Relator na CCJ acata denúncia contra Temer

Raphael Di Cunto e Marcelo Ribeiro

11/07/2017

 

 

Relator do pedido de autorização para que o Supremo Tribunal Federal (STF) possa julgar a denúncia de que o presidente Michel Temer cometeu crime de corrupção passiva ao supostamente receber propina da JBS para favorecer a empresa, o deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ) deu ontem parecer favorável à denúncia pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e pelo plenário da Câmara dos Deputados.

"Não é fantasiosa a acusação. Em face de suspeitas e de eventuais ocorrências, não podemos silenciar", afirmou o relator. Apesar de ele ser filiado ao PMDB, partido de Temer, o parecer contrário ao governo já era esperado. "Estão demonstradas na denúncia indícios suficientes de autoria. Tudo nos leva à conclusão de que, no mínimo, sólidos indícios existem da prática de atos delituosos", afirmou.

O placar na CCJ, antes desfavorável a Temer, contudo, agora está amplamente pelo trancamento da denúncia. Nove votos pela autorização para que o Judiciário julgasse Temer foram revertidos com mudanças nos integrantes da comissão - alguns mais do que uma vez. Os novos titulares já se manifestaram pela rejeição da acusação contra o presidente. O número crescerá mais até a votação na sexta-feira, com outra mudança no PRB e uma no PP.

Foram 17 remanejamentos entre os integrantes da comissão, com mudanças em 13 vagas - nove de titulares e quatro de suplentes. Com isso, hoje o parecer seria rejeitado com apoio de pelo menos 39 a 40 integrantes do colegiado. Os votos a favor da denúncia devem girar de 23 a 26, bem abaixo dos 34 necessários para aprovar o parecer.

Independentemente do resultado na CCJ, a autorização para o prosseguimento da denúncia será votada no plenário, onde são necessários 342 deputados de 513 para aprovação. A oposição contava que a derrota no colegiado, após o parecer de um deputado do próprio PMDB, impulsionaria a votação no plenário.

Na CCJ, PSD (1), PTB (1), PR (4), PRB (1), PMDB (1) e SD (1) mudaram seus representantes. No PP, dos cinco titulares, Esperidião Amin (SC) se declarou favorável ao prosseguimento da denúncia ontem. "Não dá para esconder para baixo do tapete. É como vou votar. Só não sei se só no plenário ou na CCJ também" disse. O PP já avisou que ele sai.

O Palácio ainda tenta convencer o PV, que controla o Ministério de Meio Ambiente, a trocar seu representante, Evandro Gussi (PV-SP), para ampliar a margem. Dos sete votos do PSDB, cinco são certos pela denúncia e já estão excluídos da conta. No DEM do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), que assumiria em caso de afastamento de Temer, dos quatro, só Marcos Rogério (RO) deve votar contra o governo.

Para Zveiter, que foi presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Rio por duas vezes, o princípio de que "na dúvida, a decisão é pró réu", não tem validade nessa fase do processo penal porque se discute agora a admissibilidade da acusação e é um direito da sociedade ver os fatos esclarecidos. Na opinião dele, os indícios mostram atos "não republicanos" que tornam "imprescindível" a apuração. "Impedir o avanço das investigações seria ampliar irremediavelmente o abismo entre a sociedade e aqueles que a representam", afirmou.

Temer é acusado pelo procurador-geral da República (PGR), Rodrigo Janot, de negociar com o dono da JBS e da J&F, Joesley Batista, propina para favorecer negócios da empresa. Temer, em uma conversa gravada no Palácio do Jaburu, sua residência oficial, teria indicado o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) como intermediário. Dias depois, o pemedebista recebeu uma mala com R$ 500 mil em troca de favorecimento a uma empresa do grupo em uma disputa contra a Petrobras no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Integrantes da base governista rebateram que a denúncia é fraca e o parecer "foi mais fraco ainda". Não há prova, dizem, de que o dinheiro tinha como destinatário final o presidente, principal argumento do advogado de Temer, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira. "Lanço um repto [desafio] ao procurador-geral da República: que me diga quando o presidente da República recebeu um níquel sequer. E das mãos de quem? Em que circunstâncias? De noite ou de dia? Em São Paulo ou Pirituba?", disse. "Essa assertiva consta da denúncia. Mentira. Infâmia."

Para o deputado Paulo Maluf (PP-SP), um dos titulares da CCJ, crime de verdade foi a anistia criminal aos delatores da JBS concedida por Janot. "A mala pode ser um crime de Rocha Loures, não do Temer. E não digo que é [crime], digo que pode ser", afirmou, dizendo que votaria contra a denúncia por amor ao trabalhador brasileiro. "Nenhum empresário quer a saída do Temer", disse.

Zveiter defendeu que não é exigido, nessa fase do processo, a prova cabal de um crime e citou julgamentos de quatro ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) nesse sentido. "A jurisprudência do STF é de que o trancamento da ação penal é para situações anormais", disse. "Nessa fase, apenas as manifestações indubitavelmente improcedentes é que não serão recebidas", continuou.

Após a leitura do parecer e dos argumentos de Mariz, foi concedido prazo de duas sessões para que os deputados possam analisar os documentos antes da discussão, que começará amanhã. A previsão é que até 192 parlamentares discursem, num debate que pode durar mais de 40 horas. A votação poderia ocorrer na sexta-feira, embora o governo queira apressa-la. Caso a Câmara rejeite a autorização para que o STF julgue a denúncia contra Temer, a investigação só continuaria após ele deixar o Palácio do Planalto. Se autorizar, e se o plenário do STF tornar o presidente réu, ele é afastado do cargo por até 180 dias para ser julgado.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4294, 11/07/2017. Política, p. A9.