Financiamento eleitoral pode judicializar reforma política

 MIGUEL CABALLERO

16/08/2017

 

 

Especialistas debatem chance de proposta ser questionada no STF

Em artigo na edição de ontem do GLOBO, o jurista Modesto Carvalhosa defendeu que a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia (FED), um dos itens da reforma política, é inconstitucional. Entre seus argumentos, Carvalhosa citou uma usurpação, em sua visão, da soberania popular pelo fato de a reforma ser tocada pelos atuais detentores de mandato, sem uma consulta ao povo como num plebiscito; a menor possibilidade de renovação dos eleitos com as novas regras, o que feriria o princípio de alternância de poder; e a obrigatoriedade de se indicar a origem do custeio para a criação da nova despesa com o fundo.

Outros especialistas em Direito Constitucional questionam parte dos argumentos, mas há quem veja a possibilidade de a criação do fundo ser considerada inconstitucional pela Justiça.

— Acho que o item mais sensível, do ponto de vista da constitucionalidade da proposta, é o dinheiro público ser usado de forma desigual entre partidos e candidatos, prejudicando as condições de igualdade nas eleições, dando vantagem a quem já tem cargo e assim ferindo o princípio da alternância de poder — avalia Oscar Vilhena, professor da FGV-São Paulo.

Professor de Direito Eleitoral e Constitucional da UFF e promotor do Ministério Público do Rio, Guilherme Peña de Moraes é mais cético quanto ao sucesso de uma investida judicial contra a nova regra, caso seja aprovada.

— Se o Congresso não puder mudar regras eleitorais sem um plebiscito antes, não se poderia fazer qualquer reforma política. Sobre a distribuição desigual dos recursos, é importante lembrar que há outros pontos da política brasileira em que a proporcionalidade do tamanho dos partidos e bancadas também é usada como critério. E, por ser uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o que se exige sobre origem dos recursos é a composição do fundo, e isso parece contemplado quando se fala em 0,5% das receitas correntes líquidas do ano anterior. Outros fundos já foram criados sem detalhamento prévio da origem de custeio. Não é uma emenda orçamentária — diz Peña de Moraes.

Em Brasília, o relator da reforma política, deputado Vicente Candido (PT-SP), propôs que as dotações ao fundo sejam alocadas na unidade orçamentária do Executivo no orçamento de 2018.

 

FEDERAÇÕES PARTIDÁRIAS

Outro ponto polêmico da reforma é a criação de federações partidárias, em substituição às coligações. A principal mudança é que os partidos precisarão ficar juntos na federação durante os quatro anos do ciclo eleitoral seguinte à eleição, ao contrário do que acontece com as coligações, muitas vezes desfeitas no dia seguinte à eleição.

— A federação não resolve o principal problema das coligações, que é você votar em um candidato de um partido, elegendo um de outro, embora aumente minimamente o caráter ideológico das alianças, que têm de ser mantidas — avalia Peña de Moraes.

O globo, n.30690 , 1608/2017. PAÍS, p. 4