O Estado de São Paulo, n. 45182, 01/07/2017. Economia, p. B3

 

Governo suspende reajuste do Bolsa Família

Adriana Fernandes e Tânia Monteiro

01/07/2017

 

 

Aumento de 4,6% previsto para entrar em vigor este mês será suspenso; para equipe econômica, não há ambiente para reajustes neste momento

Com a frustração de receitas e a dificuldade de cumprir a meta fiscal deste ano, o governo suspendeu o reajuste do Bolsa Família acima da inflação previsto para entrar em vigor em julho. O Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo pagamento do benefício, informou que o governo cancelou o reajuste e que não há prazo para que a discussão volte ao radar.

Originalmente, a ideia era dar aumento de 4,6% no benefício, acima da inflação oficial acumulada em 3,6% nos últimos 12 meses.

Segundo apurou o Estadão/ Broadcast, além da escassez de recursos, uma ala do governo considerou que a crise política “esconderia” o anúncio do aumento.

A média do Bolsa Família é de R$ 182 por família. No ano passado, o programa teve reajuste de 12,5%, depois de dois anos sem aumento. A ideia era que o aumento fosse usado como agenda positiva numa tentativa de elevar a popularidade do presidente.

Em maio, o ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra, disse ao Estadão/Broadcast que o reajuste sairia em julho, dentro de um grande pacote de bondades do governo Temer.

“Vai ter reajuste em julho acima da inflação. É uma decisão”, disse. Na época, o ministro informou que o programa contava com orçamento de R$ 30 bilhões – que passou ileso ao corte do orçamento para o cumprimento da meta fiscal – e que a cifra já previa o dinheiro para bancar o reajuste.

Fiscal. A área econômica, comandada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no entanto, dissuadiu o presidente de reajustar o benefício, porque seria incoerente neste momento em que se discutem medidas para conter os gastos e aumentar as receitas, até com a possibilidade cada vez maior de aumento de impostos para cumprir a meta de déficit de R$ 139 bilhões.

O reajuste do Bolsa Família comprometeria também a meta fiscal do ano que vem, projetada em R$ 129 bilhões.

A equipe de Meirelles disse que seria necessário um aviso ao mercado de que o governo continua fiscalmente responsável e não atende a apelos por pacotes de bondades.

“Não é bem falta de dinheiro, temos no Orçamento, mas por conta do momento fiscal, não tem como dar aumento agora”, disse Osmar Terra, por meio da assessoria. Ele ficou sabendo pelo presidente, na noite de quinta-feira, que o anúncio tinha sido adiado.

Como forma de contrapor o cancelamento do reajuste, o governo deve anunciar que o programa passará a atender mais 150 mil famílias a partir de julho.

O Ministério de Desenvolvimento Social tinha conseguido zerar a fila nos três primeiros meses deste ano, mas em maio o número de interessados em receber o Bolsa Família voltou a subir e alcançou 422 mil famílias.

Programa

- R$ 182 é a média de pagamentos do Bolsa Família

- 12,5% foi o reajuste em 2016

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Dívida federal atinge recorde de 72,5% do PIB

Fabrício de Castro e Eduardo Rodrigues

01/07/2017

 

 

 

Em meio às dificuldades do governo para dar andamento à reforma da Previdência no Congresso, a dívida bruta brasileira atingiu em maio um total de R$ 4,63 trilhões, o que equivale a 72,5% do Produto Interno Bruto (PIB). O porcentual, informado ontem pelo Banco Central, é o maior já visto na série histórica, que começou em dezembro de 2006.

A escalada da dívida bruta do governo geral – que reúne os governos federal, estaduais e municipais, excluindo Banco Central e estatais – vem pelo menos desde 2015, em função da deterioração fiscal. Com o setor público registrando sucessivos déficits primários, em razão do rombo na Previdência, o Banco Central já projeta uma dívida bruta de 77,5% do PIB no fim deste ano.

O número da dívida bruta é uma das principais referências para avaliação, por parte das agências globais de classificação de risco, da capacidade de solvência do País. Se a dívida subir muito, os investidores podem começar a desconfiar da capacidade de o governo pagar seus compromissos. No limite, o País pode ter dificuldades para rolar suas dívidas e quebrar.

“Há uma preocupação com a dívida bruta”, diz o economista Bruno Lavieri, da 4E Consultoria.

“O desequilíbrio fiscal é o principal fator para a dívida subir. Se tivéssemos um resultado fiscal minimamente positivo, esse ritmo de crescimento da dívida seria bem mais contido.” Em maio, conforme o Banco Central, o setor público brasileiro registrou déficit primário de R$ 30,74 bilhões. Foi o pior resultado para o mês desde o início da série histórica, em dezembro de 2001. Somente a Previdência foi responsável por R$ 18,03 bilhões do déficit.

Os números negativos, que ajudaram a elevar a dívida bruta, expressam o descasamento entre receitas e despesas do setor público, em especial no campo previdenciário. Em meio às dificuldades do governo para encaminhar a reforma no Congresso, após o estouro da crise política, a sangria nas contas do INSS continua.

No acumulado de 12 meses até maio, o déficit previdenciário é de R$ 170,03 bilhões. O setor público – que reúne governo central (Tesouro, Banco Central e INSS), Estados, municípios e estatais, com exceção de Petrobrás e Eletrobrás – apresentou no período rombo de R$ 157,71 bilhões. Na prática, se não fosse o déficit no INSS, as contas do setor público poderiam estar no azul.

“A reforma da Previdência serve para garantir que a dívida bruta não vai continuar subindo no longo prazo. Essa reforma não tem praticamente nenhum efeito nos próximos dois ou três anos, mas daqui a 10 ou 15 anos ela fará bastante diferença em relação ao patamar da dívida”, disse Lavieri. Ele projeta uma dívida bruta de cerca de 85% entre 2021 e 2022, “para só então voltar a cair se a reforma for feita”.