Temer nega interferência do Executivo no Judiciário

Andrea Jubé, Luísa Martins e André Guilherme Vieira

13/06/2017

 

 

O presidente Michel Temer advertiu ontem que não admitirá "intromissão" de um poder sobre o outro e se disse vítima de "denúncias artificiais". A manifestação ocorre em meio à crise com o Supremo Tribunal Federal, após acusação de que teria mandado investigar o relator da Lava-Jato na Corte, Luiz Edson Fachin.

O tom da crise baixou ontem, quando, de forma conciliatória, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que havia divulgado uma dura nota no fim de semana em reação ao noticiário sobre a suposta investigação, declarou que o tema "está esgotado". A ministra informou que não adotará qualquer providência em relação às supostas escutas ilegais contra Fachin, que teriam sido encomendadas por Temer, conforme reportagem da revista " Veja".

"O presidente da República garantiu não ter ordenado qualquer medida naquele sentido. Não há o que questionar quanto à palavra do Presidente da Republica", disse a magistrada, em nota oficial.

No vídeo divulgado nas redes sociais do Palácio do Planalto ontem, Temer reforçou a negativa de que teria acionado a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para investigar Fachin, relator não só da Lava-Jato mas também do inquérito em que o presidente é investigado pelos crimes de obstrução à Justiça, organização criminosa e corrupção passiva.

Em fala alusiva ao procurador-geral Rodrigo Janot, Temer afirma que "nas democracias modernas, nenhum poder impõe sua vontade ao outro". Janot deixa o cargo em setembro, quando expira o seu mandato.

"Não interfiro nem permito interferência indevida de um poder sobre o outro, em hipótese alguma nenhuma intromissão foi ou será consentida", enfatiza. O presidente defende-se, afirmando que se tornou vítima de um achaque exatamente no momento em que a economia começou a reagir, diante das reformas promovidas por seu governo.

Temer sobe o tom ao falar em abuso de autoridade. "Na democracia, a arbitrariedade tem nome, chama-se ilegalidade. O caminho que conduz da justiça aos justiceiros é o mesmo caminho trágico que conduz da democracia à ditadura", completa. Ele afirma que o julgamento no TSE mostrou a "vitalidade da democracia, com o funcionamento pleno e livre do Poder Judiciário". Assegura que seu governo tirou do papel reformas necessárias há décadas, e que isso só foi possível por causa do respeito mútuo entre as instituições. "Não esmorecerei, o Brasil não vai parar", avisou.

A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de absolver por quatro votos a três a chapa presidencial vitoriosa em 2014, na sexta-feira, deverá ainda ser examinada pelo Supremo. Ontem, a Rede Sustentabilidade apresentou uma reclamação para anular o julgamento. O partido contesta a falta de exame das provas colhidas em depoimentos prestados pelos executivos da Odebrecht. Outro recurso foi apresentado pela Procuradoria Geral Eleitoral.

Voto vencido no julgamento, o ministro Luiz Fux afirmou em São Paulo que o TSE lançou mão de um artifício para excluir as delações da Odebrecht e do casal de marqueteiros João Santana e Monica Moura da ação de investigação judicial eleitoral rejeitada.

"Eu, particularmente, não consegui me curvar à ideia de que se estava discutindo [no TSE] uma questão de fundo seríssima e se estava utilizando um artifício dizendo 'não, não, isso não estava na ação", disse Fux. Ele afirmou que manterá seu voto também no STF, caso a corte se manifeste.

Fux também comentou a reportagem sobre a suposta investigação contra Fachin. "O governo usar seu aparato para uma suposta perseguição a juízes é um caso notório de ilícito, quando nada uma improbidade, usar os gastos do Estado, os serviços do Estado para perseguir juízes que proferem decisões que não são do agrado do governo", afirmou, em evento empresarial em São Paulo.

Perguntado sobre a possibilidade de o STF ser investigado, Fux respondeu que "quem quiser investigar os ministros do STF pode investigar, desde que dentro da legalidade. Mas é preciso que haja uma razão. E se a razão for o desagrado do governo com relação às decisões judiciais, essa razão se anula pela bastardia da origem", disse.

Em outra frente, Temer oferece hoje um jantar aos 27 governadores no Palácio da Alvorada, que têm demandas represadas, como o alongamento das dívidas com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O governo espera um quórum elevado para mostrar que Temer tem fôlego político para continuar enfrentando a crise.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4275, 13/06/2017. Política, p. A8.