O Estado de São Paulo, n. 45188, 07/07/2017. Economia, p. B3

 

TLP pode prejudicar empresas, diz Rabello

Idiana Tomazelli

07/07/2017

 

 

Para presidente do BNDES, novo modelo de cálculo da taxa de juros usada pelo banco reduz ‘previsibilidade’ nas condições de financiamento

O presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, alertou que a fórmula proposta pelo governo para o cálculo da nova taxa de juros dos empréstimos do banco de fomento, chamada de Taxa de Longo Prazo (TLP), pode prejudicar as empresas tomadoras de crédito na instituição ao reduzir a ‘previsibilidade’ das condições dos financiamentos.

Para ele, atrelar a atual TLP a um título público torna a taxa ‘muito mais nervosa’ do que a TJLP, que é definida a cada três meses pelo governo.

Isso porque as taxas de juros de títulos públicos refletem as condições da economia e quanto os investidores pedem para aceitar financiar o governo. Essa avaliação acaba sujeita a fatos não só na economia, mas também na política.

“Em um momento muito agudo (de alta desses juros), um projeto de longo prazo pode não resistir financeiramente à TLP”, avaliou Rabello. Para o presidente do BNDES, o modelo de cálculo da TJLP hoje dá muito mais estabilidade e previsibilidade aos investidores.

O Congresso Nacional já estuda mudar a fórmula proposta pelo governo. O relator da Medida Provisória (MP) 777, deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), defende uma versão que não “aniquile” o setor produtivo e sinaliza com mudanças.

A cúpula do banco de fomento deve participar dos debates para uma possível revisão do modelo.

A TLP foi criada com o objetivo de reduzir a diferença que há hoje entre o custo que o Tesouro Nacional paga ao mercado para se financiar, que é a Selic (hoje em 10,25% ao ano) e a taxa que a União cobra nos empréstimos ao BNDES, que é a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), em 7% ao ano. Nos quatro primeiros meses deste ano, o governo já teve um custo de R$ 6 bilhões por conta dessa diferença (o chamado subsídio implícito).

Mas no passado recente, com um diferencial de juros ainda maior, essa conta chegou a mais de R$ 20 bilhões em 2014.

A TLP vai refletir mais de perto o custo de captação do Tesouro, eliminando o subsídio implícito ao longo de cinco anos.

Isso porque o cálculo da taxa é vinculado NTN-B, título público atrelado à inflação. A ideia do governo é que a nova Taxa de Longo Prazo possa variar mês a mês, mas não mude uma vez fixada em determinado contrato de financiamento. Ela será aplicada em contratos assinados a partir do início de 2018, segundo a proposta do governo.

“A proposta do governo tem objetivo meramente fiscal de reduzir o subsídio. Nossa preocupação é ter equilíbrio com o papel do BNDES, que é de fomentar o investimento. É preciso manter um incentivo”, disse o relator ao Estadão/Broadcast.

A comissão mista que analisa o texto deve realizar três audiências públicas, uma delas no Rio de Janeiro, sede do BNDES. A intenção é ouvir integrantes do governo e representantes do setor produtivo, do mercado de capitais e do banco de fomento para avaliar as possíveis mudanças na fórmula. O BNDES vê com bons olhos a tentativa de rediscutir o modelo proposto.

“Precisamos garantir o equilíbrio entre o fiscal e o papel do BNDES. Temos de dar flexibilidade, a regra prevê um prazo de convergência só de cinco anos para a TLP. É preciso ter cuidado para não aniquilar o setor produtivo e os investimentos”, disse o relator. “Talvez seja interessante criar um instrumento pelo qual o governo, quando tiver condição mais favorável, possa voltar a dar subsídios”, defendeu.

Sem mudança. Para Rabello, modelo de cálculo da TJLP dá estabilidade a investidores

Longo prazo

“Em um momento muito agudo (de alta desses juros), um projeto de longo prazo pode não resistir financeiramente à TLP.”

Paulo Rabello de Castro

PRESIDENTE DO BNDES

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Retomada não depende apenas do banco público

Alexa Salomão e Mariana Sallowicz

07/07/2017

 

 

Economistas apoiam as iniciativas do presidente do BNDES, mas lembram que mercado precisa acompanhar movimento

A iniciativa de destravar os financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), anunciada por seu presidente, Paulo Rabello de Castro, foi considerada muito bem-vinda por economistas.

Parte da dificuldade de a economia reagir, segundo especialistas, está justamente na carência de crédito, em particular do financiamento voltado a obras de infraestrutura, que sempre tiveram particular dependência da instituição.

O BNDES faz falta, explica o economista José Roberto Afonso, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/ FGV) e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Ele diz que o crédito do BNDES recua, em termos reais, desde meados de 2014, mas lembra que, junto, caiu o crédito dos demais banco.

Afonso reforça que o movimento do BNDES, para ter um efeito robusto, deveria ser acompanhado pelo mercado.

“Para sair da recessão, é necessário retomar o crédito não apenas do BNDES, mas também do resto do sistema bancário, bem como do mercado de capitais e financeiro. Seria muito bom se todos trabalhassem juntos, como é comum no resto do mundo, sobretudo em economias avanças e liberais, onde o banco de desenvolvimento, ainda que seja estatal, atua em parceria e caráter complementar às demais instituições, inclusive privadas”, diz ele.

Juros. Também tende a ser bem recebida a permanência da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) nos financiamentos da instituição. A troca da TJLP pela Taxa de Longo Prazo (TLP) está em debate no Congresso e Rabello de Castro defende a sua permanência.

A mudança de taxa foi criticada em evento da associação de funcionários do banco, a AFBNDES.

O encontro, ontem, no Rio, reuniu economistas como Felipe Rezende, professor assistente do departamento de Economia do Hobart e William Smith Colleges, de Genebra.

“Essa medida coloca mais volatilidade dentro da avaliação de risco (dos projetos) com impacto severo sobre os investimentos novos”, disse. Segundo ele, o País está fazendo o inverso do que ocorre no mundo, que tenta controlar as juros de longo prazo, e não liberá-los.