TSE mantém mandato de Temer e direitos de Dilma

10/06/2017

 

 

Após 4 dias de julgamento, votos de Gilmar Mendes e outros 3 ministros formam maioria pela absolvição da chapa presidencial reeleita em 2014; relator votou pela cassação

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) encerrou ontem um julgamento sem precedentes em sua história de 85 anos e absolveu, por 4 votos a 3, a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer da acusação de abuso de poder político e econômico na eleição presidencial de 2014. A decisão livrou o presidente Temer da cassação e manteve os direitos políticos da petista, cassada no ano passado após um processo de impeachment. A maioria da corte eleitoral entendeu não haver elementos suficientes para comprovar que dinheiro desviado da Petrobrás foi usado em benefício da coligação encabeçada por PT e PMDB.

O processo ajuizado pelo PSDB, que se arrastava desde o fim de 2014 – logo após a reeleição da chapa formada pela petista e pelo peemedebista –, foi encerrado após quatro dias de sessões ou cerca de 25 horas e meia. Foi a primeira vez que o TSE julgou um processo desse tipo envolvendo uma chapa presidencial. O resultado representa uma importante vitória de Temer no campo jurídico.

O presidente, contudo, continua acossado por uma investigação criminal e o Planalto já prevê uma batalha no campo político. Para líderes da base aliada no Congresso, a decisão do TSE dá um fôlego, mas não traz tranquilidade. Governistas afirmam que o presidente seguirá ameaçado por possível denúncia que o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, deve apresentar contra ele com base na delação da JBS. A análise pelo Supremo Tribunal Federal de uma acusação formal da Procuradoria-Geral da República precisa de aval de 2/3 da Câmara, ou 342 deputados. O Planalto confia na sua ampla base e no sentimento anti-Lava Jato na Casa.

O julgamento virou palco para ataques ao Ministério Público e às delações premiadas – a maioria do tribunal rejeitou a inclusão de colaborações da Odebrecht e do casal João Santana e Mônica Moura. Autor do voto decisivo contra a cassação, o presidente do TSE, Gilmar Mendes, usou o julgamento para se firmar como o mais contundente crítico dos métodos de investigação da Lava Jato.

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Maioria dos ministros da corte desconsidera delações ao votar

10/06/2017

 

 

Informações obtidas com base em acordo da Odebrecht citavam repasse de propina para campanha de 2014

BRASÍLIA

Para absolver a chapa Dilma- Rousseff-Michel Temer da acusação de abuso de poder econômico e político, a maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral decidiu desconsiderar as informações obtidas com base nas delações da Odebrecht, que citou repasse de propina para a campanha e a compra de partidos para integrar a coligação dos candidatos reeleitos.

O voto de desempate foi do presidente da corte, ministro Gilmar Mendes. Votaram também pela absolvição os ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Admar Gonzaga e Tarcisio Vieira de Carvalho – os dois últimos indicados para o TSE por Temer. Rosa Weber, Luiz Fux e o relator do processo, Herman Benjamin, foram a favor da perda do mandato.

“A cassação de mandatos deveria ocorrer em situações inequívocas”, disse Gilmar ao justificar seu voto. Mais cedo, Benjamin afirmara que havia “forte e suficiente lastro probatório” de uso de caixa 2. Ao ministro-relator, Marcelo Odebrecht relatou ter repassado R$ 150 milhões para a campanha de 2014.

O resultado, já esperado por advogados de Temer, dá fôlego para o presidente, que enfrenta a sua maior crise política desde que veio à tona, há cerca de um mês, a gravação de uma conversa sua com o empresário Joesley Batista, da JBS.

O porta-voz do presidente, Alexandre Parola, afirmou que Temer recebeu o resultado “como um sinal de que as instituições nacionais continuam a garantir o bom funcionamento da democracia brasileira”.

Gustavo Guedes, advogado de Temer, disse que “a defesa sai extremamente satisfeita com o resultado”. “A maratona acabou”, afirmou. Ele, porém, não descarta que o Ministério Público possa recorrer no Supremo Tribunal Federal.

O Estado apurou que Temer acompanhou o julgamento pela TV ao lado de ministros e assessores. No momento do voto de Gilmar, ele apenas sorriu, enquanto seus auxiliares aplaudiram de pé. Temer, mais contido, disse que o voto mostrou que o ministro tinha “coragem cívica”.

“Vamos em frente”, disse aos aliados. José Eduardo Alckmin, advogado do PSDB, disse que eventual recurso depende da direção do partido. Nos bastidores, interlocutores tucanos consideram que a sigla não vai recorrer. O partido, principal aliado do governo, esperava o desfecho da ação proposta pelo próprio PSDB, para definir sobre a adesão ao governo.

