Restrição ao foro tem no STF 4 votos favoráveis

 Isadora Peron / Breno Pires

02/06/2017

 

 

Julgamento no Supremo foi suspenso após pedido de vista; ministros antecipam voto

 

 

Mesmo após o pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, três ministros do Supremo Tribunal Federal anteciparam seus votos e acompanhar o entendimento do relator do processo, Luís Roberto Barroso, no julgamento sobre a restrição do alcance do foro privilegiado.

Marco Aurélio Mello, Rosa Weber e a presidente da Corte, Cármen Lúcia, se manifestaram favoráveis à tese de que políticos só terão direito à prerrogativa se o crime de que forem acusados tiver sido cometido no exercício do mandato e relação com o cargo que ocupam.

O julgamento foi suspenso com o placar de 4 a 0 e será retomado quando Moraes devolver o caso para o plenário. Não há prazo para isso ocorrer.

Normalmente, quando um ministro pede mais tempo para analisar um caso, o julgamento costuma ser suspenso na hora, sem que os outros se manifestem. O tema polêmico, no entanto, fez com que os ministros que já tinham opinião formada demonstrassem apoio a Barroso, que foi bastante criticado durante o julgamento. O principal argumento do relator é que a prerrogativa de foro tem sido usada como instrumento para garantir que políticos sejam julgados no Supremo.

Segundo ele, se a instância em que alguém fosse julgado “não fizesse diferença”, os político não se empenhariam tanto em manter o foro. O ministro afirmou que a corrupção no Brasil é tão sistêmica, que essa atitude se tornou algo “multipartidário”. “O que nós estamos vendo é que, se não fizesse diferença, se não assegurasse ou impunidade ou pelo menos menor celeridade, não haveria essa disputa por ficar em cargos que têm foro no Supremo”, disse o relator.

“Acho que não há argumento capaz de desfazer a realidade óbvia de que, por lei, medida provisória ou nomeações, se quer assegurar o foro no Supremo, e há de haver alguma razão para isso”, declarou Barroso.

Recentemente, se levantou suspeita sobre indicações que teriam esse objetivo. Foi o caso da nomeação de Moreira Franco para a Secretaria-Geral da Presidência da República por Michel Temer. No ano passado, houve polêmica semelhante com a tentativa da então presidente Dilma Rousseff de indicar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil.

 

Editoriais. Ao pedir vista do processo, Moraes citou editoriais do Estado e de outros dois jornais do País durante o julgamento do mensalão, em 2012, para rebater a ideia de que a existência de foro no Supremo acaba gerando impunidade.

No dia 14 de novembro daquele ano, o Estado afirmou que “ao fixar anteontem os termos dos seus merecidos castigos por corrupção ativa e formação de quadrilha a Corte Suprema brasileira fez história, não apenas quebrando o paradigma da impunidade dos poderosos, mas dissipando qualquer dúvida sobre a capacidade técnica e integridade moral do colegiado para levar a cabo uma ação penal sem precedentes por sua complexidade, ramificações, número e calibre da grande maioria dos acusados”.

Ao fim do julgamento, Barroso disse que Moraes sinalizou que não iria demorar em seu pedido de vista e que o caso seria em breve trazido novamente ao plenário. “Há uma demanda social por uma solução desse problema.

Espero que a gente em breve retome o julgamento.” Gilmar Mendes e Dias Toffoli, porém, refutaram a ideia. Segundo eles, o STF já mostrou ser eficiente para julgar questões criminais. Toffoli afirmou que, dos 148 inquéritos que recebeu desde 2009, apenas 41 ainda não foram julgados.

Em seu pedido de vista, Moraes também disse que não era possível estabelecer conexão entre impunidade no Brasil e a ampliação do foro pela Constituição de 1988. “A afirmação de que o foro no STF acaba gerando impunidade não só não tem respaldo estatístico, como acaba por ofender e desonrar a própria história do Supremo”.

Um dos seus argumentos ao pedir mais tempo para analisar o caso foi o de que a mudança proposta por Barroso não se tratava “meramente de uma norma processual, mas de um complexo de garantias que têm reflexos importantíssimos”. “A alteração de uma é mais ou menos como aquele jogo de varetas. Ao mexer uma vareta, você mexe as demais”, disse. “Não há uma instância mais eficaz que a outra, o que há é um Poder Judiciário querendo colaborar no combate à corrupção no País.”

