Fadiga e extensão da corrupção explicam falta de protestos

Ricardo Mendonça

28/06/2017

 

 

A popularidade do presidente Michel Temer, conforme as pesquisas mais recentes, é menor que as de Fernando Collor e Dilma Rousseff na véspera dos respectivos processos de impeachment, em 1992 e 2016. Outra diferença é que nem Collor nem Dilma foram gravados em conversa suspeita dentro do Palácio do Planalto. E nenhum dos dois foi formalmente acusado de corrupção pelo Ministério Público no curso do mandato. Nos dois casos anteriores, porém, houve registro de multidões nas ruas em protesto pela queda do governante, fenômeno que não ocorre hoje com Temer. Por quê?

Dois pesquisadores ouvidos pelo Valor listam uma série de hipóteses para tentar explicar isso. Vão do visível cansaço da sociedade com a política à falta de qualquer expectativa com Temer desde o dia de sua posse.

O cientista político Marco Antonio Carvalho Teixeira, professor da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, dá ênfase à questão da fadiga: "Parte grande da população tinha a expectativa de que tudo melhoraria se trocasse o governo. Trocou [Dilma por Temer], mas ocorreu tudo ao contrário. As coisas estão piores. Então essa frustração gera uma resignação. As pessoas dedicaram tempo e esforço para trocar o governo, não é fácil, mas agora percebem que não basta trocar".

Para ele, as graves denúncias contra Temer e seus mais próximos constrangem grupos que defendiam o impeachment de Dilma. "Era mais fácil entender tudo até 2014, né?", provoca, em tom de ironia. "Porque até então era simples: tudo era culpa do PT. Agora muita gente vê que as coisas são mais complexas. Os moralistas de 2014 e 2015 ficaram sem moral."

Professor do Insper, o cientista político Fernando Schuler também fala em fadiga. E elenca outras hipóteses para tentar explicar o silêncio das ruas.

Com quase todos os partidos relevantes envolvidos em denúncias, "a ideia do nós contra eles se diluiu", diz. Na opinião de Schuler, o que há agora é "uma inconformidade passiva" com Temer.

Curiosamente, a própria impopularidade do pemedebista deve ser levada em consideração para a falta de ânimo com os protesto, diz. Como Temer nunca foi eleito como cabeça de chapa - e sua baixíssima taxa de aprovação vem desde a posse -, não ocorreu com ele uma reversão rápida de expectativas. "Ninguém esperava muito dele desde o início", explica.

Em tese, quem poderia estar liderando protestos são os partidos de esquerda, que fazem oposição a Temer no Congresso. "Mas a esquerda está desmoralizada e envolvida até o pescoço nos mesmos casos. Ainda não se levantou da derrota do impeachment de Dilma. O pouco de energia que resta na esquerda é direcionada para tentar salvar Lula", afirma.

Por fim, tem a conta pragmática da direita, que se assusta com a liderança de Lula nas pesquisas para 2018. "Quem foi pra rua derrubar Dilma não quer a volta de Lula. Mesmo que não goste de Temer, essas pessoas têm receio que novos protestos impulsionem Lula ainda mais."

A falta de clareza sobre uma saída constitucional para a crise e os esboços de melhoria econômica também foram citados como fatores inibidores de protestos.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4285, 28/06/2017. Política, p. A10.