Rabello recua e agora diz apoiar proposta do governo para a TLP

Cristiane Bonfanti e Eduardo Campos

13/07/2017

 

 

Após criticar a metodologia de cálculo da Taxa de Longo Prazo (TLP) que acabou suscitando o pedido de demissão de dois diretores do BNDES, o presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, voltou atrás ontem e disse que não sugeriu alterações na Medida Provisória 777, que trata da nova taxa de juros dos empréstimos do banco. A MP, relatada pelo deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), cria a nova taxa em substituição da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP).

Rabello afirmou que terá um encontro com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira. "Na próxima terça-feira, vou conversar com o ministro. Não vou conversar com ele. Na realidade, vou saber as instruções que ele tem para me dar. Ele e o ministro Dyogo. Sou subordinado diretamente ao ministro Dyogo", afirmou. "Sou um técnico do governo, e dos mais modestos. Eu nem sei se eu penso. Eu só executo", disse.

Na terça-feira, o Valor mostrou que o governo não pretende rediscutir as bases da MP. No dia anterior, o presidente do BNDES havia sugerido que a TLP fosse prefixada à taxa de inflação como forma de atenuar a volatilidade da taxa. Na sexta-feira, dois diretores do banco pediram demissão após entrevista de Rabelo ao "Estado de S. Paulo" na qual tecia críticas à taxa. Ontem, ele recuou.

"Eu não sugeri nada. Eu estou decorando a MP 777 só para eu saber de cor tudo o que o governo propôs para que eu possa endossar" disse Rabello, após cerimônia no Palácio do Planalto para anunciar recursos para investimento em infraestrutura nos municípios. "Eu não tenho que ter proposta. O único que tem de ter proposta é o presidente Michel Temer", afirmou.

Rabello disse que conversou com o relator da MP para discutir quem participaria de uma audiência, mas não solicitou alteração na proposta. "O entendimento dele é que havia muitas emendas e que ele gostaria que eu lesse as várias emendas e pudesse dar para ele algumas sugestões. Tudo o que é dito pode ser dito com uma ênfase ou com outra", disse o presidente do BNDES.

Questionado sobre a sua posição a respeito da forma de cálculo da TLP, Rabello afirmou que "funcionário do governo não tem posição". "Na realidade, minha posição é de sentido", disse. "Estou totalmente vinculado à medida provisória", disse o presidente do banco de fomento, ao ser perguntado se estava comprometido com a MP 777. Mesmo assim, o presidente voltou a dizer, a exemplo do que fez na semana passada, que o banco tem de fazer "em seis meses o que faria em seis anos", frase cunhada pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, na cerimônia dos 65 anos do BNDES, no dia 20 de junho. Algumas das mais severas críticas à TLP partem da Fiesp.

A criação da TLP buscou reduzir a diferença entre o custo que o Tesouro Nacional paga ao mercado para se financiar - que é a taxa básica de juros (Selic), atualmente em 10,25% ao ano - e a taxa que a União cobra nos empréstimos ao BNDES, a TJLP, em 7% ao ano.

Em audiência pública realizada no Senado, representantes da indústria repetiram a crítica à mudança da taxa de juro de longo prazo do BNDES, enquanto economistas do governo e do setor privado consideraram positiva a redução do crédito subsidiado pelo banco.

Representando o BNDES, o economista Fabio Giambiagi disse na audiência que o banco endossa os termos da MP. Ele ponderou que o texto final da medida será dado pelo plenário do Congresso Nacional. Giambiagi declarou que os termos de sua apresentação foram previamente acertados com Rabello.

Para o diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, Tiago Couto Berriel, a adoção da TLP reforça da política monetária e dá transparência ao uso dos recursos públicos. Ele apontou os benefícios fiscais com a redução do subsídio. A TLP aproxima a taxa do BNDES da taxa de captação do Tesouro, disse.

Na avaliação do professor da PUC-Rio Vinicius Carrasco a economia de hoje no Brasil é resultado de maus investimentos no passado. "Concessão de crédito muito subsidiado distorce a alocação de capital e gera uma economia fraca, pouco produtiva com pouco empregados", disse. Carrasco e o também economista Claudio Coutinho pediram demissão da diretoria do BNDES na semana passada, depois das declarações de Rabello de Castro.

Para Ana Carla Abrão Costa, sócia da Oliver Wyman Consultoria, "é preciso que se trabalhe as ineficiências da economia para permitir queda de juros. E a TLP vai nessa direção". O professor de economia da UFRJ Ernani Teixeira Torres Filho é a voz dissonante entre os economistas. Ele questiona o impacto da medida sobre a potência da política monetária, já que o estoque de operações com juros subsidiados não seria afetado, apenas novos fluxos.

O presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Fernando Figueiredo, pediu que a MP não seja aprovada. Ele rebateu as afirmações de que países ricos se desenvolveram sem políticas industriais, e citou casos da Alemanha, China e Índia. Também apontou que algumas políticas de estímulo seguem até hoje nesses países. Para Figueiredo, a afirmação de que o BNDES perde dinheiro com seus financiamentos é "mentira".

Para o diretor-executivo de competitividade e economia estatística da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Mario Bernardini, a adoção da TLP "mata o setor brasileiro de bens de capitais". Ele também pediu que a MP seja rejeitada.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4296, 13/07/2017. Brasil, p. A4.