Título: O Brasil e os desdobramentos da crise
Autor: Pereira, José Matias-
Fonte: Correio Braziliense, 09/02/2012, Opinião, p. 19

Economista, advogado, doutor em ciência política (UCM-Espanha), pós-doutor em administração pela FEA/USP, é professor-pesquisador associado do programa de pós-graduação em contabilidade da Universidade de Brasília

Os impactos da crise global continuam afetando a maioria das economias dos países, em que pese os diferentes níveis de intensidade com que atinge cada um deles. Recentes estudos e indicadores econômicos e sociais do Banco Mundial, do Fundo Monetário internacional (FMI), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), do IBGE, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Banco Central do Brasil reforçam o entendimento de que não está havendo um arrefecimento da crise na economia mundial. Os governos dos Estados nacionais, em particular dos mais desenvolvidos, em conjunto com o FMI, não estão avançando adequadamente na adoção de medidas que contribuam para a solução da crise. Vê-se que as principais economias mundiais colocam sempre em primeiro plano os próprios interesses socioeconômicos e políticos.

Levando-se em consideração os efeitos dessa retomada da crise, é previsível que haverá uma sensível redução do crescimento da economia brasileira nos próximos anos, decorrente, em especial, da desaceleração na indústria nacional. É importante alertar que o cenário mundial favorável que beneficiou o Brasil no período de 2003 a 2008, notadamente no aumento de preços e no volume de exportações de nossas principais commodities (agrícolas e minérios), está passando por fortes transformações e gerando incertezas.

A condução da política econômica no Brasil, por sua vez, se apresenta bastante complexa, pois vai além da preocupação com a maximização do emprego e da estabilidade do valor da moeda. Nela também estão incluídas a proteção social, a diminuição do nível da pobreza, a redução das desigualdades de renda pessoais, a redução dos desequilíbrios regionais, entre outros. Por seu lado, o Brasil vem praticando nas últimas décadas uma das maiores taxas de juros do mundo, de 10,5% ao ano (BCB, fev. 2012), o que equivale a uma taxa real próxima de 4,5% ao ano. Registre-se que, mesmo que o Banco Central consiga baixar a taxa de juros no fim de 2012 para 9,0% ao ano, a taxa real de juro (descontada a previsão de inflação para os próximos 12 meses) do país continuará sendo a mais alta do mundo.

É preciso lembrar que foram gastos com o pagamento de juros da dívida pública da União cerca R$ 200 bilhões em 2010, o que representa 7,5% do PIB, enquanto a média internacional é de 1,8% do PIB ao ano. A taxa de juros praticada pelo segundo colocado do ranking mundial, a Hungria, é de 2,8% ao ano, enquanto a taxa média de juros de um número significativo de países situa-se em 0,9% negativo ao ano. Esses dados nos permitem argumentar que os custos das decisões equivocadas que vêm sendo adotadas nos últimos anos pelas autoridades monetárias são muito elevados para a sociedade brasileira. Assim, é essencial que o Banco Central, mesmo diante das incertezas no cenário externo, assuma postura menos conservadora nas suas decisões em relação a essa questão.

Pode-se argumentar, por fim, que o Brasil, diante do cenário instável, necessita elevar o nível de consistência da sua política macroeconômica, utilizando com mais intensidade a política fiscal e reduzindo a importância da política monetária. Para isso, é recomendável que aprofunde os cortes nos gastos correntes do setor público, priorizando os investimentos em setores estratégicos de infraestrutura essenciais para o desenvolvimento; promova a redução da carga tributária, em particular dos impostos indiretos; adote medidas para reduzir o serviço da dívida, dando continuidade aos cortes na taxa de juros; mantenha o foco no controle da inflação; adote medidas para evitar a desvalorização acentuada do real; melhore o desempenho da governança pública; adote medidas efetivas de combate à corrupção; estimule o aumento da competitividade e da inovação tecnológica; e, em especial, priorize o capital humano, elevando a qualidade da educação da população, por meio de reformas educacionais consistentes e alocando investimentos na formação profissional.