Setor privado leva roteiro de acordos à gestão Trump

Daniel Rittner

21/06/2017

 

 

Representantes da iniciativa privada levaram ontem à Casa Branca uma proposta de agenda para o desenvolvimento das relações econômicas e comerciais Brasil-Estados Unidos sob a administração do presidente Donald Trump. Eles têm reuniões ainda no Departamento de Comércio e no USTR (escritório de negociações comerciais), além da autarquia responsável pelo registo de patentes e pelo órgão equivalente à Receita Federal, em busca do estabelecimento de interlocução com o novo governo americano e na tentativa de identificar caminhos para avanços.

Cinco pontos ganharam a sugestão de prioridade máxima: o lançamento de um diálogo exploratório (espécie de etapa prévia) para negociações de um tratado de livre comércio, um acordo bilateral para evitar a dupla tributação, a aprovação e ratificação do acordo de previdência social firmado em 2015, o reconhecimento mútuo entre operadores econômicos autorizados para facilitação dos despachos aduaneiros e a assinatura de um acordo de salvaguardas tecnológicas para uso da base de Alcântara (MA).

"Temos tido ótima receptividade", diz a gerente de política comercial da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Constanza Negri, que participa dos encontros em Washington até sexta-feira. "As primeiras reuniões nos ajudaram muito a entender que o governo [Trump] ainda está em processo de construção, com muitos funcionários que precisam ser designados e políticas em fase de confecção."

Cerca de 30 representantes da seção brasileira do Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos (Cebeu) e do Fórum de Empresas Transnacionais (FET), ambos secretariados pela CNI, integram o grupo. A missão tem executivos de associações setoriais, de companhias com subsidiárias americanas e de federações estaduais de indústrias. Há presença de segmentos como a indústria química, têxtil, aeronáutica, açúcar e biocombustíveis, tecnologia da informação, maquinário e equipamentos médico-hospitalares.

Apesar do discurso protecionista e das ações de isolamento promovidas pelo republicano nos cinco primeiros meses de sua gestão, Constanza não vê, no caso do Brasil, nenhuma sensibilidade comercial ou política com os Estados Unidos que possam constituir barreiras ao avanço das relações - como acontece com México, China ou Rússia.

Basta lembrar, por exemplo, que o Brasil tem uma balança comercial deficitária ou equilibrada com os Estados Unidos desde 2009. É o mercado com maior participação de exportações de alta densidade tecnológica (26% do valor total de produtos vendidos) e onde existe maior presença de multinacionais brasileiras no exterior, com um estoque de ativos de US$ 117 bilhões - são 40 empresas, na comparação com 31 na Argentina, 25 no Chile, 23 na Colômbia e 22 na China.

O presidente do Sindipeças e do Fórum de Transnacionais, Dan Ioschpe, lembrou que, logo depois dos chineses, o Brasil é o país emergente com mais investimentos produtivos acumulados nos Estados Unidos - na frente de Coreia, Índia e do vizinho México. "A qualquer tempo, promover a internacionalização nos parece um atributo muito importante, independentemente dos governos de ocasião", afirma o empresário, que aponta ganhos em inovação e em competitividade - inclusive no mercado doméstico - nesse movimento.

Para Ioschpe e os representantes brasileiros, há iniciativas com alcance no médio prazo que podem prosperar, apesar das incertezas políticas. O acordo previdenciário, firmado em junho de 2015, não foi ratificado pelo Congresso Nacional. Esse instrumento eliminaria situações em que empregador e empregado tenham que contribuir simultaneamente, em cada um dos países, pelo mesmo trabalho executado.

O acordo de salvaguardas tecnológicas, ao permitir o uso do centro de Alcântara, faria o Brasil entrar em um mercado que movimentou US$ 2,5 bilhões só em 2016 - e teve os americanos como responsáveis por 52% dos lançamentos de satélites comerciais.

Outras sugestões levadas pelo setor privado para Washington incluem a adesão brasileira ao Global Entry, que agiliza a entrada de viajantes frequentes de negócios aos Estados Unidos, e a ratificação do acordo de céus abertos, que remove barreiras para empresas aéreas e ainda depende de aprovação no Congresso.

Foi apresentado também um pedido para a negociação, entre os dois países, de acordo de cooperação e facilitação de investimentos.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4280, 21/06/2017. Brasil, p. A3.