Brasil tem índice mais elevado de políticas "passivas" de emprego , diz Planejamento

Fabio Graner

27/06/2017

 

 

O Brasil tem um índice muito superior ao dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) na aplicação das chamadas políticas passivas de emprego, como seguro-desemprego e FGTS, de acordo com levantamento do Ministério do Planejamento. Esse tipo de política representa no país 89% dos recursos aplicados pelo governo no mercado de trabalho em políticas passivas e apenas 11% em políticas ativas, como o Programa de Sustentação de Emprego (PSE) e ações de qualificação do trabalhador.

Políticas passivas de emprego são voltadas ao oferecimento de alguma assistência ao trabalhador que perdeu o emprego ou tem situação de vulnerabilidade, como baixos salários. Já as políticas ativas buscam promover ações para ampliar a permanência do trabalhador no mercado de trabalho, diminuir tempo de recolocação de desempregados, aumentar as chances de encontrar emprego e fomentar processos de geração de oportunidades de trabalho ou renda.

O Brasil destoa na comparação internacional", disse o assessor especial do ministério do Planejamento, Arnaldo Lima. "O nosso mercado de trabalho protege mais o trabalhador com carteira assinada", acrescentou o técnico. O levantamento feito, no qual o Brasil é quem tem pior colocação, considera mais de 30 países, além de um dado médio da OCDE, que aponta 60,5% de gastos com políticas passivas e 39,5% com as ativas.

Para Lima, é preciso caminhar mais para a inclusão produtiva do trabalhador, com maior presença de políticas ativas, prolongando a permanência no empregador. O técnico apresentou um balanço do PSE, mostrando que, desde sua criação, ainda como PPE (Programa de Proteção ao Emprego, aprovado em 2015, no governo Dilma), até maio foram celebrados 164 acordos coletivos e mais 25 estão em análise, beneficiando um total de 72,9 mil trabalhadores e gerando custo de aproximadamente R$ 200 milhões.

Em sua visão, o programa tem se mostrado um meio termo interessante para o trabalhador, que perde um pouco de sua renda, mas mantém o emprego. Pelas regras do PSE, um acordo entre empresas e funcionários reduz os salários em 30% para as companhias. A redução efetiva para o trabalhador é de 15%, porque metade da redução é compensada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

O técnico disse que o programa se alinha com o processo de reforma nas relações de trabalho no Brasil, cujo projeto está em tramitação no Senado, que privilegia o negociado sobre o legislado. "O programa fortalece as relações de trabalho e reduz os conflitos entre capital e trabalho", comentou. Ele também destacou que o PSE ajuda a poupar recursos do seguro-desemprego, uma das grandes despesas no orçamento do governo federal e que já foi alvo de ajustes em 2015.

Pelos dados do balanço do PSE apresentados por Lima, a maior parte dos acordos foram feitos pelos setores fabril (101 acordos), em especial o automotivo (36 acordos). As solicitações de adesões são na maior parte realizadas em São Paulo, com 116, seguidas de Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.

Em uma comparação internacional com 18 países que aplicam políticas semelhantes, o programa brasileiro tem uma "taxa de reposição", que é o porcentual do salário original, de 85%, perdendo apenas para Hungria, com 100% de reposição. A duração máxima de 12 meses dos acordos no âmbito do programa no Brasil está entre as mais baixas na comparação com outras nações.

Questionado se o programa não estaria atingindo poucos trabalhadores, dado o desemprego de 14 milhões de pessoas no Brasil, Lima destacou que o instrumento é novo, em um país com pouca tradição de negociações coletivas. "O programa não é para reduzir a taxa de desemprego. No mundo também não é assim. Esse tipo de programa foi criado na grande depressão e nós não tínhamos programa similar. Na OCDE, ficou mais comum a partir da crise de 2008. Mas lá eles protegem de 1% a 5% do total de trabalhadores", disse, lembrando que o programa ajuda a manter trabalhadores especializados e ajuda a aumentar produtividade na economia.

Para o especialista em relações do trabalho Emerson Casali o PSE tem problemas que o impedem de garantir centenas de milhares de empregos. Na visão dele, há excesso de burocracias envolvendo o programa brasileiro, como exigências de certidões negativas, garantia de estabilidade, proibição de hora extra, entre outras que desestimulam o empresário a aderir e fechar acordos com os trabalhadores. "Se o trabalhador e a empresa concordam, por que tanta burocracia?", questionou Casali.

O analista comenta que o programa também sofreu com o fato de ter sido criado em um contexto no qual, na visão dele, a política econômica deliberadamente buscava elevar o desemprego para reduzir os salários e, consequentemente, a inflação, em especial do setor de serviços.

"A visão de política econômica era contraditória com a ideia do programa", disse. "Por isso, o programa se tornou algo muito específico, para poucos setores, e, mesmos estes, têm dificuldade de acessá-lo", disse.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4284, 27/06/2017. Brasil, p. A2.