Multa e acordo de leniência concentram emendas à MP 784

Eduardo Campos e Raphael Di Cunto

17/06/2017

 

 

A Medida Provisória (MP) 784, que amplia os poderes punitivos do Banco Central (BC) e da Comissão de Valores Mobiliários (CMV), recebeu 97 emendas - a maioria de parlamentares da própria base governista. As propostas se concentram em sugestões para mudança no valor das multas que podem ser aplicadas pelo BC, agora fixado em R$ 2 bilhões, e no cancelamento da previsão para acordo de leniência ou, no caso de sua celebração, que o Ministério Público seja oficiado.

Há também um conjunto de emendas bastante técnicas que buscam promover melhorias de redação, deixando mais claras quais são as infrações passíveis de punições e os pedidos para imposição de padrões de dosimetria e limites objetivos para algumas punições. As sugestões serão discutidas nas próximas semanas, com a instalação de uma comissão do Congresso.

As emendas que tratam da participação do Ministério Público nos acordos de leniência podem vir a sanar um forte desentendimento entre o órgão e o BC, que surgiu com a edição da medida provisória. Os procuradores têm atacado duramente a proposta, mesmo com o BC deixando claro que sua competência é exclusivamente administrativa e que continua obrigado a comunicar os órgãos competentes quando se deparar com alguma suspeita de crime.

Há sugestões, também, para ampliar a necessidade de publicidade tanto dos termos de compromisso quanto das leniências. A crítica de alguns senadores e também de membros do Ministério Público Federal é que a atual redação de alguns dispositivos daria poder ao BC de fechar "acordos secretos".

Ligado ao setor financeiro, o deputado Paes Landim (PTB-PI) fez oito sugestões. Uma delas é que seja atribuição do BC instaurar e instruir processo administrativo para imposição de sanções por infrações à livre concorrência. Tal proposição chegou a constar de versões anteriores da redação da medida, mas foi suprimida. A MP trata de infrações administrativas, mas em nenhum momento fala de condutas que prejudiquem a concorrência, como a formação de cartéis.

Se levada adiante, a proposta de Landim pode abrir novo front de desentendimento do BC com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que afirma ter a prerrogativa para tratar de infrações à ordem econômica. O Cade vem fazendo, por exemplo, a investigação de um cartel que teria tentado manipular a taxa de câmbio no Brasil.

O recorde em número de emendas é do deputado Alfredo Kaefer (PSL-PR), que responde por 14 sugestões. "Procurei a CNF [Confederação Nacional das Instituições Financeiras] para me informar e corrigir os abusos. É um assunto muito complexo, deveria ser tratado por projeto de lei, a medida provisória limita muito o prazo de emendas e debate", disse.

As modificações propostas por Kaefer incluem rever a proibição para emissão de debêntures, eliminar a possibilidade de admoestação pública, modificar o termo de compromisso, impor dosimetria às multas, prever no texto leniência para práticas criminais e permitir que ex-funcionários possam fazer acordos de leniência. O deputado também quer limitar a leniência a um único participante. Fora do escopo do projeto, o deputado sugere a criação da Empresa Financeira Não Bancária, que faria financiamentos sem submissão ao BC.

Outro item estranho ao texto foi apresentado pelo deputado Ezequiel Fonseca (PP-MT), que propõe que seja criado um mandato de quatro anos para o presidente do BC, que só poderia ser demitido pelo Senado.

O deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) sugere que a Superintendência de Seguros Privados (Susep) possa aplicar penas de até R$ 1 bilhão, apontando que há defasagem e insuficiência dos parâmetros vigentes para a Susep em relação aos processos administrativos. A autarquia é controlada pelos partidos Solidariedade e PTB.

O deputado Rodrigo Martins (PSB-PI) pede que seja incluída no rol de infrações condutas que atinjam a defesa do consumidor. Já emenda da senadora Lídice da Mata (PSB-BA) quer exigir que os termos do acordo de leniência tenham de passar pela aprovação da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE) em sessão secreta.

As emendas, protocoladas por 16 deputados e senadores da base aliada, além de outros 16 de oposição ou de partidos "independentes", serão discutidas por uma comissão mista do Congresso Nacional e podem ser destacadas para votação diretamente no plenário da Câmara ou do Senado, caso o relator, ainda não definido, decida não acatar nenhuma. A MP precisa ser aprovada até o fim de outubro para não perder a validade.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4278, 17/06/2017. Finanças, p. C1.