Com voto tucano, comissão rejeita reforma trabalhista

Fabio Murakawa e Vandson Lima

21/06/2017

 

 

A Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS) rejeitou ontem o relatório de Ricardo Ferraço (PSDB-ES) favorável à aprovação da reforma trabalhista, impondo uma surpreendente derrota para o governo. A votação mexeu com o mercado - o dólar teve a maior alta desde a crise política desencadeada pela delação da JBS, em maio, e o Ibovespa caiu 2,01% - e com os ânimos dos senadores. Enquanto governistas demonstravam abatimento, a oposição celebrava o resultado como "o início do fim do governo Michel Temer".

Ao todo, dez senadores votaram contra o texto na CAS, contra nove votos favoráveis. Ironicamente, o voto de um senador tucano foi determinante para o resultado. Cotado para concorrer ao governo de Sergipe no ano que vem, Eduardo Amorim (SE) votou contra o parecer do colega capixaba.

"Votei com minha consciência. Não fiz nada escondido. Avisei o governo e ao meu partido que era contra essa proposta", afirmou Amorim ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor.

O PSDB, contou, já estava ciente de sua contrariedade ao projeto há semanas. Mas, apesar do interesse na aprovação, não o boicotou.

O voto de Amorim impôs um duro golpe para Temer, que vê na aprovação das reformas uma maneira de demonstrar que está tocando seu trabalho normalmente, apesar da crise política.

Com o presidente em viagem oficial à Rússia e Noruega, governo e PSDB passaram a se culpar mutuamente pela derrota ao longo da tarde.

Em declarações à imprensa, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, apontou a postura "contraditória" do PSDB, que hesita em decidir sobre desembarcar ou não do governo, como determinante para a derrota do texto na CAS.

Por sua vez, o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), responsabilizou a viagem do presidente pela derrota: "O governo levou todo mundo para Moscou e se esqueceu da votação".

Apesar do resultado, a reforma segue tramitação normal no Senado. A CAS é a segunda das três comissões pelas quais tramita o texto no Senado. Ele já havia sido aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no início do mês. A tramitação prevê ainda análise na Comissão de Constituição e Justica (CCJ), cuja relatoria cabe ao senador Romero Jucá (PMDB-RR). Jucá lerá seu relatório hoje no colegiado, com votação prevista para a próxima quarta. Nesse dia, a matéria estará pronta para apreciação do plenário.

Mas governistas já passam a questionar a conveniência de votar a proposta tão rapidamente - o resultado na CAS pôs em dúvida a aprovação da reforma trabalhista, antes dada como certa por necessitar apenas dos votos de uma maioria simples para sua aprovação. Abatido, o relator na CAS e na CAE, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), disse apenas que "a aprovação no plenário vai depender da capacidade de mobilização dos senadores".

Jucá, porém, mantém o discurso otimista e o calendário, acertado com a oposição. Para ele, a reforma não está ameaçada e será aprovada pela maioria dos senadores em plenário, a partir do dia 28.

"Em tese, três votos da base do governo não foram dados [favoravelmente à reforma]. Não foi recado nenhum. Foi posição individual de alguns senadores", disse.

Além de Amorim, Sérgio Petecão (PSD-AC) estava ausente, não conseguiu chegar do Acre e no lugar dele votou Otto Alencar (PSD-BA), que faz oposição ao governo; Hélio José (PMDB-DF), da base governista, foi o terceiro dos votos contrários que viraram o placar. No PMDB, maior bancada da Casa, Jucá diz ter 17 senadores favoráveis à reforma de um total de 22.

Ele rechaça a tese de que as denúncias contra Temer - como a entrevista em que Joesley Batista o chama de "chefe de quadrilha" - tenham pesado na votação. "Não pesaram denúncias nem capa de revista. As posições individuais distorceram uma maioria que se mostrará no plenário."

A possibilidade de o governo mudar a estratégia e aceitar alterações no texto está descartada, sublinhou. "Não muda nada. O jogo está 1 a 1", afirmou.

Já a oposição não escondia o entusiasmo pela derrota imposta ao governo. "O que demonstra essa votação é que o governo Temer acabou. Esse governo se sustentava só na promessa de aprovação das reformas para o mercado. E mostrou agora a sua fragilidade", disse o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ). "O que houve é que senadores da base governista perceberam que é muito desgastante [votar com o governo e pela reforma]."

Para Lindbergh, a votação representou "uma moção de censura contra o governo Temer."

Randolfe Rodrigues (Rede-AP) citou o fato de Temer, o chegar à Rússia, não ter sido recebido pelo presidente Vladimir Putin, mas pelo vice-ministro das Relações Exteriores, Sergei Ryabkov.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4280, 21/06/2017. Política, p. A12.