'Populista', vice assumiria Câmara

Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro

10/07/2017

 

 

Embora deputados já se alvorocem nos bastidores para comandar a Câmara dos Deputados caso o presidente Michel Temer seja afastado pela denúncia de que cometeu o crime de corrupção passiva, é o primeiro-vice-presidente da Casa, Fábio Ramalho (PMDB-MG), que ocupará a cadeira no período em que Rodrigo Maia (DEM-RJ) deixar a presidência da Câmara para ficar interinamente no Palácio. A gestão de "Fabinho", que chegou ao cargo reunindo apoio em vários grupos e partidos ao oferecer generosos banquetes em seu apartamento, já desperta a atenção de analistas do mercado e parlamentares da base que estão na linha de frente das reformas e levantam dúvidas sobre a agenda que o pemedebista adotaria em sua interinidade. O receio é de que, com a caneta na mão, o vice-presidente da Câmara vote projetos mais populistas para agradar aos colegas às vésperas da eleição. O temor é que a pauta, ao contrário de impor mais rigor fiscal, isso abra os cofres para a reeleição dos deputados.

Esse movimento iria na contramão das expectativas de empresários e do mercado financeiro de que, caso Temer seja afastado com a autorização da Câmara e recebimento da denúncia pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Maia daria novo fôlego para a reforma da Previdência ao comandar interinamente o Executivo, mantendo a coalizão governista, a agenda e equipe econômica. Nesse cenário, porém, a Câmara ficará sob o comando também interino de Fábio Ramalho por até 180 dias, prazo que o Supremo tem para julgar se Temer cometeu o crime de corrupção passiva ao supostamente negociar propina com a JBS em troca de favores à empresa, o que ele nega. Só haverá eleição para o comando da Casa se o posto ficar vago definitivamente e Maia vencer eleição indireta no Congresso.

Fabinho tem posturas mais flexíveis sobre as reformas que Rodrigo Maia. Já defendeu que Temer retirasse a proposta de mudança na Previdência de pauta após a delação da JBS deflagrar uma nova crise no governo e agora é um dos principais a afirmar em público que a reforma deve se limitar à idade mínima de 65 anos para homens e 62 para mulheres poderem se aposentar. Por outro lado, votou a favor da reforma trabalhista e da emenda à Constituição do Teto de Gastos, os outros principais projetos econômicos do governo Temer. A definição de um espaço na Esplanada para Minas Gerais, e em especial para o PMDB mineiro, também ganharia novos contornos. A bancada está irritada com a falta de um ministro do Estado, situação inédita. Coordenador da bancada, Ramalho levou a demanda ao Palácio seguidas vezes. Em uma delas, ao ver seu colega, o deputado Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), preterido na escolha de ministro da Justiça, rompeu com Temer, situação depois contornada com alguns almoços e demandas atendidas.

Vice-líder do PMDB, o deputado Carlos Marun (MS) não mira no correligionário, mas em Maia, ao falar que não há chances de reformas se a Câmara aceitar a denúncia. "Se o presidente Temer cair vítima desse complô do qual estão fazendo parte até mesmo aliados supostamente leais, acabam as chances de emplacar qualquer reforma. Ninguém além de Temer é apto para dar andamento à tramitação da agenda reformista", disse. Fabinho descarta uma agenda populista. Em tom de quem ouviu uma ofensa, afirmou que não há chance de ser displicente com as contas do governo para agradar aos demais parlamentares. "Sou de uma família pobre e meu pai me ensinou a não gastar mais do que tenho", rebateu o ex-prefeito de Malacheta (MG), que diz ter deixado sem nenhuma dívida. Mas a possibilidade de assumir o comando interino da Câmara por mais tempo já levou a uma nova postura. Antes avesso a presidir as sessões, função que deixava com outros integrantes da Mesa Diretora, o pemedebista comandou o plenário várias vezes nas últimas três semanas enquanto Maia estava como interino no Palácio e fora da Casa para articulações políticas.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4293, 10/07/2017. Política, p. A8.