Questionamento. Advogado da presidente cassada, Flávio Caetano disse que o resultado do julgamento “reforça que houve golpe no Parlamento” e afirmou que vai usar duas declarações de Gilmar para pedir a anulação do impeachment no STF. “A primeira é a defesa do princípio da soberania do voto popular. E a segunda é que vivemos em um semiparlamentarismo”, alegou.

Tesoureiro da campanha, exministro de Dilma e atual prefeito de Araraquara, Edinho Silva (PT), disse que “foi feita Justiça”.

“Naquilo que me coube como coordenador financeiro da campanha segui estritamente a orientação da presidente Dilma e a legislação eleitoral”, afirmou o petista.

‘Tapetão’. Primeiro a abrir a divergência nos votos, Napoleão Nunes Maia criticou a tentativa de se mudar o resultado eleitoral por meio de ações na Justiça.

“É como tentar resolver o campeonato no tapetão, isso não é democrático. Democrático é respeitar quem ganhou eleições”, afirmou ao citar que a ação foi proposta pela candidatura derrotada em 2014.

A base da argumentação dos ministros que divergiram do relator foi a de que, embora graves, os desvios envolvendo a Petrobrás não tiveram ligação clara com a última campanha presidencial.

Este raciocínio foi explicitado por Admar Gonzaga, para quem os “fatos gravíssimos” revelados pelos delatores da Odebrecht devem ser “analisados na esfera própria”, isto é, na esfera criminal, não eleitoral. / ISADORA PERON, BRENO PIRES, BEATRIZ BULLA, LEONENCIO NOSSA, THIAGO FARIA, EDUARDO RODRIGUES, CARLA ARAÚJO, TÂNIA MONTEIRO e RICARDO GALHARDO

PLACAR

Por 4 votos a 3, Tribunal Superior Eleitoral rejeita cassação da chapa Dilma-Temer; julgamento durou quatro  dias

4 - CONTRA A CASSAÇÃO DA CHAPA

3 - A FAVOR DA CASSAÇÃO DA CHAPA

POR ORDEM DE VOTAÇÃO

Herman Benjamin - A FAVOR

RELATOR, 59 ANOS

Tem origem no Superior Tribunal de Justiça (STJ), indicado por Lula. É titular do TSE desde 2015

“Por intermédio de contas mantidas com empresas contratadas pela Petrobrás, cofres partidários foram engordados desequilibrando a paridade de armas no pleito e configurando abuso de poder econômico”

Napoleão Nunes Maia - CONTRA

MINISTRO, 71 ANOS

Também com origem no STJ (indicação de Lula), é ministro efetivo da corte eleitoral desde 2016

“Essa ação, se julgada procedente, vai empossar candidato perdedor na Presidência? É isso que nós admitimos que possa ser feito? E as safadezas, ficarão impunes? Não, serão apuradas nas vias próprias"

Admar Gonzaga - CONTRA

MINISTRO, 56 ANOS

É da "cota" de juristas da corte eleitoral. Foi nomeado por Temer para o TSE em março deste ano

“Não há prova segura e cabal de que doações tenham decorrido do esquema ilegal de repasse de propinas da Petrobrás ou que recursos repassados por empresas teriam necessariamente origem ilegal"

Tarcisio Vieira de Carvalho - CONTRA

MINISTRO, 45 ANOS

Também da cota de advogados no TSE, foi a segunda nomeação de Temer para a corte eleitoral

“Nenhuma das testemunhas pode informar se os candidatos Dilma e Michel tinham qualquer conhecimento sobre a entrada ilícita de valores em suas campanhas"

Rosa Weber - A FAVOR

MINISTRA, 68 ANOS

Também é ministra do Supremo, indicada por Dilma. Está na corte eleitoral como titular desde 2016

“Tal fartura de dinheiro causou desequilíbrio em favor da coligação vitoriosa. Dinheiro de origem ilícita na campanha. Gravidade extrema. O crime na conquista do poder o deslegitima”

Luiz Fux - A FAVOR

VICE-PRESIDENTE DO TSE, 64 ANOS

Integra também o Supremo, nomeado por Dilma. É titular da corte eleitoral desde agosto de 2014

“Fatos novos vieram a lume informando que na campanha houve abuso de poder político, houve financiamento ilícito de campanha. Aí, no momento de proferir o voto, não vamos considerar tais fatos?”

Gilmar Mendes - CONTRA

PRESIDENTE DO TSE, 61 ANOS

Também integra o STF, indicado por Fernando Henrique Cardoso. É ministro efetivo do TSE desde 2014

“Não se substitui um presidente da República a toda hora, ainda que se queira. A cassação de mandatos deve ocorrer em casos inequívocos. O processo é garantia, não é voluntarismo"

 

O Estado de São Paulo, n. 45161, 10/06/2017. Política, p. A4