Governo é surpreendido e teme por votações no Congresso

Andrea Jubé, Bruno Peres e Marcelo Ribeiro

04/07/2017

 

 

A prisão do ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira Lima surpreendeu ontem o Palácio do Planalto, que ainda demonstrava alívio com o decreto de prisão domiciliar do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures na sexta-feira. O governo receia menos uma delação por parte de Geddel que a contaminação das articulações para as votações no Congresso: da denúncia contra o presidente Michel Temer na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e da reforma trabalhista no Senado.

Ontem o presidente Temer concedeu entrevista à rádio BandNews, em que não foi questionado sobre a prisão de Geddel, embora se tratasse de um ex-auxiliar e amigo há mais de 30 anos. Mas a entrevista serviu de palanque para que Temer rebatesse rumores de que estaria abatido às vésperas da votação da denúncia na Câmara. "Estou animadíssimo", assegurou.

O presidente disse, ainda, que os deputados vão arquivar a denúncia, observando que há 363 indecisos. "Tenho esperança, quase certeza absoluta, de que vamos ter sucesso na Câmara. Quando examina a tal denúncia, vê desde logo sua inépcia, uma denúncia frágil, inconsistente", ressaltou.

Nos bastidores, Temer ficou abalado com a prisão de Geddel - embora desde que o nome do ex-ministro começou a surgir em delações, esse temor assombrasse o Planalto. Geddel é um dos mosqueteiros de Temer no PMDB, ao lado de Eliseu Padilha, chefe da Casa Civil, Moreira Franco, ministro da Secretaria-Geral da Presidência, e Romero Jucá (PMDB-RR), ex-ministro do Planejamento e líder do governo no Senado.

Os quatro integravam o núcleo principal de auxiliares de Temer no início da gestão, em maio do ano passado. Esse grupo acabou desfalcado após as baixas de Geddel e Jucá. Geddel, contudo, mantém influência no governo: toda sua equipe foi preservada, mesmo após a posse do ministro tucano Antonio Imbassahy.

A secretária-executiva da Secretaria de Governo, Ivani dos Santos e o chefe de gabinete Carlos Henrique Menezes Sobral foram nomeados por Geddel, e até hoje respondem pela liberação de emendas e nomeação de cargos.

Geddel e Temer são s amigos desde quando eram deputados federais - Temer na presidência da Câmara, Geddel na liderança do PMDB. Faziam caminhadas juntos, o trio "Michel", "Gordinho" (Geddel) e Henrique Eduardo Alves, também deputado federal. Alves, ex-ministro do Turismo, está preso há um mês, implicado na Lava-Jato.

Geddel ocupou vários cargos nos governos petistas, indicado por Temer, então presidente do PMDB. No governo Lula, Geddel foi ministro da Integração Nacional. Na gestão Dilma Rousseff, Geddel assumiu a vice-presidência de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal - depois de perder a eleição para o governo da Bahia.

Geddel deixou o ministério há sete meses, sob a acusação do então ministro da Cultura, Marcelo Calero, de que teria feito tráfico de influência para liberar uma obra embargada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico (Iphan) em Salvador (BA).

Ontem o líder do governo no Congresso, deputado André Moura (PSC-SE), negou que o episódio possa contaminar a discussão da denúncia contra Temer na CCJ, mas reconheceu que cria mais instabilidade. "Espero que os integrantes da CCJ tenham a responsabilidade de analisar a denúncia pela acusação em si", afirmou. "O que não podemos permitir é que fatores externos sejam utilizados com o objetivo de emplacar a denúncia", completou.

A oposição, contudo, explorará ao máximo o episódio. O líder do PT na Câmara, Carlo Zarattini (SP), disse que mesmo com Geddel fora do governo, "é um fato muito negativo pela proximidade que ele tem com Temer". Ele adiantou que a oposição vai requerer o comparecimento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de peritos da Polícia Federal e do ex-deputado Rodrigo Rocha Loures para prestarem esclarecimentos sobre a denúncia "para essa decisão fundamental para o país seja tomada com clareza e consciência".

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4289, 04/07/2017. Política, p. A6.