O globo, n.30815 , 19/12/2017. PAÍS, p. 5

Lava-Jato desiste de perícia em recibos entregues por Lula

 THIAGO HERDY

19/12/2017

 

 

Procuradores dizem que documentos são ‘ideologicamente falsos’

 

 O Ministério Público Federal (MPF) desistiu de levar adiante o pedido de perícia nos recibos de aluguéis do apartamento vizinho ao utilizado atualmente pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em São Bernardo do Campo (SP). Os documentos foram apresentados pela defesa do ex-presidente para sustentar que ele teria pagado pelo aluguel do imóvel entre 2011 e 2015.

Dono do apartamento, o empresário Glaucos da Costamarques afirma nunca ter recebido valores do ex-presidente, apesar de ter registrado pagamentos em sua declaração de imposto de renda. O MPF identificou transferências bancárias de uma fornecedora da Odebrecht a Costamarques na época da compra do imóvel. O órgão sustenta que o apartamento é parte de propina paga ao expresidente pela empreiteira.

Ontem, procuradores disseram crer que os recibos entregues pela defesa de Lula são “ideologicamente falsos”. Eles sustentam que foram firmados “exclusivamente para dar amparo dissimulado à locação do apartamento nº 121”, já que o locatário declarou não ter recebido os valores citados nos documentos.

De acordo com o MPF, a perícia é desnecessária em função do “acervo probatório” que sustentaria, “de forma inequívoca”, que os recibos constituem “falsos ideológicos” e “não correspondem a declarações” feitas no curso do processo.

Os procuradores citam, entre outros elementos, depoimento do contador de Costamarques, João Muniz Leite, que afirmou ter colhido assinaturas para os recibos mesmo sem saber se os aluguéis tinham sido pagos; registros de ligações telefônicas entre Costamarques e Roberto Teixeira, advogado de Lula, no período em que os recibos teriam sido produzidos; e declarações de Costamarques em dois depoimentos à Justiça, negando ter recebido os valores.

INCLUSÃO DE DADOS NO IMPOSTO DE RENDA

Costamarques sustenta que estava internado no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, em dezembro de 2015, quando teria recebido a visita de Teixeira para tratar dos pagamentos dos aluguéis. Na época a Lava-Jato já investigava a relação do PT e do presidente Lula com empreiteiras.

O empresário diz ter passado a receber valores apenas a partir desta data. E afirma ter incluído dados de pagamentos de anos anteriores, em seu imposto de renda, a pedido de José Carlos Bumlai, seu primo e amigo de Lula.

Ontem, a defesa de Lula rebateu a tese do MPF e afirmou que os procuradores desistiram da perícia porque “os documentos são autênticos”. Os advogados destacaram o fato de Costamarques ter afirmado, em depoimento, que assinou os papéis.

“Quem emitiu os recibos e concedeu a quitação à Dona Marisa pelos aluguéis de 2011 a 2015 foi o sr. Glaucos da Costamaques, sendo absolutamente descabido atribuir a Lula ou aos seus familiares a prática de qualquer falsidade”, escreveu a defesa, em nota.

Os advogados do ex-presidente sustentam que o aluguel teria sido pago em espécie a Costamarques, nos anos citados. Para a defesa, as acusações contra Lula “estão alicerçadas em factoides e construções por associação e sem provas”.