 

PEC. Anteontem, após o STF iniciar a discussão do caso, o plenário do Senado aprovou em segundo turno uma emenda constitucional que põe fim ao foro privilegiado e mantém a prerrogativa apenas para os chefes dos Poderes – presidente e vicepresidente da República, presidentes da Câmara, do Senado e do STF. O texto, que manteve a imunidade parlamentar no caso de prisões, agora terá de ser apreciado na Câmara.

Ontem, ao contrário do que haviam afirmado líderes partidários, deputados defenderam agilidade à tramitação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que será submetida, inicialmente, à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Esse é um tema que precisa ser debatido”, disse o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG). / COLABOROU DAIENE CARDOSO

 

‘Desonra’

“A afirmação de que o foro no STF acaba gerando impunidade não só não tem respaldo estatístico, como acaba por ofender e desonrar a própria história do Supremo.”

Alexandre de Moraes

MINISTRO DO SUPREMO

 

DISCUSSÃO

● Supremo Tribunal Federal analisa a restrição do alcance do foro privilegiado; ministro Alexandre de Moraes pediu mais tempo para avaliar o caso e julgamento foi suspenso

 

A proposta no STF

O ministro Luís Roberto Barroso, relator no STF, propôs duas teses:

1. O foro privilegiado aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas

2. O foro não será alterado após o final da instrução processual ainda que o agente público venha a ocupar cargo ou deixe o cargo que ocupava

 

Segundo Barroso, a redução dos inquéritos e ações penais no Supremo seria drástica, mas não há um número exato definido

 

540 processos - 10% dos casos seguiriam na Corte, segundo estimativa citada pelo ministro

 

Como votaram os ministros até agora

Concorda com a tese do ministro-relator Luís Roberto Barroso?

 

A FAVOR

Luís Roberto Barroso / Rosa Weber / Cármen Lúcia / Marco Aurélio

 

CONTRA

Ainda não votaram

Alexandre de Moraes*

Gilmar Mendes

Dias Toffoli

Luiz Fux

Edson Fachin

Celso de Mello

Ricardo Lewandowski

*Pediu vista

 

Debate no Congresso

Anteontem, o Senado aprovou por unanimidade emenda à Constituição que acaba com a prerrogativa, com exceção para chefes de Poderes. PEC segue para a Câmara. Pela proposta, têm direito ao foro:

 

Michel Temer

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA

 

Rodrigo Maia

PRESIDENTE DA CÂMARA

 

Eunício Oliveira

PRESIDENTE DO SENADO

 

Cármen Lúcia

PRESIDENTE DO STF

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Gilmar diz que ‘propósitos escusos’ motivam inquéritos

Isadora Peron / Breno Pires / Daiene Cardoso

02/06/2017

 

 

Ministro do STF critica a Procuradoria-Geral da República durante debate sobre voto do colega da Corte Luís Barroso

 

 

Em uma crítica direta à Procuradoria- Geral da República, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, disse ontem que “propósitos escusos inspiram muitas vezes o inquérito”.

A afirmação foi feita em meio à discussão no plenário sobre o voto do ministro Luís Roberto Barroso na ação que pode limitar o alcance do foro privilegiado. Gilmar afirmou que a investigação aberta contra os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Francisco Falcão e Marcelo Navarro e os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff – para apurar se os ministros foram nomeados em troca de uma atuação que pudesse obstruir a Lava Jato – tem outro objetivo: “castrar iniciativas do STJ”.

“Não sei quem daqui foi nomeado e não participou de algum périplo político. Poucos.

Agora fica pedindo câmeras e coisas de… Qual é o objetivo desse inquérito? Esse inquérito vai chegar a provar obstrução de justiça desses magistrados? Obviamente que não. Qual é o objetivo deste inquérito? É castrar iniciativas do STJ. É amedrontá- lo. É este objetivo. Por isso nós temos que ter coragem civil de não permitir que esses inquéritos tramitem”, afirmou.

E completou: “Estes dias um advogado comentava comigo que este inquérito estava sendo mantido com esse objetivo primeiro de constranger o STJ e segundo de manter Lula e Dilma no STF. Se for por isso, está se fazendo de maneira indevida.

Mas veja que propósitos escusos inspiram muitas vezes o inquérito. E nós temos que ter uma função não de autômatos, mas de controladores destes processos”.

