguidos na Câmara

Leonardo Pinto

07/06/2017

 

 

PERFIL / Henrique Eduardo Alves, ex-deputado e ex-ministro

Hoje com 68 anos, Henrique Eduardo Alves estreou cedo na política. Aos 21, se elegeu deputado federal pelo MDB (atual PMDB-RN). Desde então, foram 11 mandatos consecutivos. Bom articulador, foi cogitado à vice de José Serra (PSDB-SP), em 2002, mas teve seu nome riscado após denúncia de sua ex-mulher, de conta ilegal no exterior.

Em 2013, suspeitas de contas ilícitas não o impediram de chegar à presidência da Câmara dos Deputados.

Disputou e perdeu o governo do Rio Grande do Norte em 2014. A proximidade com Michel Temer rendeu o convite, em 2015, de Dilma Rousseff ao Ministério do Turismo.

Porém, sua saída da pasta foi um dos símbolos do rompimento do PMDB com o governo do PT, ao entregar uma carta de demissão a Dilma, em março de 2016.

Alves voltou à Esplanada dos Ministérios após o impeachment da Dilma, mas em junho saiu novamente do Ministério do Turismo. Desta vez, por causa da Operação da Lava Jato, após delação do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que afirmou à Procuradoria-Geral da República o repasse de R$ 1,55 milhão ao peemedebista.

Família de políticos. Nascido no Rio, Alves pertence a uma família tradicional potiguar. O avô, Manoel Alves, foi, na década de 1930, prefeito da cidade de Angicos, interior do Rio Grande do Norte – reduto inicial da família que se tornaria a mais influente na política potiguar.

O pai de Henrique, Aluísio Alves, seguiu o mesmo caminho e alçou voos ainda mais altos: foi deputado federal (PMDB), governador do Rio Grande do Norte (1961-1966) e ministro nos governos de José Sarney e Itamar Franco.

 

O Estado de São Paulo, n. 45158, 07/06/2017. Política, p. A9