Indicado ao Cade recusa-se a comentar gravação

Raphael Di Cunto

14/06/2017

 

 

Indicado à presidência do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Alexandre Barreto de Souza recusou-se ontem a comentar a gravação em que o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista, dono da JBS, discutem a troca do comando da autarquia - o empresário queria "resolver" problemas de suas empresas em órgãos do governo federal. "Não tenho nenhum tipo de informação que possa ser útil ou que permite emitir qualquer tipo de opinião a esse respeito", disse.

A nomeação de postos-chave no Cade, Comissão de Valores Mobiliário (CVM) e Receita também foi assunto de conversa entre o empresário e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), preso após receber R$ 500 mil para supostamente auxiliar a JBS em uma disputa com a Petrobras no Cade - o processo não foi pautado por depender ainda da nomeação do presidente.

Chefe de gabinete do ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU), que em duas semanas dará parecer sobre a prestação de contas do presidente Michel Temer referentes a 2016, Souza também não quis comentar quem levou seu nome ao governo. Esses assuntos foram questionados todos pela imprensa, após sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, onde o processo de votação começou antes mesmo do escrutínio dos parlamentares.

Não que isso fizesse muita diferença, já que apenas o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) questionou o currículo de Souza. Os demais parlamentares perguntaram sobre posições acerca do valor das multas, processos em andamento e da não punição, ainda na década passada, da JBS pela suposta formação de cartel com frigoríficos. O resto da oposição passou longe da comissão.

Relatado pelo líder do governo, senador Romero Jucá (PMDB-RR), a indicação para um mandato de quatro anos a frente do Cade foi aprovada ontem pela CAE por 16 votos a quatro. A comissão, contudo, tem 27 integrantes titulares e 27 suplentes - a maioria, portanto, sequer apareceu. O nome ainda precisa ser confirmado pelo plenário do Senado.

A sabatina ocorreu junto com outros dois indicados, Gustavo Machado Gonzalez, ex-chefe de gabinete da presidência da CVM e que atuará como diretor da autarquia, e Maurício Maia, auditor do TCU, para conselheiro do Tribunal Administrativo do Cade. Servidores da CVM reclamaram de Gonzalez não ser do quadro funcional da instituição, quebrando a tradição do cargo.

Randolfe Rodrigues centrou suas críticas a possível conflito de interesse entre a escolha do chefe de gabinete de Bruno Dantas e as contas de Temer. Barreto de Souza respondeu que mais de 30 auditores trabalham na análise e que as regras de governança do TCU impedem interferência.

O provável presidente do Cade preferiu não comentar a disputa da JBS com a Petrobras, alvo da delação premiada, dizendo que só conhece o processo pela imprensa. Sobre a estatal, afirmou apenas que o Cade poderá atuar preventivamente para evitar que a venda de ativos no programa de desinvestimento crie monopólios privados, ao ser alertado pelo senador Armando Monteiro (PTB-PE) que a empresa hoje monopoliza, sob os cuidados do governo, diversos setores.

Diante de senadores que criticavam as multas reduzidas do Cade, que não desestimulariam as infrações contra a livre concorrência, Souza defendeu que considera as multas, de 20% do faturamento do ano anterior, "bastante substancial" e que há outras punições previstas, como não participar de licitações ou contratar crédito em instituições públicas. Já Maurício Maia, o outro indicado para o Cade, defendeu projeto do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) que aumenta a multa para todo o período da infração, e não apenas o ano anterior.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4276, 14/06/2017. Política, p. A8.