PGR e advogados se reúnem para fechar delação de Funaro

JAILTON DE CARVALHO

15/08/2017
 
 
 
 
Depoimentos podem comprometer Temer e deputados do PMDB

Operador ligado a Cunha ainda reluta em aceitar pena de dez a doze anos de prisão proposta pelos procuradores da República

Procuradores da República responsáveis pela Operação Lava-Jato devem se reunir hoje com advogados para acertar os detalhes finais do acordo de delação premiada do operador financeiro Lúcio Funaro, apontado como um dos principais cúmplices do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Os investigadores vão responder se aceitam os termos da delação sugeridos pelo operador. As revelações de Funaro podem complicar a situação do presidente Michel Temer e de um expressivo número de parlamentares, sobretudo da bancada do PMDB na Câmara, segundo disse ao GLOBO uma fonte que acompanha a negociação.

Caso a proposta seja aceita, Funaro deve começar a depor imediatamente sobre cada um dos episódios de corrupção que prometeu detalhar. Um dos principais obstáculos à conclusão do acordo tem sido a divergência sobre as penas. Procuradores querem estabelecer um período de dez a doze anos de prisão. Funaro disse que, nessas condições, não aceitaria firmar a delação. Ele acha que, com as revelações que tem a fazer, teria direito a sair da prisão até o fim deste ano, quando completaria um ano e seis meses na cadeia.

 

ARRECADAÇÃO NO PMDB

As revelações do operador podem atingir Temer de forma direta e indireta. Num depoimento à Polícia Federal (PF), em julho, Funaro reforçou parte das acusações do empresário Joesley Batista, dono da JBS, contra o presidente. O operador disse que, de fato, o ex-ministro Geddel Vieira Lima atuava como interlocutor do empresário no governo. A substituição de Geddel pelo ex-assessor Rodrigo Rocha Loures na intermediação dos interesses da JBS teria sido um dos motivos centrais da reunião entre Joesley e Temer no Palácio do Jaburu, no dia 3 de março.

A conversa, gravada pelo dono da JBS, é o ponto de partida da delação do empresário e de mais seis executivos da empresa — os depoimentos citam Temer e outros políticos, como o senador Aécio Neves (PSDBMG). Funaro também deverá falar sobre a intermediação de um repasse de R$ 4 milhões da Odebrecht para o PMDB de São Paulo, a pedido de Temer. Os R$ 4 milhões fariam parte de um total de R$ 10 milhões acertados pelo presidente em um encontro do qual também participaram o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), Marcelo Odebrecht e Cláudio Melo Filho, ex-executivos da empreiteira. A reunião teria acontecido em 2014, durante a pré-campanha.

A expectativa é que Funaro descreva ainda como arrecadava dinheiro para políticos do PMDB no período em que Temer presidia o partido. Para investigadores, as informações do operador reforçariam as ligações de Temer com os ex-deputados Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves, presos e acusados de desvios de dinheiro na Petrobras e na Caixa Econômica Federal, entre outras áreas da administração pública.

Os procuradores decidiram estabelecer penas mais duras para Funaro porque ele só decidiu colaborar numa fase em que as investigações sobre a suposta organização dele e de Cunha, entre outros, estão se encaminhando para o fim. Funaro resolveu falar depois da prisão da irmã, Roberta Funaro, numa ação controlada da Polícia Federal. A ação fazia parte dos desdobramentos da delação de Joesley. Na conversa com Temer no Palácio do Jaburu, o dono da JBS disse que fazia pagamentos regulares a Funaro e a Cunha para que eles não fizessem delação.

Depois de ouvir calado o relato, Temer respondeu: “Tem que manter isso, viu?”. Roberta Funaro foi filmada entrando num táxi para receber R$ 400 mil de Ricardo Saud, um dos operadores da propina da JBS. A prisão foi determinada pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Depois da primeira fase da investigação, Fachin determinou que Roberta responda pelos supostos crimes em prisão domiciliar.

Funaro, que estava preso na carceragem da PF em Brasília, foi transferido na semana passada de volta para o presídio da Papuda. Cunha está preso em Curitiba e também negocia acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República.

As informações prestadas por Funaro em depoimentos já surtiram efeito antes mesmo da conclusão das negociações. Foi a partir de um relato dele à PF que a Justiça decretou a prisão de Geddel. O ex-ministro é suspeito de envolvimento no esquema de desvios no FI-FGTS, fundo da Caixa Econômica Federal. Ele também é investigado por, supostamente, tentar impedir a delação de Funaro. Geddel teria ligado várias vezes para a mulher do operador para sondar se ele iria ou não fazer delação. O ex-ministro está agora em prisão domiciliar, em Salvador.

O globo, n.30689 , 15/08/2017. PAÍS, p. 4