A insurgência de Gilmar contra as investigações sobre obstrução de justiça se dá duas semanas após ser tornado público o inquérito aberto contra o presidente Michel Temer, o ex-assessor do peemedebista e ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) e o senador afastado Aécio Neves (PSDBMG) tendo este como um dos supostos crimes apontados pela Procuradoria, com base nas delações do grupo J&F, que controla a JBS. No início da semana, o ministro do STF Edson Fachin desmembrou o inquérito, mantendo Temer e Loures juntos, mas abrindo um outro procedimento para investigar Aécio – Marco Aurélio Mello foi sorteado como relator.

 

Explicação. Deputados governistas protocolaram ontem na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara um pedido de explicações a Fachin, relator da Lava Jato no STF. No pedido, assinado por 32 parlamentares, o grupo questiona a relação de Fachin com o delator Ricardo Saud, da J&F, que o teria ajudado na campanha de 2015 para que ele fosse referendado no Senado como ministro da Corte.

Deputados que pedem a saída de Temer viram na iniciativa uma tentativa de fustigar o ministro.

“Estão querendo mexer em vespeiro. O relator da Lava jato chamado por um outro Poder todo investigado para dar explicações é querer demais proteger o Temer”, disse o deputado Júlio Delgado (PSB-MG). 

 

Prazo para Jucá

Dias Toffoli deu 20 dias para Romero Jucá (PMDB-RR) se manifestar, antes de decidir se autoriza inquérito contra ele. Jucá é suspeito de receber verba desviada de contrato dos Correios.

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Janot renova pedido de prisão de Loures, ex-assessor de Temer

02/06/2017

 

 

Procurador-geral solicita que relator da Lava Jato no Supremo autorize medida; ex-deputado perdeu foro privilegiado

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu que o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), reveja sua decisão e autorize a prisão preventiva de Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-assessor especial do presidente Michel Temer.

Para Janot, como Loures perdeu a prerrogativa, já que o exministro da Justiça Osmar Serraglio (PMDB-PR) voltou à Câmara, não há mais motivo para que a medida cautelar deixe de ser executada.

Quando negou o pedido há duas semanas, após deflagrada a Operação Patmos, Fachin havia alegado imunidade parlamentar de Loures para não autorizar a prisão. O ex-assessor de Temer havia assumido o mandato de deputado federal no lugar de Serraglio. Após ser deposto do Ministério da Justiça, Serraglio decidiu recusar a oferta de Temer para virar ministro da Transparência e reassumir o seu mandato.

Na semana passada, Janot já havia pedido para Fachin reconsiderar tanto a decisão relativa a Loures (PMDB-PR) quanto ao senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG).

Para o procurador-geral da República, a prisão dos dois é “imprescindível” para garantia da ordem pública e instrução criminal, diante de fatos gravíssimos que teriam sido cometidos pelos parlamentares.

Aécio e Loures foram gravados pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS, em negociação de pagamento de propina.

Depois, ambos foram alvo de ações controladas pela PGR.

Em um dos vídeos, Rocha Loures aparece “correndo” após supostamente ter recebido uma mala com R$ 500 mil.

 

Recursos. O ministro Marco Aurélio Mello disse que levará para julgamento na Primeira Turma do STF os recursos apresentados contra a decisão de Fachin que afastou Aécio e levou à prisão a irmã do tucano, Andrea Neves, o primo, Frederico Pacheco, e o ex-assessor parlamentar Mendherson Lima.

Marco Aurélio havia dito inicialmente que os agravos – como é chamado o tipo de recurso – seriam levados para o plenário, conforme o entendimento antecipado do ministro Fachin, que era o relator do caso e decidiu pela redistribuição.

“Mas, como o presidente Michel Temer não está mais na investigação, o julgamento dos pedidos deve ser feito na Primeira Turma”, afirmou Marco Aurélio.

O ministro disse não ter previsão de quando os recursos serão julgados. Segundo ele, depende da manifestação de todas as partes em resposta aos pedidos. A defesa de Aécio já respondeu ao agravo de Janot.

Mas, até o momento, a PGR ainda não respondeu aos pedidos das defesas. / I.P. e B.P.

 

Decisão. Janot já havia pedido prisão de Loures

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45153, 02/06/2017. Política, p. A8.