Suíça viu transação atípica em contas atribuídas ao PT

Jamil Chade

02/06/2017

 

 

Lava Jato. Banco do país europeu fechou conta antes da delação de Joesley, que disse ter repassado recursos para as campanhas de Lula e Dilma; PGR aguarda por informações

 

 

Antes mesmo de vir à tona o conteúdo das delações de Joesley Batista na Operação Lava Jato, um banco suíço usado para movimentar recursos ilícitos para abastecer campanhas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente cassada Dilma Rousseff, conforme relato do empresário, denunciou suas contas para autoridades do país europeu. O volume de dinheiro e os padrões de transferências sem justificativa levantaram a suspeita de crimes financeiros, embora a instituição desconheça os beneficiários das movimentações.

As informações coletadas pelas autoridades da Suíça serão agora encaminhadas para a Procuradoria- Geral da República brasileira. Na avaliação de autoridades suíças próximas ao caso, o Ministério Público Federal terá “forte chance” de apurar mais detalhes sobre as transferências.

O banco Julius Baer fechou as contas na Suíça e o dinheiro foi transferido para Nova York, onde hoje vivem Joesley e sua família.

Em sua delação premiada, o empresário afirmou à PGR que reservou duas contas para atender às demandas dos petistas. Segundo ele, o dinheiro era usado para pagar propina a políticos do PT e também a aliados. Joesley contou que as contas chegaram ao saldo de US$ 150 milhões em 2014. O empresário disse também que o dinheiro era operado a mando do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, com o conhecimento de Lula e Dilma.

Os petistas negam as acusações.

Mesmo sem o nome dos envolvidos nos extratos, uma vez que operadores e doleiros teriam efetuado as transações, autoridades suíças dizem acreditar que as datas das transferências podem indicar se o dinheiro foi movimentado com maior intensidade nos meses que antecederam eleições no Brasil.

As contas foram alimentadas, segundo autoridades suíças que acompanham o caso, com recursos lícitos dos negócios da JBS e também por dinheiro irregular, em um esquema descrito como “misto”. No entanto, enquanto as contas foram mantidas no país europeu, a movimentação de volumes no Brasil não era de conhecimento nem das autoridades nem do banco.

A dinâmica é considerada surpreendente porque companhias suspeitas de crimes financeiros separam as contas “legítimas” das “ocultas”.

 

Encerramento. Fontes do sistema financeiro da Suíça revelaram ao Estado que as contas foram fechadas após o Julius Baer informar aos administradores do dinheiro que não manteria os recursos na instituição. Grande parte do dinheiro foi então transferida para os Estados Unidos.

Da conta 06384985 no Julius Baer, o dinheiro seguiu para o JP Morgan Chase Bank, em Nova York. Para ocultar os proprietários da conta, os recursos estavam em nome da empresa de fachada Lunsville Internacional Inc. Uma segunda empresa, a Valdarco, também foi usada.

Apesar do encerramento das contas, o Julius Baer informou as suspeitas às autoridades de combate à lavagem de dinheiro da Suíça. Joesley não foi comunicado da decisão do banco em razão da legislação local.

Procurado pela reportagem, o Ministério Público Federal em Berna se recusou a comentar o caso, indicando que não revelaria se Joesley está ou não sob investigação em função da legislação local.

As contas. Joesley contou que a primeira das contas foi usada durante os anos do governo Lula e que, ao final do mandato, em 2010, teria ficado com um saldo de US$ 70 milhões. Quando começou a gestão Dilma, ele disse que fora instruído por Mantega a abrir uma nova conta.

As contas deixaram de ser abastecidas, segundo Joesley, em novembro de 2014, quando ele afirmou ter comunicado a presidente cassada em reunião no Palácio do Planalto. O último saldo foi de R$ 30 milhões.

 

Delator. O empresário Joesley Batista, dono da JBS, durante entrevista coletiva sobre negócios do grupo em 2011

 

 

PARA LEMBRAR

1. Contas correntes

O termo de colaboração do empresário Joesley Batista, dono da JBS, cita o fluxo de duas “contas-correntes” de propina no exterior, cujos beneficiários seriam os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

 

2. Valores

Joesley disse que as contas alcançaram saldo de US$ 150 mi em 2014 e que o ex-ministro Guido Mantega operava o fluxo. Ele nega. O dinheiro financiaria campanhas.

 

3. Suíça

Segundo procuradores próximos ao caso, a conta estava em nome de empresas offshores em banco na Suíça. O uso de offshores caracteriza, para os investigadores, tentativa de camuflagem dos reais beneficiários da conta.

 

4. Defesas

Para Lula, a delação de Joesley Batista se baseia em “diálogos com terceiros, que não foram comprovados”. Dilma afirmou que “jamais teve contas no exterior”.

______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

‘Detalhe do que está por vir’, diz petista sobre Mantega

Vera Rosa / Ricardo Galhardo

02/06/2017

 

 

Valter Pomar afirma em mensagem de WhatsApp que conta não declarada de ex-ministro na Suíça é fato ‘muito grave’

 

 

Em mensagem de WhatsApp enviada a dirigentes do PT no início desta semana, o coordenador da tendência Articulação de Esquerda do partido, Valter Pomar, disse considerar “muito grave” a informação de que o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega possuía uma conta não declarada à Receita Federal, na Suíça, e previu novos problemas para o partido.

“(...) Minha impressão é que isto é um detalhe perto do que está por vir nos próximos dias.

Motivo pelo qual – sem prejuízo de tudo o que eu escrevi antes – temos que manter a calma e segurar mais esta onda”, afirmou Pomar no texto.

Na mensagem, o dirigente petista afirmou que Mantega deveria ter percebido “há bastante tempo” que a existência da conta na Suíça seria usada contra todo o PT. “O Guido foi ministro da Fazenda.

Dele se esperaria um comportamento tributário exemplar.

Guardadas as devidas proporções, seria como descobrirmos um ministro do Trabalho que publicamente defende a PEC das Domésticas, mas que na sua própria casa não registra!!!”, disse.

As comparações não pararam por aí. “Ou um ministro de Direitos Humanos que faz belos discursos, mas no cotidiano é machista, racista e homofóbico.

Ou um ministro do Desenvolvimento Agrário que é dono de terras griladas”, completou.

Na segunda-feira passada, Mantega disse, em petição enviada ao juiz Sérgio Moro, que o saldo de US$ 600 mil existente na conta era proveniente da venda de um imóvel herdado do pai. O dinheiro teria sido recebido ainda em 2006, antes de ele assumir a Fazenda.

Ao observar que Mantega deveria ter legalizado a situação, pagando o que devia, Pomar concluiu a mensagem com um tom pessimista sobre o que estava por vir contra o PT e recomendou “calma” aos dirigentes.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45153, 02/06/2017. Política, p. A4.