Apesar de protesto, Senado aprova reforma trabalhista

Vandson Lima e Fabio Murakawa

12/07/2017

 

 

Foi aprovado no Senado e vai à sanção presidencial, por 50 votos a 26 e uma abstenção, o projeto de lei que modifica mais de cem pontos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). A sessão foi marcada por um protesto inédito, no qual senadoras de oposição fizeram uma ocupação, por mais de sete horas, da Mesa que comanda os trabalhos da Casa. Logo após a rejeição dos destaques e a conclusão da votação, o presidente Michel Temer fez um discurso, comemorando a aprovação da reforma. Segundo o presidente, a nova legislação "criará relações trabalhistas adequadas à realidade atual". Para Temer, a aprovação da reforma foi "a vitória na luta contra o desemprego". E acrescentou: "A modernização trabalhista é a via rápida para novos empregos."

Dentre as principais alterações promovidas pela reforma estão a permissão para que acordos entre as partes tenham prevalência sobre a legislação; a criação de novos tipos de contratos de trabalho, entre eles o trabalho intermitente, a ampliação da possibilidade de acordos individuais, entre eles a jornada de 12 horas por 36 horas de descanso e redução de intervalo intrajornada; a previsão de banco de horas para compensação de horas extras, sem necessidade de acordo coletivo. Além disso, o projeto dificulta e encarece o acesso à Justiça do Trabalho, exclui a obrigatoriedade de homologações de demissões por sindicatos, retira a obrigação de negociar com sindicatos demissões coletivas e acaba com a obrigatoriedade do imposto sindical.

Após a votação, o líder do governo e relator da reforma trabalhista em plenário, Romero Jucá (PMDB-RR) reforçou a promessa do presidente Michel Temer de editar uma medida provisória com ajustes à reforma, além de vetar alguns pontos do texto. Serão alterados o artigo que versa sobre a jornada de 12 horas por 36 de descanso, para estipular que ela somente poderá ocorrer por acordo coletivo; o artigo que versa sobre danos extrapatrimoniais, para desvincular o valor das indenizações ao salário do trabalhador; o artigo que permite que gestantes e lactantes trabalhem em locais insalubres; e a figura do autônomo exclusivo será vetada.

Além disso, o governo mexerá no artigo que versa sobre o trabalho intermitente, para estipular uma quarentena de 18 meses para que os trabalhadores demitidos sejam contratados por esse regime. E ajustará a figura da comissão de empregados, criada pela reforma, para impedir que ela substitua o papel dos sindicatos em negociações coletivas. "Temos compromisso de que esses pontos pactuados continuarão abertos pra receber sugestão até a véspera da MP", disse Jucá. "Essa lei é moderna e vai gerar empregos". Uma versão preliminar da medida provisória circulou entre senadores da base, com mudanças propostas em alguns artigos.

Sem apoios suficientes para derrubar a chamada reforma trabalhista, opositores do governo tentaram impedir que a proposta fosse a voto. Senadoras do PT e PCdoB - e depois outras de PDT, PSB e até a pemedebista Kátia Abreu (TO) - tomaram os lugares da presidência e dos integrantes da Mesa que conduziriam a sessão. O presidente Eunício Oliveira (PMDB-CE) mandou desligar as luzes e microfones do plenário e suspendeu a sessão. Ruy Baron / ValorEunício assume o comando da Mesa: “Estou profundamente chocado com o que estou vendo. É a desmoralização da Casa” As senadoras almoçaram no local às escuras. A ocupação da Mesa de trabalho estava combinada na oposição desde ontem, segundo uma fonte. Gleisi Hoffmann (PR) chegou a ser desaconselhada de participar, inclusive, já que é presidente nacional do PT. Mas acabou comandando a ocupação, estando durante todo o tempo com o celular na mão e transmitindo ao vivo o que se passava.

Negociações foram conduzidas durante toda a tarde. A oposição, contudo, exigia um acordo para aprovar um destaque à proposta, o que na prática forçaria o retorno da matéria para a Câmara dos Deputados, que era justamente o que o governo queria evitar. Os governistas chegaram a cogitar realizar a sessão em outro espaço no Senado. Vice-presidente, Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) recolheu assinaturas. Havia dúvidas, no entanto, sobre a validade regimental da mudança de local, que poderia ser contestada posteriormente. Por fim, Eunício foi ao plenário e disse que, sem acordo, colocaria a matéria para votação de qualquer maneira, no plenário ou em qualquer outro lugar. "Estou profundamente chocado com o que estou vendo hoje. Já esperei por mais de sete horas. O problema não é o mérito da matéria. É a desmoralização da Casa. É a primeira vez que vejo isso na vida", afirmou.

Eunício argumentou a oposição quebrou o acordo que previu várias sessões para discussão da proposta. "Podíamos ter votado essa matéria na terça-feira. Permiti quarta e quinta-feira microfone aberto para todos se manifestarem. Não fiz para a oposição fazer sua fala. O entendimento foi quebrado hoje". Sem acordo, Eunício primeiro sentou-se em uma cadeira lateral à Mesa anunciando que comandaria os trabalhos e, microfone na mão, iniciou os encaminhamentos. Como seria impossível passar a palavra às bancadas naquela situação, os opositores finalmente cederam e deixaram a Mesa. Gleisi afirmou que a medida extrema foi tomada porque "não tinha outra coisa para fazer. Tempos de exceção exigem de nossa parte reações anormais", justificou. O senador José Medeiros (PSD-MT) protocolou uma representação contra as senadoras por quebra de decoro parlamentar.

O PMDB teve apenas quatro votos contrários à reforma: Renan Calheiros (AL), Katia Abreu (TO), Roberto Requião (PR) e Eduardo Braga (AM). O senador Hélio José (PMDB-DF), que chegou a perder cargos no governo federal por vociferar contra a reforma, não apareceu para votar. Já Ronaldo Caiado (DEM-GO), que chegou a se manifestar contra a impossibilidade de o Senado mexer no texto, votou pela aprovação. O ex-presidente Fernando Collor (PTC-AL) votou contra. Os dois senadores do recém-criado Podemos, Álvaro Dias e Romário, também se opuseram. A única abstenção foi da senadora Lúcia Vânia (PSB-GO). (Colaborou Andrea Jubé)

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4295, 12/07/2017. Política, p. A7.