Temer prega mudanças sem combinar com os russos do Congresso

Maria Cristina Fernandes

21/06/2017

 

 

No primeiro dia de sua viagem à Rússia, o presidente Michel Temer elogiou os parlamentares brasileiros, ora para o presidente da Duma, o parlamento russo, Vyacheslav Volodin, ora para representantes de empresas reunidos em um seminário de captação de investimentos russos no Brasil. Só no fim do dia ficou claro que faltou ao presidente combinar com os russos que deixou no Congresso Nacional o desfecho da derrota governista na votação da reforma trabalhista.

Temer desembarcou às 6h30 (horário de Brasília) no aeroporto de Vnukovo. Vinha acompanhado de uma comitiva de três ministros, Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo), Indústria e Comércio (Marcos Pereira) e Meio Ambiente (José Sarney Filho), além do chanceler Aloysio Nunes Ferreira, que chegou a Moscou proveniente de Pequim. Quatro parlamentares também acompanham o presidente, o senador Paulo Bauer (PSDB-SC), e os deputados Darcísio Perondi (PMDB-RS), Átila Lins (PSD-AM) e Vinícius Carvalho (PRB-SP).

Os parlamentares o acompanharam no primeiro compromisso da agenda. Temer disse ao presidente da Duma que compartilha o poder com o Congresso Nacional: "Faço um presidencialismo semiparlamentarista". Citou a origem parlamentar de 90% dos integrantes de seu gabinete como sinal da importância que dá ao Legislativo.

O Congresso tem o poder de autorizar o Supremo Tribunal Federal a julgar o presidente se ele vier a ser denunciado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O presidente se pronunciaria brevemente sobre a conclusão da Polícia Federal, em relatório parcial, de que cometera crime de corrupção passiva: "É juízo jurídico, não é político. Por isso, não vou comentar". Foi a pauta parlamentar, no entanto, com a tramitação da reforma trabalhista, que revelaria a fonte mais imediata de dissabor do presidente da República em seu primeiro dia de viagem à Rússia.

"Fatos desprezíveis e desprezáveis não afetarão o país rumo ao desenvolvimento", disse o presidente à plateia de representantes empresariais a quem reiterara o compromisso do governo brasileiro pelas reformas. "Passamos por algumas dificuldades mas estamos colocando em marcha a mais ampla agenda de reformas da década", disse o presidente, ao lado do vice-primeiro-ministro da Rússia, Arkady Dvorkovich.

O presidente previu para a próxima semana a conclusão da reforma trabalhista no Senado e "ainda neste semestre" a previdenciária. Deixou clara a importância estratégia da pauta reformista para a atratividade do país: "Quero incentivar os empresários russos e informá-los de que estamos colocando o país nos trilhos. Estamos falando das reformas para dar segurança àqueles que contratam com nosso país".

Meia hora depois de deixar o fórum empresarial, a previsão se revelaria precipitada. A rejeição, pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), da reforma trabalhista obrigaria o presidente a descer do apartamento, para onde havia se recolhido antes do último compromisso do dia, o Balé Bolshoi, e falar à imprensa sobre o resultado.

Entre os parlamentares que integram a comitiva, havia inconformidade com o fato de que o governo não teria agido para retirar, da comissão, o senador do PSDB sergipano (Eduardo Amorim) que é casado com uma juíza trabalhista e já havia anunciado voto contra. Os parlamentares foram votos vencidos na decisão do presidente se pronunciar sobre a derrota. Depois de falar por telefone com o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), o presidente saiu sorridente do elevador do hotel Ritz Carlton, no centro de Moscou.

Temer estava determinado a mostrar frieza em relação à derrota da reforma trabalhista na CAS. Parlamentares de sua comitiva eram contrários a que ele se pronunciasse, mas o presidente resolveu falar antes de se dirigir ao Balé Bolshoi, seu último compromisso do primeiro dia da visita oficial a Moscou. "Votação no Congresso é assim mesmo. Perde numa comissão e ganha na outra. O que importa é o plenário. E no plenário vamos ganhar".

O presidente lembrou a tramitação da reforma na Câmara para tentar convencer que a derrota foi apenas um percalço: "Na Câmara dos Deputados também houve um primeiro momento em que a urgência não chegou a ser votada e depois foi para o plenário e ganhamos com muita facilidade". Questionado pelo Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, sobre a estratégia para aprovar a reforma trabalhista no plenário, respondeu: "É maioria simples. O governo vai ganhar".

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4280, 21/06/2017. Política, p. A12.