Temer é denunciado por corrupção e será julgado pela Câmara

Murillo Camarotto

27/06/2017

 

 

 for condenado no processo, deixe o cargo. De acordo com o PGR, os crimes foram praticados "com vontade livre e consciente" dos acusados.

Na denúncia, a PGR afirma que era Temer o destinatário final da propina paga por executivos do grupo JBS. O montante de dinheiro ilegal repassado ao presidente pela empresa poderia chegar ao patamar de R$ 38 milhões em nove meses. Janot solicitou ao STF que Temer e Loures se manifestem dentro de 15 dias.

A PGR pediu ainda a abertura de um novo inquérito contra Temer e Loures, esse para investigar irregularidades no chamado "Decreto dos Portos". O envolvimento de servidores do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e da Petrobras em crimes tratados nas conversas de Temer e Rocha Loures com o empresário Joesley Batista será apurado em primeira instância.

A denúncia de Janot é inédita. Em 1992 e 2016, os então presidentes Fernando Collor e Dilma Rousseff tiveram denúncias aceitas por crime de responsabilidade, mas dentro de processo de impeachment, com tramitação no Congresso.

Boa parte da denúncia foi baseada no inquérito feito pela Polícia Federal. O relatório final do inquérito, encaminhado ao STF, apontou indícios de obstrução de justiça em duas ocasiões: o suposto aval à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha e o silêncio diante dos relatos de que juízes e procuradores teriam sido corrompidos.

A PGR tem cinco dias para se manifestar sobre a suposta prática desse crime, que pode ensejar nova denúncia contra Temer.

A PF também quer aprofundar as investigações contra o presidente por organização criminosa, mas pediu ao STF autorização para tratar desse assunto no âmbito outro inquérito, que cuida especificamente da atuação do "grupo do PMDB da Câmara".

O relatório inclui ainda o laudo da perícia feita no áudio que captou a conversa entre Temer e Joesley. Diferentemente do que foi dito por um perito contratado pelo governo, a PF concluiu que o arquivo não passou por nenhuma manipulação ou edição.

Os peritos conseguiram recuperar alguns trechos inaudíveis da conversa, passagens que comprometem ainda mais a situação de Temer. No trecho em que o empresário diz "todo mês", referindo-se pagamentos para compra de silêncio, Temer o indaga: "O Eduardo também, né?".

Essa fala, segundo os investigadores, desmonta a versão de Temer de que a teria apenas demonstrado concordância com a manutenção de uma boa relação entre Joesley e Eduardo Cunha.

"Essa hipótese interpretativa, de que o Exmo. Sr. Presidente da Republica, ao ouvir o relato do empresário teria apenas recomendado a conservação da boa relação entre ambos, sem qualquer menção, mesmo tácita, à presente condição de Cunha, ao seu suposto envolvimento em atos ilícitos e as latentes informações que possivelmente detém, não se coaduna com o todo".

A PF ressalta, porém, que não há indicações "categóricas" de que os pagamentos em questão tenham sido reivindicados por Cunha ou pelo doleiro Lúcio Funaro. As informações são baseadas apenas no relato de Joesley.

"É fundamental pontuar que mesmo na hipótese de serem decorrentes de iniciativa unilateral, ou seja, com os reais motivos à revelia dos beneficiários, pagamentos com vistas a prevenir acordo de colaboração premiada constituem franca interferência ao aprofundamento da investigação sobre atuação de organizações criminosas", diz a PF.

O laudo dos peritos apontou a existência de 294 interrupções no áudio. Segundo revelou na semana passada o Valor, esses eventos foram motivados por uma funcionalidade do gravador usado por Joesley. O equipamento suspendia a gravação quando o volume da conversa baixava.

"Não foram encontrados elementos indicativos de que a gravação tenha sido adulterada por meio da supressão intencional de trechos", diz o laudo da PF.

Primeiramente tratada como prevaricação, a omissão de Temer ao ouvir Joesley narrar a compra de dois juízes e um procurador acabou sendo interpretada como obstrução de justiça. "No entanto, a conduta em análise não há de ser vista como episódica, movida por sentimento ou interesse pessoal e, sim, omissão que se alinha ao propósito de não ver avançar qualquer investigação que implicasse o grupo J&F ou seus administradores", diz a PF.

A PF também citou o ex-ministro Geddel Vieira Lima. O político baiano teve a situação complicada com o relatório. Os investigadores mencionam sondagens feitas por ele à Raquel, mulher de Funaro, para saber dos riscos do doleiro fazer delação premiada. Funaro já está negociando um acordo com a procuradoria.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4284, 27/06/2017. Política, p. A8.