Salto dos investimentos em energia solar fotovoltaica

Camila Ramos

14/07/2017

 

 

Em um momento em que o país passa por desafios nas esferas econômica, política e social, a energia solar fotovoltaica é um dos poucos setores que mantém um ritmo acelerado de crescimento, com 250% ao ano, gerando oportunidades de negócio para pequenas e grandes empresas.

Foi publicado em maio o primeiro relatório de "Mapeamento da Cadeia de Valor da Energia Solar Fotovoltaica no Brasil". De autoria da Cela (Clean Energy Latin America) e contratado pelo Sebrae, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Organização dos Estados Iberoamericanos (OEI), o estudo analisa oportunidades e desafios do segmento no país, apontando formas de inserção de novos negócios no setor.

O estudo mostra análises inéditas sobre a energia fotovoltaica no Brasil. Estima-se que a energia solar fotovoltaica representará por volta de 32% da matriz elétrica brasileira em 2040. Tal expansão demandará investimentos de aproximadamente R$ 313 bilhões nos próximos 10 anos - R$ 112 bilhões só em geração. Até 2040, estes números atingirão até R$ 685 bilhões. O quanto destes investimentos serão realizados na cadeia nacional dependerá da competitividade local.

Como viabilizar investimentos desta magnitude? O arcabouço regulatório tem contribuído com o estabelecimento da cadeia fotovoltaica no país. Especialmente o Sistema de Compensação de Energia Elétrica para a geração distribuída (GD), e da recorrência dos leilões de energia solar para geração centralizada. Hoje, o Brasil tem mais de 1600 empresas atuantes em energia fotovoltaica. São 8 montadoras de módulos, 400 fabricantes de componentes, além de mais de 1 mil fornecedores de serviços. O país já tem mais de 10 mil instalações fotovoltaicas. Além disso, uma potência de 2,74 GW de usinas solares foram contratadas em leilões.

Financiamento é ao mesmo tempo viabilizador e gargalo. A cadeia fotovoltaica conta com mais de 50 linhas de financiamento. Estas linhas, mapeadas no estudo, atendem geradores de energia, fornecedores de bens e serviços, investidores, consumidores PF e PJ, além de instituições de P&D. Os maiores gargalos do financiamento no setor são exigências de conteúdo local incompatíveis com o estágio atual da cadeia produtiva para linhas com custo competitivo; alto custo das linhas para consumidores finais (acima de 30% ao ano); complexidade no processo de análise de financiamento de projetos e a incompatibilidade das garantias solicitadas com a natureza dos ativos.

Outro fator chave, o que mais tem contribuído para seu desenvolvimento, é a queda de custos da tecnologia. A energia fotovoltaica tem batido recordes de queda no valor de investimento e aumento de eficiência na conversão de energia solar em eletricidade. Entre 2009 e 2016 o custo de produção da energia fotovoltaica caiu mais de 80%, fazendo com que seu custo atingisse a paridade tarifária em 44 distribuidoras ao final de 2016, representando 75% dos consumidores brasileiros de baixa tensão. E a expectativa é que caia mais 60% até 2040. Além disso, aumentos nas tarifas elétricas para o consumidor têm reforçado a competitividade solar.

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No contexto global, o setor fotovoltaico brasileiro ainda é incipiente, porém cada vez mais atrativo. Os principais investidores em usinas fotovoltaicas em construção no Brasil são empresas estrangeiras experientes no mundo que veem a oportunidade no país: Enel, EDF, Engie, Scatec, Actis, Canadian Solar, entre outras. Algumas delas investiram nestes projetos desde sua concepção, mas outras entraram no setor por meio de fusões e aquisições, cada vez mais frequentes. Por sua vez, na GD, a maioria das empresas são pequenos e médios instaladores locais. Não obstante, há uma crescente tendência de concessionárias de distribuição de energia elétrica lançarem braços de GD.

Em termos de competitividade da indústria solar brasileira, os sistemas fotovoltaicos que utilizam módulos montados no Brasil são mais caros, por volta de 20% se comparados aos sistemas fotovoltaicos que utilizam módulos importados. A discrepância se dá pela enorme diferença do preço dos módulos. Segundo o estudo, os módulos montados no Brasil são em torno de 60% mais caros que similares importados. Os motivos desta diferença de custo são impostos não recuperáveis, mão de obra, encargos trabalhistas, frete incremental de importação de componentes em vez do módulo acabado, obrigações de investimento em P&D e margem de lucro do fabricante para remunerar o capital investido na linha de montagem no Brasil.

Outros gargalos produtivos de competitividade da cadeia no Brasil são complexidade e carga tributária, mão de obra, tamanho do mercado, infraestrutura logística, custo de capital em moeda local, volatilidade cambial e risco regulatório.

O Brasil é pouco competitivo em elos da cadeia que precisam de escala internacional, desde o beneficiamento do silício até a produção de células fotovoltaicas e módulos. É aqui que países asiáticos são imbatíveis. Porém, o país é competitivo em produtos que já são produzidos por aqui e são destinados a outras indústrias, como molduras, estruturas metálicas e componentes elétricos que, ao mesmo tempo, têm acesso a financiamento com custos diferenciados por possuírem conteúdo local.

Para reverter este cenário de fragilidade de competitividade, é preciso que o país fomente uma demanda doméstica relevante e recorrente para justificar o investimento, inclusive incentivos à tributação e simplificação do sistema tributário.

De qualquer maneira, o avanço da tecnologia fotovoltaica no longo prazo é irreversível, no Brasil e no mundo, por ser tecnologia disruptiva (eficiência, empoderamento do consumidor, possibilidades de aplicações), redução de custos, pegada de carbono, entre outros. A questão é quão rápido, quanto e como o país quer ser inserido no mapa mundial da energia fotovoltaica.

1. O relatório é gratuito e de livre acesso ao público, e pode ser acessado na íntegra nos endereços www.celacleanenergy.com e www.sebrae.com.br.

 

Camila Ramos é diretora-geral da Cela - Clean Energy Latin America, mestre em economia pela London School of Economics e membro do Conselho de Administração da Absolar (info@celaexperts.com).

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4276, 14/06/2017. Opinião, p. A10.