Recessão não teria baixado a inflação sem ajuste fiscal e juro alto, afirma BC

Alex Ribeiro

17/07/2017

 

 

Um estudo do Banco Central defende a tese de que, apesar da maior recessão já documentada na história, a inflação não teria caído se não fosse a vitória na batalha pelas expectativas sobre a alta de preços na economia - fruto da mudança da políticas monetária e fiscal no governo Temer.

O trabalho, que foi publicado num boxe do Relatório de Inflação de junho, é bastante técnico, mas foi feito na medida para combater a visão difundida entre economistas de que a forte recessão derrubaria a inflação de qualquer forma e, portanto, as políticas monetária e fiscal mais austeras eram desnecessárias.

O estudo do BC usa ferramentas matemáticas e estatísticas para mostrar que, na verdade, a inflação caiu menos do que deveria ter baixado até meados de 2016, levando em conta a recessão e o desemprego, que época já eram profundos.

O que impediu a inflação de cair como o esperado, argumenta o estudo, foi a deterioração das expectativas de inflação, provocada pela percepção de empresas e pessoas de que as políticas monetária e fiscal levavam a um descontrole de preços.

O pano de fundo é a ideia de que, em alguns momentos, o país pode ter recessão e inflação mais alta, a chamada estagflação, se a política econômica do governo é vista como insustentável.

A inflação só caiu, de fato, a partir do segundo semestre de 2016, quando os juros altos e medidas como a aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC) do teto dos gastos domaram as expectativas de inflação. Desse período em diante, tanto a recessão quando o recuo das expectativas levaram a inflação a cair aos patamares atuais.

Nos seus cálculos, os economistas do BC utilizaram a chamada inflação subjacente de serviços, ou seja, um cesta de consumo de serviços cujos preços respondem mais diretamente à atividade econômica. Dessa forma, a análise exclui os preços que costumam variar por outras forças, como os de alimentos e energia elétrica, que sobem quando ocorrem secas, por exemplo.

O passo seguinte foi montar uma equação matemática - a chamada curva de Phillips - que basicamente mostra o quanto fatores como grau de ociosidade da economia, expectativas, preços das commodities e rendimento médio afetam a inflação desse núcleo de serviços.

Umas das conclusões é que, de 2010 a 2014, o mercado de trabalho e a atividade econômica estavam mais aquecidos e deram uma contribuição relevante para puxar a inflação desse núcleo de serviços para cima.

Esses mesmos vetores puxaram a inflação para baixo a partir de 2014, ano em que a recessão tecnicamente começou, segundo o Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codade), da Fundação Getulio Vargas (FGV). Mas a deterioração das expectativas de inflação provocou uma força inflacionária mais forte que a recessão de 2014 a fins de 2015.

Nesse período, o núcleo de serviços chegou a um pico próximo de 10%, dos quais 8,6 pontos percentuais podem ser atribuído ao peso das expectativas inflacionárias e da inércia nesse período.

Isso ajuda a entender porque não se confirmaram as previsões feitas pelo próprio Banco Central, na gestão Alexandre Tombini, de que os preços de serviços iriam ceder rapidamente em uma recessão que, em meados de 2015, já se mostrava forte para os padrões históricos brasileiros.

A partir de 2016, sobretudo no segundo semestre, com a mudança de rumos na política econômica, as expectativas passaram a atuar junto com a recessão e desemprego para baixar a inflação. Nos meses mais recentes, a média móvel trimestral anualizada da inflação subjacente de serviços passou a oscilar em torno de 3,5%.

No estudo, faltou investigar o que provocou a queda das expectativas de inflação. Trabalhos anteriores do Banco Central mostram que a inflação corrente - que foi atipicamente baixa devido ao bom comportamento de preços de serviços - tem peso importante nas expectativas de curto prazo. Juros e política fiscal afetam expectativas de longo prazo. A taxa de câmbio também exercem um papel relevante.

Mas a intenção do BC, com o trabalho, é enfatizar o papel da mudança de rumo nas políticas monetária e fiscal para garantir a baixa da inflação. O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, tem defendido que foi importante cortar os juros lentamente em fins do ano passado para domar as expectativas e quebrar a espinha dorsal da inflação.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4298, 17/07/2017. Brasil, p. A2.